Os próximos passos do Brexit
29 de março de 2017Cerca de nove meses depois de 52% dos britânicos que compareceram ao plebiscito sobre o Brexit optarem pela saída do Reino Unido da União Europeia (UE), a primeira-ministra Theresa May acionou, nesta quarta-feira (29/03), o Artigo 50 do Tratado de Lisboa, marcando assim oficialmente o início do processo de divórcio dos outros 27 países.
O que exatamente é o Artigo 50?
O Artigo 50 faz parte do Tratado de Lisboa, assinado por todos os membros da União Europeia (UE) em dezembro de 2007. Ele determina o procedimento para qualquer país que deseje sair da UE. Até ele virar lei, dois anos depois, não havia um mecanismo formal para um país deixar o bloco.
Em apenas cinco parágrafos, o Artigo 50 determina que qualquer país que queira deixar a União Europeia deve informar o Conselho Europeu sobre a sua decisão. Feito isso, começam as negociações para definir como vai se dar essa saída.
Acionar o Artigo 50 afeta de imediato a presença do Reino Unido na UE?
Ao longo dos dois anos previstos de negociações, o Reino Unido continuará comprometido com as leis e normas da União Europeia, incluindo o mercado comum e a liberdade de movimento de trabalhadores. O país também é obrigado a honrar seus compromissos como Estado-membro, apesar de Londres ter abdicado da presidência rotativa do Conselho Europeu - marcada para o segundo semestre de 2017 - para se concentrar nas negociações de saída.
O Reino Unido também poderá participar do processo legislativo da UE, desde que as leis não estejam relacionadas ao Brexit, mas não poderá participar de qualquer debate interno relacionado à sua saída.
O Reino Unido pode mudar de ideia durante o processo?
O Artigo 50 nunca foi usado, por isso não há precedente que esclareça sobre sua reversibilidade. A primeira-ministra Theresa May já deixou claro que "Brexit significa Brexit", mas o primeiro-ministro de Luxemburgo, Xavier Bettel, sugeriu ao diário britânico The Independent que, "talvez durante o processo, o Reino Unido resolva dizer 'nós amamos vocês tanto que não vamos conseguir concluir esse divórcio'." Se Westminster decidir retirar seu pedido para deixar o Reino Unido, porém, a questão poderá ser levada ao Tribunal de Justiça da União Europeia.
Qual o cronograma do Brexit?
Depois de o Reino Unido acionar o Artigo 50, os demais 27 países vão se reunir numa cúpula marcada para 29 de abril, na qual definirão os procedimentos para a saída, "levando em consideração o âmbito da sua [do Reino Unido] futura relação com a união."
No mais tardar em junho, as negociações entre o Reino Unido e a União Europeia já deverão estar em andamento. Espera-se que Westminister defina uma nova legislação – o Grande Projeto de Revogação – até meados do segundo semestre. Isso significa que toda legislação europeia será transformada em projeto de lei britânico, e o Parlamento poderá determinar o que permanece e o que será descartado.
Após a definição de um rascunho de acordo, este deverá ser votado pelo Parlamento britânico, pelo Conselho Europeu e pelo Parlamento Europeu.
Quem são os negociadores?
Três negociadores britânicos exercerão papéis centrais nas negociações de saída: o secretário do Brexit, David Davis, o secretário do Exterior, Boris Johnson, e o secretário de Comércio Internacional, Liam Fox. Theresa May, como primeira-ministra, terá a palavra final sobre qualquer acordo.
Os demais 27 países da UE estarão representados pelo negociador-chefe da Comissão Europeia, o ex-ministro francês Michel Barnier.
Quais são os pontos-chaves do acordo?
Acesso ao mercado comum europeu e acordos comerciais para o intercâmbio de produtos e serviços entre o Reino Unido e a União Europeia estarão no topo da agenda.
O negociador-chefe da UE, Michel Barnier, já disse que o Reino Unido terá de aceitar a liberdade de movimento de trabalhadores sem exceções se quiser manter o livre acesso ao mercado comum europeu.
A liberdade de movimento de trabalhadores e os direitos de estada e de trabalho de 3 milhões de cidadãos europeus que estão no Reino Unido e de 1,2 milhão de britânicos que estão nos outros países europeus também terão que ser definidos. Muitos cidadãos britânicos e europeus nessa situação já expressaram a preocupação de que serão usados como moeda de barganha no processo.
Qual o custo do Brexit para o Reino Unido?
Os britânicos podem esperar um divórcio caro. O presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, já alertou que "nossos amigos britânicos precisam saber – e já sabem – que não haverá desconto nem custo zero." O negociador-chefe do Brexit, Michel Barnier, teria como meta uma "conta de saída" de 60 bilhões de euros.
O que acontece se não houver acordo depois de dois anos de negociações?
Muitos analistas avaliam que as negociações do Brexit serão um divórcio difícil, que poderá tomar mais do que os dois anos previstos. Se um acordo não for alcançado nesse período, as negociações poderão ser estendidas, mas apenas se todos os países-membros concordarem com isso.
Antes de o Reino Unido poder deixar a União Europeia, qualquer acordo precisa ser aprovado por maioria qualificada (no caso, 72% dos demais 27 países-membros, representando 65% da população) e pelo Parlamento Europeu.
O Reino Unido pode deixar a UE sem chegar a um acordo?
Em tese, o Reino Unido pode deixar a União Europeia sem qualquer acordo, e os tratados e leis da UE deixariam de ter validade no país. Nesse caso, porém, poderá haver direitos adquiridos tanto para cidadãos da União Europeia como do Reino Unido.
Sem acordos comerciais, o Reino Unido terá que adotar as tarifas básicas da Organização Mundial do Comércio (OMC), que são mais elevadas do que as atuais.
Haverá uma penalização financeira se não houver acordo pós-Brexit?
Uma consulta feita pela Câmara dos Lordes concluiu que o Reino Unido estará numa posição privilegiada para deixar a União Europeia sem pagar nada se não houver acordo pós-Brexit.
Mas a Câmara alertou contra uma saída sem qualquer contribuição financeira, já que isso "prejudicaria as perspectivas de se chegar a um acordo amigável em outras questões."
O Reino Unido poderá um dia retornar à UE?
Se um dia quiser retornar à UE, o Reino Unido terá que submeter sua candidatura dentro das regras estipuladas pelo Artigo 49 do Tratado de Lisboa, como qualquer outro país que desejar ingressar na UE.