Relatório sobre práticas da CIA causa revolta entre árabes
12 de dezembro de 2014"Isso é uma vergonha. As práticas de tortura descritas no relatório da CIA tratam com desprezo os princípios da liberdade, dos direitos humanos e do respeito. Elas são contrárias a todos os princípios que os próprios Estados Unidos e seus aliados defendem. O EUA e o Ocidente perdem o direito de nos dar lições sobre democracia e direitos humanos." É com essas palavras que o portal árabe Rai al-Youm abriu o seu comentário sobre os métodos de interrogatório divulgados pela agência de inteligência americana.
Segundo o jornal, o relatório expõe fatos e isso é bem-vindo, escreveu o jornal. Mas não se deve supor que a publicação reforçará os princípios da justiça e da liberdade de informação. Afinal de contas, o documento só foi publicado 13 anos depois dos acontecimentos. Além disso, ninguém vai ser responsabilizado. Pessoas foram torturadas porque eram muçulmanas, prossegue o texto do Rai al-Youm.
Elas foram declaradas "terroristas" e, com isso, quem o fez se achou no direito de tratá-las de forma desumana, afirma o jornal. E isso foi feito em nome de um Estado que se considera o líder do mundo livre, continua. "E este Estado bombardeou com aviões países estrangeiros, os ocupou, alterou a sua ordem e matou em nome da liberdade e da democracia centenas de milhares de seus cidadãos. Assim aconteceu no Iraque, na Síria, na Líbia e no Iêmen."
O editor do Rai al-Youm, Abdel Bari Atwan, é conhecido por seus textos afiados e muitas vezes polêmicos. Mas as palavras dele expressam a raiva e a indignação que o relatório sobre as práticas de tortura cometidas pela CIA provocou no mundo árabe. Nas redes sociais, muitos árabes não estão guardando para si os seus comentários e opiniões.
Teorias conspiratórias
"Os Estados Unidos tentam se retratar como um bastião da liberdade de expressão, do Estado de Direito e da democracia", escreveu um leitor do jornal Al-Ilaf. Mas, na verdade, por trás dessa fachada se esconde uma ditadura autoritária, afirma. "Esta não acredita na humanidade, na moral, em princípios e valores. Esses são apenas slogans que ela joga para os americanos."
Teorias conspiratórias também se disseminam. Segundo um leitor do jornal Al-Haya, é óbvio que os EUA e Israel estão por trás do terrorismo islâmico da Al Qaeda: "Foram eles que colocaram Osama bin Laden e sua gangue em condições de causar tantos danos violentos, de matar milhões de crianças, mulheres e jovens, de expulsar outras inúmeras pessoas e provocar um enorme caos no mundo árabe."
Um telespectador do canal de televisão Al Jazeera vê a raiz de todo o mal na política interna dos Estados Unidos. Se a polícia mata afro-americanos em solo americano, então muçulmanos no exterior certamente não podem esperar Justiça. Mas o autor também aponta para as relações de poder no Oriente Médio: "O que Bashar al-Assad, Abdel Fath al-Sissi e Israel fazem com o nosso povo é a melhor prova de que é besteira acreditar em justiça quando se está sob o domínio do colonialismo e do capitalismo."
Um outro telespectador, porém, escreve que também é preciso olhar para as próprias ações. É verdade que os americanos agiram como bestas, afirma. "Mas, perto do que árabes ou muçulmanos fazem física e mentalmente uns com os outros, os selvagens ocidentais ou americanos são anjos."
Surpresa com o momento da divulgação
Era previsível que o relatório desencadearia consternação, raiva e indignação, escreveu o colunista Said Arikat, do portal Al-Arabi Al-Jadeed. Por isso ele se mostrou surpreso com o momento da divulgação: "Foi sábio e prudente publicar este relatório exatamente agora, num momento em que os EUA estão diretamente envolvidos num conflito no mundo árabe? Ou foi simplesmente uma escolha infeliz, que será usada para despertar sentimentos antiamericanos?"
Em todo caso, Arikat constatou que os métodos descritos no relatório mancham a imagem dos EUA. "O relatório vai lançar uma sombra sobre o engajamento americano por direitos humanos e liberdade, além de reduzir a sua influência no mundo." Na verdade, isso não se aplica apenas aos EUA, acrescentou Arikat. "Qualquer sociedade que considera a tortura uma prática legítima abre mão de uma grande parte de sua liberdade."