Ortega ataca bastião opositor na Nicarágua
17 de julho de 2018Forças leais ao presidente Daniel Ortega lançaram nesta terça-feira (17/07) uma ofensiva contra um bastião opositor no sudoeste da Nicarágua, no momento em que cresce a pressão internacional pelo fim da violência no país centro-americano.
A Nicarágua vive a maior onda de violência desde a guerra civil encerrada em 1990, com confrontos entre forças pró-Ortega e manifestantes que pedem sua saída. Em três meses, estima-se, já foram mais de 350 mortes.
Em Masaya está o epicentro do movimento de resistência a Ortega, que domina há décadas a política nicaraguense. A cidade chegou a se declarar "território livre do orteguismo" e a considerar o estabelecimento de um governo alternativo ao de Manágua.
Pelo menos 40 automóveis, lotados de policiais e paramilitares, entraram nesta terça na cidade a partir de quatro frentes. Seriam mais de mil homens, segundo os moradores, no que pode ser a ofensiva derradeira do governo.
"Estamos em uma situação muito grave, Ortega está promovendo um genocídio na Nicarágua", denunciou a presidente do Centro Nicaraguense de Direitos Humanos (Cenidh), Vilma Núñez.
Segundo ela, pelo menos duas pessoas foram mortas na ofensiva desta terça-feira, sendo uma mulher e um policial. Até o momento, a imprensa local confirmou apenas a morte do agente de segurança.
O ataque, considerado o mais duro realizado contra Masaya, cidade a 25 quilômetros de Manágua, começou nas primeira horas do dia, quando as forças de Ortega abriram fogo contra o bairro indígena de Monimbo, principal foco de resistência na região.
Um grupo de jornalistas que tentava entrar no bairro para acompanhar a situação foi impedido de se aproximar por homens armados pró-governo que abriram fogo, informou a agência de notícias AFP.
A TV local mostrou imagens de manifestantes respondendo com pedras e bombas de fabricação caseira à ofensiva armada, entrincheirados atrás de barricadas de cimento. A estratégia de Ortega, segundo a imprensa local, seria acabar com resistência até quinta-feira, quando se completam 39 anos da revolução sandinista.
A atual onda de protestos no país centro-americano eclodiu em abril, motivada pelos planos de Ortega de reformar o sistema previdenciário do país, aumentando contribuições e reduzindo benefícios. O governo voltou atrás, mas a repressão aos manifestantes provocou protestos ainda maiores contra o presidente.
No poder há 11 anos, Ortega é acusado de ordenar a repressão violenta de manifestações juntamente com a sua mulher, Rosario Murillo, que é sua vice-presidente, num regime marcado pela corrupção e pelo nepotismo. Os opositores o acusam de ser um ditador e exigem que saia ou que haja eleições antecipadas.
Em resposta, o governo acusou de exercer terrorismo, criar insegurança e agir com violência "qualquer um que se propuser a alterar pelas vias de fato" a ordem jurídica e constitucional por meio dos bloqueios de estradas, onde ocorreu "violência, tortura e sequestro".
Por isso, o governo lançou a chamada "Operação Limpeza", que consiste em remover os bloqueios com pás mecânicas, caminhões e trabalhadores do Estado, sob o resguardo das "forças combinadas".
Com pelo menos 350 mortes e mais de 1.800 feridos em quase três meses, segundo dados de organizações humanitárias, a Nicarágua vive sua crise política mais sangrenta desde a década de 1980.
Pressão internacional
O Escritório do Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos (EACDH) afirmou nesta terça-feira (17/07) que a polícia e as autoridades nicaraguenses mataram, torturaram e aprisionaram pessoas sem o devido processo criminal.
Uma ampla gama de violações dos direitos humanos está sendo cometida, incluindo assassinatos extrajudiciais, tortura, detenções arbitrárias e negação do direito de liberdade de expressão", afirmou Rupert Colville, porta-voz do EACDH. Entre os mortos estariam ao menos 19 policiais.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, classificou de "inaceitável" a quantidade de mortos e o uso da força em meio à crise na Nicarágua, afirmando que é responsabilidade do Estado proteger os cidadãos. "O número de mortes é chocante, e há um uso letal da força por parte de entidades ligadas ao Estado", disse.
Também nesta terça-feira, a chefe da diplomacia da União Europeia, Federica Mogherini, pediu que a Nicarágua ponha um fim imediato à violência, à repressão e às detenções arbitrárias, além de respeitar as liberdades fundamentais em meio à crise no país. Mogherini afirmou que escreveu ao ministro do Exterior nicaraguense, Denis Moncada, devido à "deterioração da situação no país".
O governo dos Estados Unidos, que vem sendo bastante crítico em relação à Ortega, defende a realização de eleições antecipadas, "livres, justas e transparentes", como saída para a crise no país centro-americano.
Em comunicado conjunto, Argentina, Brasil, Colômbia, Costa Rica, Equador, Guatemala, Honduras, México, Panamá, Paraguai, Peru e Uruguai também expressaram preocupação com a situação na Nicarágua, denunciando violações de direitos humanos e liberdades fundamentais. Os países pediram o desmantelamento de grupos paramilitares e a reativação de um diálogo nacional.
RPR/ap/afp/rtr
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