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Quem vota na AfD e por quê?

Kay-Alexander Scholz
2 de setembro de 2019

Populistas de direita pavimentam sua ascensão com resultados expressivos nas eleições na Saxônia e Brandemburgo. Sucesso no Leste alemão deve ser agora explorado pelo partido – bem como as falhas de seus opositores.

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Jörg Urban (esq.) e Andreas Kalbitz, candidatos da AfD nas eleições estaduais em Brandemburgo e na Saxônia
Jörg Urban (esq.) e Andreas Kalbitz, candidatos da AfD nas eleições estaduais em Brandemburgo e na SaxôniaFoto: picture-alliance/dpa/M. Sohn

Os cerca de 100 convidados do evento partidário da Alternativa para a Alemanha (AfD) em Brandemburgo celebraram o resultado das eleições parlamentares estaduais deste domingo (01/09), nas quais a legenda populista de direita superou a marca de 20% dos votos. Sob o olhar de câmeras de televisão, eles festejaram as primeiras projeções exibidas num telão.

Mas a festa se ateve ao consumo de cerveja e salsicha – ninguém ousou estourar garrafas de champanhe. Não era para tanto. A AfD, liderada por Andreas Kalbitz em Brandemburgo, não venceu a eleição ali: os 23,5% dos votos tornaram a legenda a segunda maior força no estado do Leste alemão, que segue nas mãos do Partido Social-Democrata (SPD).

Na Saxônia, outro estado da antiga Alemanha Oriental e onde também houve eleição neste domingo, a vitória foi da União Democrata Cristã (CDU), que manteve o domínio em seu reduto. Com 27,5% dos votos, a AfD, liderada por Jörg Urban no estado, assegurou também na Saxônia o posto de segunda força.

O evento partidário da AfD na Saxônia foi transferido para um barco no rio Elba – sem imprensa. A decepção dentro da legenda é aparente. Afinal de contas, o estado deveria ter se tornado novo reduto dos populistas de direita.

Foi na Saxônia, em 2014, que a AfD conquistou seus primeiros assentos num parlamento estadual. Para as eleições deste ano, algumas pesquisas davam esperança de uma vitória do partido. E esta teria sido a notícia da noite para os populistas de direita: pela primeira vez, tornar-se a principal força política de um estado da Alemanha.

O que motiva os alemães a votarem na AfD não é uma pergunta simples de ser respondida, já que os eleitores são muitos e bastante diferentes. Mas há pontos a se destacar. O partido não foi escolhido desproporcionalmente por aposentados ou jovens, mas por grupos de meia-idade, principalmente homens.

Quem vota na AfD?

Um reduto da AfD é Lausitz, uma região que engloba o leste da Saxônia e o sul de Brandemburgo. Nessa área, os candidatos do partido ultrapassaram 30% dos votos e conseguiram derrotar os demais candidatos com ampla vantagem.

Lausitz corre o risco de sofrer uma mudança estrutural drástica – a segunda, depois do colapso da economia da Alemanha Oriental após a reunificação em 1989. As usinas termoelétricas de carvão lignito – a única grande indústria restante por ali – tendem a desaparecer.

Especialmente na parte da Saxônia, Lausitz é estruturalmente enfraquecida. Pesquisas de opinião apontam que pessoas em áreas estruturalmente fracas são mais inclinadas a votar na AfD.

Por muitos anos houve distinções, nos planos de desenvolvimento da Saxônia e de Brandemburgo, entre áreas onde muito foi investido e áreas onde era menos rentável investir. Essa política resultou em vilarejos parcialmente abandonados – por exemplo, na fronteira com a Polônia, outro reduto da AfD – e também em ruas sem iluminação, sem comércio e quase sem crianças.

Nessas áreas, muitos se sentem abandonados pelos governantes. Os moradores ali tiveram poucas chances de prosperar e nada ganharam com a transformação vista no país após o colapso da Alemanha Oriental, há 30 anos.

Usina termoelétrica de carvão em Brandemburgo
Usinas termoelétricas, que devem ser fechadas até 2038, são os últimos grandes empregadores da região Foto: picture-alliance/Andreas Frank

O governo da Saxônia ostentava com a imagem de um estado reluzente – mas em muitos vilarejos, pouco reluzia. Quando os refugiados chegaram, e um país inteiro cuidou deles, muitos desses moradores não compreenderam. Ninguém estava interessado neles, mas eles moravam no país há muito mais tempo. Essas retóricas eram constantes em 2015 e 2016, no auge da crise migratória, mas ainda são proferidas atualmente: basta conversar com as pessoas na rua.

Voto de protesto e convicção

Em seu livro recém-publicado Wie Sachsen die Welt sehen (Como os saxões enxergam o mundo, em tradução livre), a ex-parlamentar do Partido Verde Anke Hermenau descreveu os habitantes do estado como pessoas que dão importância "ao bom andamento econômico". Em eleições anteriores, a AfD recebeu votos de protesto simplesmente porque as coisas não estavam "andando", afirma Hermenau, agora filiada aos Eleitores Livres (FW).

Pesquisas indicam que esses eleitores, que antes votavam em protesto, hoje se tornaram seguidores convictos da AfD e de seu programa eleitoral.

Na Saxônia, a AfD está bastante presente há anos – e ali manteve um tom mais moderado do que em outros estados. Além disso, muitos dos líderes do partido nasceram no Leste alemão. E isso é bem visto nos estados da antiga Alemanha Oriental, onde muitos se sentem cidadãos de segunda classe, porque há discrepâncias entre salários e aposentadorias com o restante da Alemanha. Cargos que detêm poder de decisão na administração e na política ainda são ocupados por alemães ocidentais.

A AfD adotou em sua campanha eleitoral – especialmente em Brandemburgo – a retórica do Leste alemão e apelou à sensação de desvantagem e discriminação em relação ao Oeste. "Cidadão de segunda classe" é um dos slogans. O lema foi, na verdade, introduzido anos atrás pelo partido A Esquerda, mas a AfD faz uso dele.

Explorando o Leste para conquistar o Oeste

A liderança federal da AfD aproveitou o resultado das eleições na Saxônia e em Brandemburgo para cunhar um novo rótulo próprio. Seu líder de quase 80 anos, Alexander Gauland, disse que agora considera a legenda – ao menos em Brandemburgo – como o "único partido burguês de oposição". Isso porque, naquele estado, a CDU somou meros 15% dos votos, e o Partido Liberal Democrático (FDP) não obteve nenhum assento no parlamento estadual.

Trata-se de uma retórica calculista: a AfD quer se afastar da imagem de um partido de populistas e extremistas de direita. Acredita-se que só assim a legenda receberá mais votos no Oeste da Alemanha, onde as pessoas não classificam a AfD de burguesa, mas de extremista. O Leste alemão, segundo diversos discursos da liderança partidária após as eleições de domingo, deve dar impulso para um aumento de eleitores no restante do país.

Partidários da AfD Tino Chrupalla, Alice Weidel e Sebastian Wippel num evento de campanha eleitoral na cidade alemã de Görlitz
Tino Chrupalla (esq.), ao lado de Alice Weidel e Sebastian Wippel, é considerado provável sucessor na chefia da AfDFoto: picture-alliance/Geisler-Fotopress/M. Wehnert

Mas a dinâmica desejada poderá ter um efeito agravante de conflito interno. A forte ala da AfD no Leste poderá alegar que tem direito a mais voz no partido. Há indícios de uma disputa entre Leste e Oeste dentro da legenda. Jörg Meuthen, copresidente no Oeste, afirmou que não deve haver grandes mudanças. Ou seja, sem novos representantes orientais no conselho.

Gauland, por sua vez, disse considerar essas alegações legítimas e, com isso, permitiu o livre desenrolar da disputa. Ele também indicou que não quer mais presidir o partido e que um sucessor adequado deve ser encontrado. Existe um candidato não oficial: Tino Chrupalla, de Lausitz. Mas ainda não há nada definido.

Temas que movem o eleitorado

Michael Kretschmer (CDU), governador da Saxônia, e Dietmar Woidke (SPD), governador de Brandemburgo – que devem seguir no cargo com o resultado das eleições de domingo – disseram na noite do pleito que é importante conversar com os cidadãos sobre seus problemas. Soou como uma admissão de culpa de que não haviam feito o suficiente.

Lobos e turbinas eólicas são dois desses problemas. Mesmo que os municípios tenham votado contra a instalação de turbinas eólicas muito perto dos vilarejos, a última palavra foi do governo de Brandemburgo. Como resultado, muitos moradores têm turbinas  erguidas praticamente em suas propriedades.

Outros muitos têm perdido o sono com lobos, especialmente os agricultores. Enquanto muitos políticos defenderam a proteção dos lobos, os moradores tiveram que melhorar a proteção de suas cabras e ovelhas – e mesmo assim, os animais seguem sendo mortos pelos lobos. Em alguns vilarejos existem "vigias de lobos" para proteger os rebanhos.

A AfD abordou os temas em muitos eventos durante a campanha eleitoral, ouviu os cidadãos e prometeu remediar a situação.

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