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"Pressão feita pelas big techs foi abuso de poder econômico"

26 de maio de 2023

Relator do PL das Fake News, Orlando Silva diz que resistência ao tema está diminuindo no Congresso e que acredita que projeto possa ser aprovado ainda no primeiro semestre, apesar da pressão das "big techs"

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Orlando Silva
O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), relator do projeto de lei das Fake NewsFoto: Pablo Valadares/Câmara Federal

Relator do projeto de lei das Fake News, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) acredita que o projeto será apreciado pela Câmara dos Deputados até o fim do semestre, mas evita estipular uma data. O parlamentar, no entanto, acredita que a resistência à proposta na Câmara está diminuindo entre "quem está disposto a uma construção”, disse ele em entrevista à DW Brasil.

O projeto de lei, que entre outras coisas que as plataformas sejam responsabilizadas de forma solidária pela reparação de danos se a distribuição de conteúdo falso tiver sido feita mediante pagamento, teve o caráter de urgência aprovado em abril deste ano. Desde então, o tema não foi ao plenário, por temor de que não tenha votos suficientes para ser aprovado. "Essa é uma agenda que está se impondo porque é uma necessidade do presente. O parlamento precisa deliberar”, ressaltou o deputado.

Na noite desta quinta-feira (24), em entrevista à GloboNews, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) afirmou que uma saída para que o tema seja apreciado no plenário é o fatiamento da proposta, deixando questões que envolvem a remuneração dos veículos jornalísticos e os direitos autorais dos artistas, pontos que têm gerado discórdia, em outro projeto de lei. 

"Eu penso que o caminho do projeto vai ser fracionamento dele. Nós estamos aí na discussão da remuneração dos meios de comunicação e dos direitos autorais, sob a relatoria do deputado Elmar Nascimento, numa conjunção de vários projetos na casa, para ter um texto adequado, para a gente resolver esse problema, que muitos acusavam que não deveria estar [na proposta] das fake news", disse Lira.

Na entrevista à DW Brasil, Silva criticou a atuação das Big Techs e afirmou que elas, por vezes, exercem abuso de poder econômico para dificultar o diálogo sobre a PL das Fake News. Segundo ele, a possibilidade de o Supremo Tribunal Federal (STF) tenha que legislar sobre o tema caso os parlamentares não cheguem a um acordo não é bom para o Congresso. "O melhor cenário é que o parlamento cumpra sua função típica.”

DW Brasil: Quais são os principais pontos de entrave para que o PL das Fake News seja voltado?

Orlando Silva: Nós votamos e aprovamos o regime de urgência, que foi um passo fundamental para a aprovação. Após a urgência, muitas sugestões foram encaminhadas, então, foi necessário um tempo a mais para aprimorar o texto. Houve uma resistência contra um modelo de órgão fiscalizador, mas aquele formato foi retirado do texto. Agora, existe um lobby muito forte, uma pressão que por vezes chegou a ser abuso de poder econômico,feito pelas big techs. Isso se soma a alguns setores do parlamento refratários à regulação. Contudo, nós estamos dialogando e quebrando resistências de quem está disposto a uma construção. Tenho convicção que conseguiremos a aprovar o projeto ainda no primeiro semestre.

Por que o PL das Fake News não pode ser considerado uma ameaça à liberdade de expressão, como alegam as Big Techs?

Porque é uma narrativa falsa, uma fake news. No projeto não há nenhuma forma de cerceamento à liberdade de expressão, nenhuma censura. O que há é uma mudança no regime de responsabilidade das plataformas para que não sejam omissas com a utilização dos serviços para cometimento de crimes.  

O senhor tem ressaltado que a PL das Fake News é baseada em experiências na União Europeia, Austrália e Canadá. O que absorveu das leis destes países?

O principal é o regime de responsabilidade e o dever de cuidado, que pretendem que as plataformas tenham de seguir um protocolo, tenham que agir para coibir seu uso no fomento a eventos de alto risco, o que temos chamado de "risco sistêmico”, como, por exemplo, a tentativa de golpe de 8 de janeiro ou o incentivo de ataques a escolas em 20 de abril. Outra ideia é a de remuneração de conteúdo jornalístico, para promover a informação produzida com método, checagem, parâmetros éticos, etc. Em suma, informação de qualidade para combater a desinformação.

A demora na votação do projeto é uma questão de articulação política do governo no Congresso? Como pacificá-la?

Tenho dito que o PL 2630 não é uma questão de governo ou de oposição, mas é uma necessidade da sociedade brasileira, assim como vem ocorrendo em outros países do mundo. Tanto é assim que esse tema já estava em debate no governo anterior [o projeto foi aprovado no Senado, mas está paralisado na Câmara desde então]. Ou seja: essa é uma agenda que está se impondo porque é uma necessidade do presente. Portanto, o parlamento precisa deliberar.

Qual a posição do governo sobre a supervisão da lei? Haverá criação de órgão regulador?

Um órgão para fiscalizar o cumprimento da lei e, eventualmente, aplicar as sanções precisará existir. Pode ser um criado ou algum que já existe e tenha essa atribuição delegada.

É possível que um colegiado com membros do Executivo, Judiciário e Legislativo fique responsável por essa regulação?

Recentemente, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) trouxe uma proposta parecida, que reuniria indicações dos três Poderes e também da sociedade civil.

Como analisa a possibilidade de o Supremo Tribunal Federal legislar sobre o tema? Isso é ruim pro legislativo?

O Supremo Tribunal Federal foi provocado a se manifestar sobre a constitucionalidade do Artigo 19 do Marco Civil de Internet. É importante afirmar isso, porque alguns setores falam como se o Supremo estivesse exorbitando. Isso posto, é evidente que o melhor cenário é que o parlamento cumpra sua função típica e aprove uma legislação que regule as plataformas digitais.

A imunidade parlamentar estendida na esfera digital não pode ser prejudicial ao combate às fake News diante do que temos visto recentemente?

O projeto apenas transcreve o que já está disposto no Art. 53 da Constituição Federal sobre a imunidade material dos parlamentares por suas palavras, opiniões e votos. Já há até julgados no Supremo que trazem o entendimento que ela vale para as redes sociais.

Mas, que não se confunda a imunidade por palavras, opiniões e votos com o cometimento de crimes. Se um parlamentar sobe à tribuna ou vai às redes sociais para cometer um crime, como por exemplo, de injúria ou de incitação a um golpe de Estado, ele será processado e julgado por isso. Recentemente, tivemos um parlamentar preso por incitação ao crime em suas redes sociais, agora temos um sendo processado por injúria cometida na tribuna da Câmara. Então, não vejo que isso mude nada do que já está estabelecido na Constituição.