Presidente alemão visita Israel em sua primeira viagem oficial ao exterior
27 de maio de 2012O presidente da Alemanha, Joachim Gauck, nasceu e se criou na ex-Alemanha Oriental, que não mantinha relações oficiais com o Estado de Israel. O governo da República Democrática Alemã (RDA), que se auto-intitulava "Estado não fascista", não se via como sucessor do "Terceiro Reich", não assumindo, por isso, nenhuma responsabilidade pelo passado histórico alemão.
No caso da então Alemanha Ocidental, a solidariedade com os israelenses era um fundamento da política nacional. A primeira viagem do novo presidente alemão depois de sua posse é, em nome desta tradição, a Israel. No decorrer de sua visita, que se estende até a próxima quinta-feira (31/05), ele irá também aos territórios palestinos.
Solidariedade e razão de Estado
O primeiro chanceler federal da então Alemanha Ocidental no pós-guerra, Konrad Adenauer, já se esforçava para estabelecer boas relações com o Estado judeu fundado em 1948. No ano de 1953, ele assinou o acordo de reparação com o fundador do Estado israelense, David Ben Gurion. Em 1965, as relações diplomáticas entre os dois países foram oficializadas. Hoje, a Alemanha é considerada um dos aliados mais importantes do Estado judeu.
Para a chanceler federal Angela Merkel, a segurança de Israel é uma questão de razão de Estado. A população alemã, contudo, não segue há muito o caminho do governo neste contexto. Entre a opinião pública do país, Israel tem uma imagem cada vez menos respeitada. Em uma enquete realizada pela revista Stern, 59% dos participantes apontaram Israel como um país agressivo – um percentual 10% maior do que o registrado há 10 anos, em enquete semelhante.
E aproximadamente dois terços da população alemã acreditam que Israel defende seus próprios interesses sem levar outros povos em consideração. Apenas 36% dos questionados afirmam ter simpatia por Israel – quase 10% menos que há três anos. E 13% dos participantes da enquete se posicionaram até mesmo contra o direito de existência do Estado israelense.
Amizade e distância
"Entre a Alemanha e Israel não há amizade", afirma sobriamente o historiador Michael Wolffsohn, de Munique. Desde 1981, a distância entre os dois países vem aumentando, o que fica claro em enquetes como esta, disse ele durante um debate em Berlim. Depois da Guerra dos Seis dias, em 1967, Israel gozou de uma fama extraordinária na Alemanha, que foi abalada, contudo, depois da Guerra do Yom Kipur, em 1973.
A ruptura mais profunda se deu em 1981, quando o fornecimento de armas alemãs à Arábia Saudita desencadeou uma séria controvérsia entre os então chefes de governo dos dois países: Menachem Begin e Helmut Schmidt. Hoje Israel consta como um dos países pelos quais a opinião pública alemã nutre menos simpatia, acredita Wolffsohn. Sobretudo entre os jovens a distância do Estado judeu é cada vez maior. Eles se veem cada vez menos responsáveis por uma dívida histórica frente a Israel, embora continuem se interessando pelo assunto.
Interesse e crítica
A historiadora teuto-israelense Tamar Amar-Dahl conhece esta realidade de perto. Professora de História Israelense na Universidade Livre de Berlim, ela não pode reclamar da procura por suas aulas. O interesse dos estudantes alemães por Israel é grande, diz ela em entrevista à DW. "Israel tem algo de fascinante para os alemães, quase de misterioso, algo que é difícil de digerir", comenta a professora.
"Tratar de temas ligados a Israel, diz ela, significa para os estudantes se confrontar com a história de perseguição e sofrimento dos judeus e com isso com o passado judaico-alemão comum. Eles querem entender Israel como um projeto nacional de Estado, cuja trajetória positiva poderia suavizar a culpa alemã", analisa.
"No entanto, o projeto sionista fracassou 70 anos depois da Shoá: o Estado judeu não oferece segurança a seus habitantes, sejam judeus ou não", resume a historiadora. Esta constatação está se disseminando aos poucos também na Alemanha, diz ela.
"Gradualmente vai-se compreendendo que a política inviável de Israel é uma das responsáveis por essa situação", fala Amar-Dahl. Por isso, os alemães se veriam em um dilema: eles precisam tentar unir seu profundo peso de consciência em relação à história à crítica necessária ao Estado de Israel hoje. Para isso, é preciso adquirir uma postura soberana e diferenciada frente ao governo israelense.
Amar-Dahl não acredita que os dois países mantenham relações normais. Isso, segundo ela, não será possível nem a longo prazo, porque os crimes cometidos pelos alemães contra os judeus foram monstruosos demais. "A Shoá ainda vai permanecer por muito tempo entre os dois povos", conclui a historiadora.
Submarinos e um poema
Apesar disso, quase 70 anos após o fim da Segunda Guerra Mundial, as relações oficiais entre Alemanha e Israel são boas e estáveis. Desde 2008, acontecem reuniões regulares entre representantes dos dois países, alternadamente em Berlim e Jerusalém. E, dentro da União Europeia, a Alemanha é vista como defensora de Israel.
Além disso, a Alemanha é bem-vista pelo governo israelense como fornecedora de armas. Há poucas semanas, por exemplo, chegou às mãos da Marinha israelense o quarto submarino da classe Delfim, produzido na Alemanha.
O governo de Israel encomendou a Berlim um total de seis submarinos passíveis de serem usados com fins nucleares, sendo que cada um deles custa em torno de meio bilhão de dólares – a arma mais cara da qual Israel dispõe. E a Alemanha arca com parte destes custos. O país doou a Israel os dois primeiros submarinos e subvencionou a construção dos outros com centenas de milhares de euros.
O fornecimento de submarinos a Israel foi também a razão que levou o escritor alemão Günter Grass a demonstrar suas preocupações com as tensões crescentes no Oriente Médio e a explicitar sua crítica à política israelense.
Em abril último, o Nobel de Literatura publicou um poema em diversos jornais alemães e estrangeiros, no qual atacou severamente Israel em função das ameaças do país ao Irã. Com isso, Grass desencadeou uma onda de indignação contra sua pessoa. O governo israelense o intitulou persona non grata. É possível que o presidente Gauck retome este assunto durante sua visita ao país.
Autora: Bettina Marx (sv)
Revisão: Roselaine Wandscheer