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Religião

Opinião: Uma decisão que transformou a Igreja Católica

11 de fevereiro de 2018

Há cinco anos, o papa Bento 16 surpreendeu ao renunciar ao cargo. Com tal passo, o religioso alemão transformou o pontificado e lançou uma nova era para o Vaticano, opina o jornalista Christoph Strack.

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Papa Francisco (esq.) saúda seu antecessor no Vaticano, em 28/06/2018
Papa Francisco (esq.) saúda seu antecessor no Vaticano, em 28/06/2018Foto: Reuters/Handout/Osservatore Romano

O termo "sensação" não basta para descrever o ocorrido: foi um choque, um momento de paralisia, quando, em 11 de fevereiro de 2013, uma segunda-feira de Carnaval, Bento 16 anunciou que renunciava ao papado. A decisão do religioso de 85 anos viera totalmente inesperada: todo o mundo voltou os olhos para Roma.

A imprensa alemã apressou-se em acrescentar às primeiras notícias urgentes que não se tratava de um trote carnavalesco. Com esse passo, o primeiro líder alemão da Igreja Católica em quase 500 anos gerou imagens que comoveram o mundo. E redefiniu o pontificado, como um cargo humano.

Christoph Strack é jornalista da DW
Christoph Strack é jornalista da DWFoto: DW

Ainda o seu antecessor, João Paulo 2º, profundamente marcado pela idade ao fim do mandato, declarara que um papa não renuncia. E após o anúncio de Bento 16, o cardeal Stanislaw Dziwisz, secretário de longa data do líder católico polonês, comentara que este cumprira sua missão até a morte, apesar de gravemente doente, e dissera: "Da cruz, não se desce."

Um papa não está pregado na cruz. Lá quem está é um outro ser, maior, para os cristãos crentes. Joseph Ratzinger decidiu-se diferente de seu antecessor, e assim trouxe o papado para a Terra. Isso é bom para um cargo que ganha significado em tempos de globalização, de busca internacional de sentido e de uma nova relevância para a diplomacia vaticana.

"Quando um papa chega à clara noção de que física, psíquica e espiritualmente não está mais em condições de cumprir a missão pertinente a seu cargo, então tem o direito e, conforme o caso, até o dever de renunciar", já dissera Bento em 2010, num livro de entrevistas. E só mesmo um teólogo realmente grande como ele poderia ter dado esse passo com tamanha serenidade.

Mesmo passados cinco anos, para muitos especialistas em direito eclesiástico permanece em aberto um grande número de perguntas relativas a uma renúncia assim. Como se dirigir a um pontífice que renunciou (a fórmula "papa emérito" é vista por muitos de modo crítico)? Como ele deve se vestir: de branco papal ou com o vermelho dos cardeais, para cujo status, afinal, ele retorna?

No caso de Bento 16, a questão do local de moradia foi resolvida de forma excelente com uma existência monástica nos jardins do Vaticano, mas ela não está oficialmente definida. Nenhuma lei da Igreja Católica proibiria um fim de vida em clausura, onde quer que seja.

Além disso, incomoda a alguns que a "vida em oração" como serviço à "sagrada Igreja de Deus", de que Bento falou, ao anunciar a renúncia, também venha incluindo algumas declarações públicas com forte teor político-eclesiástico.

Ao se retirar, Ratzinger possibilitou a eleição de um reformador (francamente conservador). Ele se tornou o papa da transição, e no entanto entrará para a história da Igreja como muito mais do que isso. Nenhuma medida dos últimos séculos transformou tanto o pontificado, nem mesmo o estabelecimento da longamente discutida infalibilidade papal. E assim Bento transformou a Igreja Católica, de maneira mais profunda do que é possível dizer no curto prazo.

No entanto a renúncia de Bento 16 e sua vida em recolhimento desde a entrada em vigor da decisão, em 28 de fevereiro de 2013, mostram ainda uma outra coisa, não relacionada a Igreja e poder, mas sim a questões existenciais – pois ensinam sobre a dignidade e o fardo da idade.

Poucos dias atrás, ele escreveu aos leitores de um jornal italiano, comovido por tantos se interessarem em saber como ele atravessa essa "última fase" de sua vida:

"Sobre isso. só posso dizer– à medida que as forças físicas lentamente se esvaem – que internamente estou em peregrinação para casa. Para mim é uma grande graça, nesse último trecho do meu caminho por vezes um tanto exaustivo, estar cercado por um amor e uma bondade como não poderia ter imaginado."

Quem já acompanhou uma pessoa idosa que se encaminha para a morte, sabe o que ele quer dizer. O papa Bento 16 permanece sendo um grande teólogo. E é até hoje, em sua avançada idade, um ser humano profundamente crente.

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Christoph Strack Repórter, escritor e correspondente sênior para assuntos religiosos@Strack_C