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Que provas o MPF tem contra Lula?

Jean-Philip Struck16 de setembro de 2016

Para especialistas, procuradores conseguem demonstrar que empreiteira OAS pagou regalias ao ex-presidente, mas ainda precisam comprovar que elas resultam de propina em troca de ajuda em contratos com a Petrobras.

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Luiz Inácio Lula da Silva
Foto: picture-alliance/AP Photo/F. Dana

Após a apresentação da denúncia contra o ex-presidente Lula pelo Ministério Público Federal (MPF) do Paraná, uma frase falsa atribuída a um dos procuradores da Lava Jato gerou controvérsia. "Não temos provas, mas temos convicção" rapidamente se espalhou pelas redes sociais. Ainda que a frase tenha sido posteriormente desmentida, ela sintetizou os principais questionamentos sobre o que foi apresentado pelos promotores e sobre o peso das provas.

O ex-presidente foi denunciado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. As acusações se referem a um tríplex no Guarujá e à armazenagem de bens num depósito, que, juntos, totalizam 3,7 milhões de reais e, segundo o MPF, caracterizam o pagamento de propina por parte da empreiteira OAS. No caso do tríplex, o MPF afirma que Lula seria o proprietário oculto do imóvel. Como provas, os procuradores apresentaram planilhas, depoimentos e recibos.

Segundo o MPF, Lula e sua mulher, Marisa Letícia, adquiriram cotas de um apartamento comum no prédio, que foi concluído pela OAS, mas teriam recebido um imóvel maior – um tríplex – sem pagar pela diferença. Como prova, apresentam uma planilha apontando que o tríplex sempre constou como "reservado" depois que a OAS assumiu a construção do imóvel. Por meio de depoimentos e fotografias, o MPF afirma que somente Lula e sua família visitaram o imóvel, que nunca foi aberto a outros interessados.

Depois dessas visitas, o apartamento começou a ser decorado. Segundo depoimentos de funcionários da OAS, esse tipo de "personalização" de imóvel nunca havia sido feita pela construtora. Diante de tudo isso, o MPF concluiu que a construtora, que possuía vários contratos com o governo federal, planejava passar o apartamento para Lula.

Já o segundo eixo da acusação envolve o pagamento do aluguel de um depósito que, entre 2011 e 2016, guardou bens e presentes que Lula recebeu durante seu governo. Segundo os procuradores, a OAS desembolsou 21,5 mil reais por mês para o aluguel. O valor acumulado chega a 1,3 milhão de reais. O contrato apresentado pelo MPF mostra que tudo foi acertado pela OAS, que aparece como contratante.

O contrato afirma que seriam armazenados no depósito materiais de escritório da própria empreiteira. Só que a retirada do material, cinco anos depois, foi organizada pelo diretor do Instituto Lula, Paulo Okamotto, que admitiu o fato em depoimento. Os procuradores também apresentaram documentos que atestam os pagamentos feitos pela construtora.

Propina?

O MPF afirma que o tríplex e o aluguel do depósito teriam sido um benefício ilegal pago a Lula em troca da atuação dele na obtenção de três contratos da Petrobras com a OAS, que resultaram em desvios no valor de 87 milhões de reais. Para sustentar essa acusação, os procuradores consumiram boa parte da denúncia com uma longa dissertação de que Lula "orquestrou" e "comandou" todo o esquema de corrupção na estatal.

Os procuradores dizem que um ex-deputado do PP afirmou, em depoimento, que Lula exigiu diretamente da presidência da Petrobras a nomeação de Paulo Roberto Costa para um cargo na empresa. Costa já foi condenado por participar de desvios na Petrobras e fez delação premiada. A versão da intervenção de Lula também consta em um depoimento do ex-senador Delcídio do Amaral. Dessa forma, Lula seria responsável por nomear operadores do esquema e estaria entre os interessados em ganhar vantagens de empreiteiras.

Segundo especialistas ouvidos pela DW, é justamente nesse último ponto que a denúncia demonstra fragilidade. Para eles, o MPF apresenta evidências frouxas ao fazer uma ligação entre as vantagens obtidas por Lula da OAS e uma possível ajuda do ex-presidente nos três contratos da empreiteira com a Petrobras, o que caracterizaria o pagamento de propina.

Segundo o jurista e ex-desembargador Wálter Maierovitch, há provas claras de que houve o pagamento do depósito pela OAS, o que demonstra um comportamento "imoral, antiético e provavelmente ilegal de Lula".

"Mas, mesmo assim, isso não demonstra que o pagamento desse aluguel ocorreu por causa de alguma intervenção de Lula nesses contratos. Do jeito que está, fica difícil provar uma participação de Lula em troca de algo. Juridicamente, as vantagens podem ser vistas de outra maneira, como um mero presente ou agrado – algo também escandaloso, mas ainda assim sem ser resultado de propina. Os procuradores estão trabalhando com muitas presunções."

Sem denúncia por participação em quadrilha

Já Eloísa Machado, professora de Direito na Fundação Getúlio Vargas (FGV), afirma estranhar que o MPF tenha feito afirmações tão graves sobre Lula ser o chefe de uma quadrilha sem denunciá-lo por participação em organização criminosa.

"Tecnicamente, a peça é uma denúncia pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. Só que há muito mais. Ela afirma que Lula teria sido o chefe de um megaesquema de corrupção envolvendo a Presidência. É muito estranho que uma afirmação dessas não venha acompanhada de um pedido de abertura de ação penal."

O MPF justificou a ausência dessa acusação afirmando que a suspeita já é investigada em um inquérito que tramita no Supremo Tribunal Federal. Em maio, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu que Lula fosse incluído nele.

Maierovitch, no entanto, não acha a justificativa convincente. "Há uma diferença entre inquérito e denúncia. Se os procuradores de Curitiba estavam tão convencidos de que ele é o chefe, teriam que ter apresentado denúncia ou remetido ao STF".

Já Machado afirma que a inclusão de afirmações como "orquestrou" e "comandou" escapa ao propósito da denúncia. "Me parece mais uma ação com o objetivo de fragilizar o papel político do ex-presidente", afirma.