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Outono de reformas

Soraia Vilela17 de outubro de 2003

Mudanças aprovadas no Parlamento pela coalizão de governo reduzem benefícios sociais, reestruturam o mercado de trabalho e estabelecem antecipação da reforma fiscal.

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Gerhard Schröder: sorrisos otimistas no ParlamentoFoto: AP

O Bundestag, câmara baixa do Parlamento alemão, esteve nesta sexta-feira (17/10) tão cheio como nunca. Ao lado do vai-e-vém nos corredores, os deputados alemães aprovaram reformas básicas para o mercado de trabalho do país. As mudanças que estão por vir colocam em xeque as regalias do Estado do bem estar social, empurrando para as mãos do cidadão, por exemplo, uma parcela maior de responsabilidade sobre seu próprio desemprego.

Ovelhas guiadas?

As discussões que envolveram as reformas em questão levaram o diário Süddeutsche Zeitung a tirar das prateleiras até mesmo as teorias do filósofo Immanuel Kant, com o intuito de justificar para o cidadão a “liberdade” que está por trás das reformas nas estruturas do país. “Se gordas parcelas da população forem sustentadas pelo Estado, a sociedade corre o risco de retornar à vida de ovelhas dominadas por um pastor”, comenta o jornal parafreseando Kant.

Na Alemanha moderna do terceiro milênio, com a qual o filósofo certamente nem mesmo sonhava, os cofres de um Estado, que esbanjou por décadas benefícios sociais, estão ficando cada vez mais vazios. Acostumados às bonanças do passado desde o período que sucedeu o pós-guerra, os cidadãos do país terão provavelmente que passar a colocar a mão no bolso para ir ao dentista, ao médico, além de terem que engolir quaisquer propostas de emprego do Departamento do Trabalho – que passará a se chamar Agência Nacional do Trabalho.

Wartezimmer beim Arbeitsamt
Distribuição de senha no Departamento de Trabalho de Frankfurt, em janeiro últimoFoto: AP

Nova nomenclatura

O sentido do novo termo é claro: o organismo oficial não deverá mais cuidar do sustento de desempregados de longo prazo, mas passará a cumprir a tarefa de “agenciar” empregos. Mídia e empresariado questionam, no caso, se uma simples mudança de nomes irá trazer uma ampliação real do mercado de trabalho, como promete o governo.

Uma das reformas aprovadas obriga o desempregado a aceitar qualquer tipo de atividade que lhe é oferecida pela nova Agência do Trabalho. Caso contrário, não poderá mais usufruir de seu seguro-desemprego. “Precisamos de espaço para investimentos e consumo. Quem recusa uma proposta de trabalho razoável, tem que contar com cortes na ajuda do Estado”, justifica Wolfgang Clement, ministro da Economia e do Trabalho.

Fim de festa

Hoje, em cidades como Berlim, quase metade da população recebe, de alguma forma, algum tipo de ajuda do Estado. Durante décadas reinou o princípio do “continuismo”: políticos buscando novas formas de manter o status quo, pois reformas como as de agora não costumam encher as urnas de votos. O que parece claro é que os cofres do país, enfim, não agüentam mais.

As conseqüências do envelhecimento da população e das desventuras da economia mundial para a Alemanha são vistas pelo ministro das Finanças, Hans Eichel, como “dramáticas”. E para sair razoavelmente ileso dessa ciranda, o país oferece “mais liberdade” a seu cidadão.

Liberdade para pagar mais caro pelo cigarro, para aceitar um emprego que não faz jus à própria qualificação e até mesmo para os sonegadores de impostos, quando estes se arrependerem de seus feitos e quiserem remeter dinheiro de volta ao fisco. Resta saber até que ponto estas medidas irão conseguir reaquecer a economia do país.