Resultado das eleições no Irã surpreende Europa
25 de junho de 2005Após a divulgação dos resultados das eleições no Irã, os jornais de língua alemã acentuaram principalmente um ponto: o receio de que o presidente eleito queira introduzir no país um radicalismo semelhante ao implementado no passado pela milícia talibã no Afeganistão. "Ninguém contava com esse resultado, nem no Irã, nem no exterior", assinala o diário Süddeutsche Zeitung.
Relações exteriores podem sofrer abalos
Não há como negar que algumas das declarações de Ahmadinejad deixam os governos europeus de cabelo em pé. Na mais célebre delas, citada por vários jornais alemães em seus comentários, o presidente eleito diz com todas as letras que "não fizemos esta revolução para implantar a democracia".
A previsão é de que, a partir da troca de poder, os intelectuais e tecnocratas reformistas que auxiliavam Khatami sejam deixados completamente de lado. O que deve refletir, sem dúvida alguma, nas relações exteriores do país. Ahmadinejad não prima por suas habilidades diplomáticas e nem parece nutrir muito interesse em cultivá-las.
Um dos pontos mais delicados dessa questão será certamente sua conduta em relação à política nuclear. O ministro alemão do Exterior, Joschka Fischer, reagiu com cautela aos resultados das eleições, tendo pedido a Teerã "garantias objetivas" de que o país vai usar seu programa nuclear apenas para fins pacíficos. "Também a cooperação econômica deverá depender de como o Irã vai conseguir ganhar a confiança internacional e continuar se abrindo", afirmou Fischer no jornal Bild am Sonntag.
"Ocidente chocado"
O ministro britânico das Relações Exteriores, Jack Straw, pediu que o Irã adote medidas urgentes, capazes de dissipar os temores da comunidade internacional frente ao programa atômico a ser adotado a partir de agora. Além disso, para Straw, o processo eleitoral no país foi "consideravelmente deficiente".
Analistas europeus não descartam a possibilidade de que as eleições possam ter sido manipuladas pelo poderoso Conselho dos Guardiães da Revolução. A previsão é de que, a partir da posse de Ahmadinejad, os ultraconservadores passem a controlar todas as instituições de poder. "O Ocidente está chocado", estampa o semanário alemão Die Zeit, ao comentar que "o problema da energia atômica é mais ameaçador que nunca".
Não a quaisquer símbolos ocidentais
Outro risco é o de que pequenas aberturas na sociedade iraniana – como uma determinação oficial menos rígida em relação à vestimenta das mulheres e uma proibição em menor grau de formas de vida tidas como ocidentais – possam desaparecer do cenário do país. Note-se que Ahmadinejad foi o único candidato que, durante a campanha eleitoral, não fez uso de quaisquer acessórios "ocidentais" e nem procurou dialogar diretamente com as novas gerações ou com as mulheres.
Estas, quando vistas a seu redor, sempre traziam o xador preto cobrindo o rosto. Os homens a barba longa típica dos islamistas e até as meninas já apareciam fazendo uso do lenço muçulmano. Ou seja, tudo leva a crer que na função de presidente Ahmadinejad venha a apertar os cintos da repressão. Como prefeito de Teerã, ele já havia, por exemplo, mandado recolher um poster publicitário das ruas da cidade, porque partes das pernas de um homem podiam ser vistas.
Era de isolamento?
Embora a mídia européia anuncie uma nova era de isolamento para o Irã, será provavelmente muito difícil, se não impossível, para o país, se encapsular de tal forma que processos globais possam ser ignorados. O país vai continuar exportando petróleo para a Europa e, acima de tudo, para a China. Em contrapartida, tanto europeus quanto chineses vão continuar insistindo que pretendem vender seus produtos e serviços no Irã. O que será extremamente difícil.
De uma forma ou de outra, o abismo cultural entre o Irã e países como os da União Européia vai provavelmente aumentar. Escritores e artistas iranianos que vivem na Alemanha não vêem muita luz no fim do túnel. "Há uma rede kafkiana de diretrizes de censura, que mudam a cada ano. Elas vão sendo modificadas para tornar o trabalho de um diretor de cinema, por exemplo, às vezes mais difícil, às vezes um pouco mais fácil. Pode-se afirmar que todos os cineastas do país conhecidos no Ocidente têm dificuldades com a censura", observa Amin Farzanehfar, autor de publicações sobre o cinema iraniano, radicado na Alemanha. A intelligentsia iraniana que vive no exílio europeu parece definitvamente não acreditar que a era Ahmadinejad possa trazer quaisquer melhorias para o país.