Rússia vai às urnas em eleição com resultado já definido
16 de março de 2024Os críticos repetem sem cessar que a Rússia é uma ditadura, mas mesmo assim o país está realizando uma eleição presidencial desde a sexta-feira até domingo (17/03). No entanto, o resultado já foi previsto muito antes: Vladmir Putin, que comanda o país há 25 anos, ganhará um quinto mandato. Dessa forma, ele ficará no Kremlin até pelo menos 2030.
A única figura claramente oposicionista, o político liberal Boris Nadezhdin, foi impedido de concorrer pelos tribunais russos, incluindo a Suprema Corte, após recurso.
Outros candidatos incluem Nikolai Kharitonov, 75 anos, que representa o Partido Comunista da Federação Russa (PCFR). O candidato dessa legenda geralmente fica atrás de Putin, embora em um segundo lugar distante. Kharitonov criticou algumas das políticas internas de Putin, mas apoia a invasão da Ucrânia pela Rússia.
Vladislav Davankov também está concorrendo. Aos 40 anos, ele é um dos candidatos mais jovens e se apresentou como mais liberal quando se trata da restrição das liberdades individuais na Rússia. Entretanto, ele também disse que não criticará seus oponentes políticos.
De acordo com a agência de notícias Reuters, Kharitonov e Davankov podem receber, cada um, entre 4% e 5% do total de votos.
Frente unificada
Mas, embora todos os observadores da Rússia digam que Putin deve vencer, a eleição presidencial russa de fato tem um propósito. "Seu objetivo é abordar os desafios internos e externos enfrentados pelo regime de Putin", disse Konstantin Kalachev, analista político e ex-conselheiro do Kremlin.
"Dentro do país, a eleição serve como meio de legitimação do poder do presidente e demonstra que o povo russo está unido em torno de seu líder", disse. "E, externamente, serve para mostrar que Putin está implementando a política [externa] com base nas demandas do povo", ressalta. "Isso demonstra que o presidente e a maioria russa estão unidos e dissipa quaisquer ilusões do Ocidente."
Em um país onde todos presumem que o resultado já está definido, pode ser difícil persuadir os eleitores saírem para votar. Mas, como escreveu no início deste mês o Meduza, site de notícias independente sediado na Letônia, as autoridades russas estão tomando medidas para garantir que as eleições presidenciais pareçam tão legítimas quanto possível.
A meta é um comparecimento de 80% dos eleitores. Segundo o Meduza, isso é feito "mobilizando o eleitorado dependente do governo: funcionários do setor público, funcionários de corporações estatais e grandes empresas leais ao governo, assim como seus parentes e amigos".
Os membros do partido do próprio Putin, o Rússia Unida, são incentivados a levar pelo menos dez pessoas com eles para as seções eleitorais, afirma o portal, citando fontes ligadas ao partido. As autoridades do governo e dos partidos podem ver exatamente quem comparece às urnas devido à votação eletrônica e aos códigos digitais que identificam os eleitores.
Em seu discurso sobre o estado da nação para a Assembleia Federal da Rússia no final de fevereiro, Putin também ofereceu aos russos comuns uma série de incentivos antes das eleições. Ele reiterou sua decisão de continuar o que chama de "operação militar especial" na Ucrânia.
Divisão visível
Embora o único candidato genuinamente anti-Putin, Nadezhdin, tenha sido impedido de participar, ainda pode haver alguma forma de voto de protesto. A maioria das forças de oposição russas fugiu do país, mas convocou seus partidários a agirem durante as eleições.
A viúva do líder da oposição russa Alexei Navalny, morto recentemente, convocou seus partidários a comparecerem em massa às cabines de votação ao meio-dia de domingo, 17 de março, em homenagem a seu marido.
"Você pode estragar a cédula, pode escrever nela 'Navalny' em letras bem grandes", disse Yulia Navalnaya em um vídeo no YouTube. "E mesmo que você não veja sentido em votar, você pode simplesmente ir e ficar na seção eleitoral e depois dar meia-volta e ir para casa", sugeriu ela, acrescentando que o povo deveria votar em "qualquer um, menos em Putin".
"O fato de grandes multidões comparecerem às cabines de votação de uma só vez não mudará o resultado final, mas certamente poderá perturbar a impressão de que os russos apoiam Putin de forma esmagadora", disse Nikolay Petrov, pesquisador visitante especialista em Leste Europeu do Instituto Alemão de Assuntos Internacionais e de Segurança (SWP). "É bem provável que isso irrite Putin", ressaltou.
"É um erro pensar que é mais fácil para os regimes autoritários realizar eleições do que para as democracias", argumenta Petrov. "É muito importante para Putin demonstrar à sua elite política que ele é apoiado pela grande maioria dos russos. É por isso que o Kremlin quer demonstrar resultados muito bons e também evitar quaisquer escândalos."