Pressionado, Hollande se esquiva de perguntas sobre caso com atriz
14 de janeiro de 2014Sintomaticamente, a primeira pergunta que partiu dos cerca de 500 jornalistas franceses e estrangeiros presentes à coletiva de imprensa do presidente da França, François Hollande, foi: "Valérie Trierweiler ainda é a primeira-dama?"
Recordista de impopularidade – a aprovação a sua gestão está em apenas 22% – e diante do momento mais delicado de sua carreira de homem público, o chefe de Estado pretendia que a entrevista desta terça-feira (14/01), a terceira de seu mandato, fosse uma espécie de relançamento político.
Em vez disso, viu-se forçado a se esquivar da curiosidade da imprensa em torno do escândalo recentemente desencadeado pelas revelações do semanário Closer sobre um suposto caso seu com a atriz cinematográfica francesa Julie Gayet, de 41 anos.
Hollande adiantou que não pretende processar a revista de fofocas. Segundo conhecidos de sua companheira, a jornalista Valérie Trierweiler, ela está profundamente abalada pela divulgação do caso, e teve que ser hospitalizada na sexta-feira, por tempo indeterminado.
"Todo mundo, em sua vida pessoal, pode atravessar provações. Este é o nosso caso. São momentos dolorosos", declarou o presidente. "Mas tenho um princípio: assuntos privados se tratam em particular, na intimidade respeitosa de cada um. Portanto aqui não é o lugar nem o momento para fazê-lo."
Primeira-dama que não existe
O político socialista de 59 anos encerrou o assunto assegurando que dará todos os esclarecimentos cabíveis antes da visita aos Estados Unidos, programada para entre 9 e 11 de fevereiro, durante a qual Trierweiler deveria acompanhá-lo.
Para os detratores de François Hollande, mais do que um escândalo moral, o caso Gayet é interpretado como a confirmação de um caráter fraco e incapaz de decisões sólidas. Suas escapadas noturnas do palácio presidencial seriam uma "metáfora para seu estilo de governo enrustido".
Apesar de obsessivamente evocada pela imprensa marrom, a "primeira-dama" não existe aos olhos da lei francesa. Ao contrário do glamour das first ladies americanas, nenhum status oficial está previsto para o cônjuge do presidente da República, independente do sexo e de a união ser legalizada ou não. A função dessa figura – muitas vezes onerosa, mesmo não estando definida em forma protocolar ou constitucional – tem sido frequente objeto de polêmica no país.
Apelo à cooperação alemã
Na entrevista, para além de sua vida pessoal, Hollande manifestou-se sobre uma gama ampla de temas, indo desde a interdição da peça antissemita do humorista Dieudonné ("uma vitória") e o recorde de 20 mil nômades da etnia rom deportados em 2013 ("a França não tem por que se envergonhar"), aos 700 jovens franceses e estrangeiros que partiram do país para o jihad na Síria ("É demais. Alguns estão mortos.").
Antes de se disponibilizar para as perguntas dos jornalistas, o socialista fizera um preâmbulo de 40 minutos, em que antecipou reformas visando a dinamizar a economia do país. Com grande ênfase, anunciou três iniciativas franco-alemãs para tentar "relançar" a União Europeia, num ano de eleições europeias delicadas e da renovação das instâncias de governo do bloco.
A primeira iniciativa será "por uma convergência econômica e social entre a França e a Alemanha", uma ideia já antiga, mas que tem esbarrado nas diferenças de modelo e de saúde econômica entre os dois países.
Segundo Hollande, desse ponto de vista, seria "um primeiro passo" a decisão da coalizão conservadora-socialista alemã, liderada por Angela Merkel, de estabelecer um salário mínimo. "Mas devemos também harmonizar as regras fiscais entre a França e a Alemanha, notavelmente para as empresas", no sentido do "pacto de responsabilidade", acrescentou.
A segunda iniciativa, prosseguiu Hollande, consistirá em Berlim e Paris coordenarem sua ação em termos de transição energética, setor em que a Alemanha tomou a dianteira, sobretudo no desenvolvimento da energia renovável. "Esse é um grande desafio para a Europa, mas nós devemos mostrar o exemplo", na forma de "um grande empreendimento franco-alemão para a transição energética, uma bela aliança".
"Europa da Defesa"
Por fim, ele evocou a criação de uma dupla binacional capaz de "agir pela Europa da Defesa", o que, até aqui, tem sido um de seus pontos fracos, já que a colaboração militar se limita ao essencial – ou seja, a uma "brigada franco-alemã" cuja utilidade ainda está por ser demonstrada.
Com isso, o chefe de Estado aludia obviamente a algo que, há bom tempo, vem sendo criticado nos círculos governamentais franceses: a reticência alemã em relação às missões militares internacionais, sobretudo às realmente perigosas.
"Devemos fazer mais do que simplesmente uma brigada. Devemos mostrar uma responsabilidade comum pela paz e a segurança no mundo", arrematou.
Essas três iniciativas fazem parte da pauta da próxima conferência franco-alemã de ministros, marcada para 19 de fevereiro em Paris.