Precisamos falar sobre Lula
10 de janeiro de 2018Lula. Mesmo neste início de 2018, precisamos inevitavelmente falar sobre o ex-presidente. É que, daqui a exatamente um ano, ele poderá voltar a ocupar o cargo executivo mais alto do país.
Mas, primeiro, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região em Porto Alegre deverá julgar o recurso no caso do tríplex do Guarujá. Vai ser no dia 24 de janeiro – um verdadeiro toque de trombetas para abrir o ano eleitoral.
Uma condenação acaba com as perspectivas de Lula sobre uma candidatura? Nem mesmo especialistas em Direito parecem ter uma resposta clara a essa pergunta. É possível que haja mais recursos e apelações. O STF ainda poderá se pronunciar sobre a Lei da Ficha Limpa e sobre a prisão após condenação em segunda instância.
Tampouco uma absolvição serviria para esclarecer a questão, já que Lula ainda deverá enfrentar outros processos este ano.
A única coisa que parece certa é que o Brasil se encaminha para uma eleição presidencial realizada sob ressalvas jurídicas. Em outras palavras: o caos político continua.
Isso é bom para nós, correspondentes estrangeiros no país. Já a condenação de Lula em primeira instância, no ano passado, chamou muita atenção na Alemanha. É inegável que o ex-presidente era e é uma figura excepcional, não importa o posicionamento político ou pessoal que se tenha em relação a ele. A biografia incomum, o carisma irresistível e os êxitos surpreendentes no combate à pobreza o transformaram no queridinho da imprensa.
O fato de Lula subitamente se ver envolvido em um escândalo de corrupção, o mensalão, foi explicado aos leitores alemães com a observação de que a política lamentavelmente é um negócio sujo. E que sem um pouco de corrupção não se faz nada. E assim Lula deixou o palco político do país em 2010 com níveis recordes de crescimento e popularidade e aclamado pela imprensa internacional.
Mas os tempos mudaram. Após quatro anos de Lava Jato, caos político e a condenação em série de empresários e políticos de todos os campos, ficou difícil explicar a situação do Brasil aos leitores alemães.
Os ânimos agitados por todos os lados contribuem para isso. Para alguém de fora, parece um Fla-Flu político, com toda a comoção, paixão e drama de novela que fazem parte de um clássico como esse. Os torcedores gritam para que o juiz tire os jogadores do time adversário de campo. Em seguida, quando ele apita contra o próprio time, o xingam de ladrão.
Nesse contexto, fica cada vez mais difícil avaliar racionalmente se a bola bateu na mão ou a mão na bola, se o pênalti foi corretamente apitado ou quem é o vencedor moral da partida. Juntam-se a isso mensagens de ódio e difamação de todos contra todos nas redes sociais.
Nos últimos 20 anos, eu nunca percebi o clima político e social brasileiro tão tóxico como agora. Um profundo amargor substituiu a leveza dos brasileiros. Há alguns dias, um taxista em Salvador me contou que não tem coragem de dizer aos seus passageiros que é petista – mesmo que, com a ampliação maciça das universidades públicas e o aumento de escolas técnicas, Lula tenha feito mais pela Bahia do que todos os outros políticos juntos.
Enquanto isso, manifestantes na Zona Sul do Rio de Janeiro exigem a prisão imediata de Lula. Eles dizem que não pode haver misericórdia com o "chefe do petrolão".
Hoje, Lula é a figura que racha o Brasil entre apoiadores e adversários. E, assim, é ele que vai definir a eleição de 2018 – seja como candidato, seja como excluído da votação.
Em 2018, todos precisaremos falar sobre Lula.
Thomas Milz saiu da casa de seus pais protestantes há quase 20 anos e se mudou para o país mais católico do mundo. Tem mestrado em Ciências Políticas e História da América Latina e, há 15 anos, trabalha como jornalista e fotógrafo para veículos como o Bayerischer Rundfunk, a agência de notícias KNA e o jornal Neue Zürcher Zeitung. É pai de uma menina nascida em 2012 em Salvador. Depois de uma década em São Paulo, mora no Rio de Janeiro há quatro anos.
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