Processo de impeachment deve afetar economia já em recessão
3 de dezembro de 2015A decisão do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, de acolher nesta quarta-feira (02/11) o pedido de abertura de um processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff ameaça agravar o cenário de incerteza da já abalada economia brasileira, que enfrenta recessão e o aumento progressivo da taxa de desemprego.
Segundo especialistas ouvidos pela DW Brasil, o processo de impeachment deverá paralisar o governo federal e o Congresso. Medidas importantes, como o ajuste fiscal, ficarão em segundo plano e a recuperação econômica do país ficará ainda mais distante. Além disso, investidores deverão ficar ainda mais pessimistas, e agências de classificação de risco poderão rebaixar a nota de crédito do país.
"O processo de impeachment vai paralisar o Congresso e o governo, que concentrará suas energias para salvar o mandato de Dilma Rousseff", afirma Paulo Sotero, diretor do Instituto Brasil do Wilson Center, em Washington. "As medidas necessárias do ajuste fiscal estão comprometidas, e o quadro de inflação e desemprego deve se deteriorar."
Para a economista Cecília Melo Fernandes, a recuperação da economia no longo prazo vai depender do desfecho do processo de impeachment. No entanto, o fato de o pedido ter sido aceito já gera custos como um aumento do risco-país, levando a uma maior desvalorização do real, afetando a inflação e acentuando o efeito negativo das expectativas dos agentes financeiros.
"Em decorrência desse cenário, em última instância, a política monetária deve responder de forma mais restritiva no futuro próximo, aumentando os juros, o que pressiona negativamente os investimentos, eventualmente aumenta o desemprego e piora a atividade econômica do país", frisa Fernandes. O Banco Central manteve no final de novembro a taxa básica de juros (Selic) em 14,25% ao ano, que poderá ser revista na próxima reunião.
Ambiente desafiador
A crise política deverá deixar o ambiente econômico ainda mais desafiador. De acordo com dados divulgados pelo IBGE nesta terça-feira (01/12), a economia brasileira registrou uma queda de 1,7% no terceiro trimestre de 2015 em comparação com o segundo trimestre. O acumulado de janeiro a setembro mostra uma queda do Produto Interno Bruto (PIB) de 3,2%.
A projeção de instituições financeiras para a inflação deste ano subiu pela 11ª semana seguida. A estimativa do Boletim Focus, do Banco Central, para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) passou de 10,33% para 10,38% nesta segunda-feira.
A desaceleração da economia vem acompanhada de uma piora no mercado de trabalho, o que agrava a crise. No trimestre encerrado em agosto, a taxa de desemprego no país foi de 8,7% – sendo que era de 6,9% no mesmo período de 2014 e de 8,1% de março a maio.
Marcos Troyjo, diretor do BRICLab da Universidade de Columbia, acredita que os fundamentos da economia serão pouco afetados com a atual crise. Para ele, nada mudará, no curto prazo, em termos de inflação, emprego e taxa básica de juros.
"Já no que toca às percepções, a possibilidade de um governo de Michel Temer [atual vice-presidente], assentado em princípios pró-mercado, pode levar a uma valorização dos ativos brasileiros que respondem mais rápidos às mudanças, como a bolsa de valores, empresas estatais e a moeda brasileira", diz Troyjo. "Tudo isso, claro, depende da evolução política, o que promete muitos solavancos ainda à frente para a economia."
Rebaixamento de nota
O aprofundamento da crise política e econômica deverá abalar a credibilidade do Brasil junto aos investidores. Quando rebaixou a nota de crédito do Brasil de BBB para BBB- na metade de outubro, a agência de classificação de risco Fitch, afirmou que alguns dos principais motivos eram a queda do crescimento econômico e, ainda, a instabilidade política no país – que aumentou desde quarta-feira. Em setembro, a Standard&Poor's retirou o selo de bom pagador do país.
O possível aumento da taxa básica de juros dos EUA, ainda em dezembro, deverá também abalar a atratividade brasileira junto aos mercados financeiros internacionais. A alta poderá motivar a saída de recursos hoje aplicados em países emergentes como o Brasil para os EUA, onde os investimentos são considerados mais seguros.
"A economia vai mal e agora vai começar um novo e importante processo político. Mas o impacto poderá ser piorado ou atenuado, isso depende de como a classe política vai agir", afirma Adriano Gianturco, professor de Ciência Política do Ibmec/MG. "Se o processo for rápido, limpo e bem gerenciado, o resultado vai levar à estabilidade e, logo, a perspectivas melhores."