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Retirada americana do Afeganistão e Iraque é irresponsável

Ines Pohl
Ines Pohl
18 de novembro de 2020

Plano de Trump de reduzir consideravelmente o volume das tropas dos EUA no Afeganistão e Iraque, até meados de janeiro, é um tapa na cara dos aliados e convite a forças extremistas, opina Ines Pohl.

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Dois soldados uniformizados observam helicóptero no céu
Foto: picture-alliance/AP Photo/Operation Resolute Support Headquarters/Sgt. Justin T. Updegraff

As esperanças de que o governo imprevisível e egoísta de Donald Trump tivesse chegado ao fim com a indiscutível vitória de Joe Biden acabam de ser aniquiladas, mais uma vez. O presidente cessante dos Estados Unidos ainda terá nas mãos as alavancas do poder por nove semanas, e se mostra disposto a empregar esse poder até as últimas horas.

Prova disso é seu anúncio de que reduzirá de 4.500 para 2.500 o contingente americano no Afeganistão, e no Iraque, de 3.000 para 2.500. Isso, até 15 de janeiro de 2021, apenas cinco dias antes de entregar o posto a seu sucessor, o democrata Biden. Tal decisão irresponsável e precipitada tem consequências graves. Em primeiro lugar, há que considerar os cidadãos afetados em ambos os países.

As guerras foram iniciadas sem estratégias refletidas. No Iraque, com a falsa afirmação de que o país possuiria armas de destruição em massa. No Afeganistão, os EUA entraram após os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, juntamente com a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e outros aliados. A intervenção sob liderança americana tomou partido num conflito ativo, sem dispor de uma estratégia definida.

Décadas de conflitos deixaram feridas profundas nos dois países: em nenhum dos dois há um Estado estável, capaz de proteger sua população. A situação é insatisfatória em diversos aspectos, não há dúvida. E no entanto, a presença militar dos EUA garante uma certa previsibilidade aos afegãos, como meio de pressão nas vacilantes conversas de paz com o Talibã. Se os americanos se retiram desordenadamente agora, as portas estarão abertas para as forças radicais.

Viu-se no Iraque como isso favoreceu a organização fundamentalista "Estado Islâmico" (EI). Também a Síria é uma prova de que o vácuo de poder resultante é preenchido por outras forças que só perseguem os próprios interesses. Isso é perigoso para a comunidade mundial e mortal para todos os afegãos que hoje lutam por um Estado democrático que dê valor aos direitos humanos.

Legado pesado para Biden

A retirada não coordenada de Trump é também um tapa na cara dos aliados internacionais, em especial da Otan, que após o 11 de Setembro evocou pela primeira vez, em defesa dos EUA, seu Artigo 5º, segundo o qual o ataque a um de seus membros é um ataque a todos.

E agora é justamente um presidente americano a quebrar a regra de ferro: entrar juntos, sair juntos. Na missão no Afeganistão, os parceiros da Aliança Atlântica dependem forçosamente do respaldo logístico dos EUA.

Acho certo Trump ter forçado a Europa, e explicitamente a Alemanha, a empregar mais dinheiro na Otan e a ampliar as próprias capacidades militares. No entanto, é bem outra coisa reduzir drasticamente e a toque de caixa empreitadas complexas como a presença militar conjunta no Afeganistão. Se o país-membro mais importante não se atém aos acertos comuns, a aliança não tem qualquer futuro.

Trump retira as tropas contrariando os conselhos de seus generais e de líderes republicanos. Vai custar muita energia a Joe Biden anular tal passo. E até 20 de janeiro, muito ainda pode acontecer.

Com o anúncio da retirada desordenada das tropas, não há mais qualquer dúvida de que Donald Trump está literalmente disposto a passar por cima de cadáveres a fim de deixar satisfeitos e manter fiéis os seus adeptos, para muito além do tempo de mandato.

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Ines Pohl foi editora-chefe da DW e atualmente é correspondente em Washington. O texto reflete a opinião pessoal da autora, e não necessariamente da DW.

Ines Pohl
Ines Pohl Chefe da sucursal da DW em Washington.@inespohl