Atentado no Daguestão
31 de março de 2010Dois dias após os atentados no metrô de Moscou, um novo ato de terror matou pelo menos 12 pessoas no Cáucaso do Norte. O atentado desta quarta-feira (31/03) foi provocado por dois homens-bomba na cidade de Kizliar, na república russa do Daguestão. Segundo informações do Ministério russo do Interior, um deles estava usando uniforme de policial. A explosão deixou ainda pelo menos 27 feridos, oito dos quais em risco de vida.
O premiê russo, Vladimir Putin, manifestou de imediato a suspeita de que esse novo ato de terror tenha sido organizado pelos mesmos mentores dos atentados de Moscou. "Não excluo a possibilidade de isso ter sido obra dos mesmos bandidos", declarou Putin.
Sessenta homens-bomba a postos
Na segunda-feira, duas terroristas suicidas provocaram a morte de 39 pessoas no metrô de Moscou. O serviço secreto russo já havia responsabilizado rebeldes caucasianos pelo ato de terror na capital russa.
O Cáucaso do Norte tem sido palco de graves atentados por parte de extremistas islâmicos que lutam pela independência de um Estado muçulmano na região. Em 2009, confrontos entre as forças russas de segurança, quadrilhas de criminosos e rebeldes muçulmanos causaram a morte de mais de mil pessoas, muitas das quais entre a população civil.
A atual onda de atentados, inclusive os de Moscou, fora anunciada pelos terroristas ou separatistas norte-caucasianos. Há seis semanas, eles haviam advertido que tinham treinado 60 novos terroristas suicidas e que agora mobilizariam todos para cometer atentados contra instituições estatais russas.
Aliança com políticos corruptos
Os 23 mil soldados russos estacionados na região estão envolvidos numa "guerra assimétrica" com grupos terroristas esparsos, opina Alexander Rahr, especialista da Sociedade Alemã de Política Externa para assuntos russos.
Ainda há poucos meses, o presidente russo, Dimitri Medvedev, havia enviado tropas especiais para o Cáucaso do Norte. Mesmo assim, ao que tudo indica, os extremistas "estão se sentindo fortes o suficiente, a ponto de terem organizado um golpe contra a Rússia bem no centro de Moscou", disse Rahr em entrevista à Deutsche Welle.
Nas repúblicas do norte do Cáucaso, os extremistas "parecem dispor de novas estruturas de poder, como a possibilidade de comprar políticos" locais, informa Rahr. A corrupção também explica o sistemático desvio das verbas enviadas por Moscou para fortalecer economicamente a região. "A corrupção lá é a pior de toda a Federação Russa", diz o especialista.
Circunscrição administrativa nova
No início de 2010, o Kremlin resolveu juntar diversas repúblicas na circunscrição federativa do Cáucaso do Norte, que inclui Daguestão, Inguchétia, Cabárdia-Balcária, Carachai-Circássia, Ossétia do Norte e Tchetchênia, bem como a região russa de Stavropol. O centro administrativo da nova circunscrição é a cidade de Pyatigorsk. O presidente Medvedev nomeou Alexander Jloponin seu representante no Cáucaso do Norte e ao mesmo tempo vice-chefe de governo.
O novo administrador do Cáucaso deveria estabilizar a região e promover o desenvolvimento econômico local. No entanto, talvez falte a Chloponin a necessária carta branca para implementar essas metas, analisa Serguei Markedonov, especialista russo em relações internacionais.
Considerando que o novo administrador está submetido tanto ao presidente Medvedev como ao premiê Putin, ou seja, a superiores com dois aparatos políticos concorrentes, dificilmente vai conquistar a liberdade de ação necessária para sua tarefa, avalia.
Na opinião de Markedonov, Moscou está tratando o problema de forma errada: "Nenhum investidor virá a uma região onde as pessoas são sequestradas, onde ambas as partes praticam violência e onde a corrupção atingiu dimensões enormes".
Mais grave do que na Tchetchênia
A Tchetchênia, uma das repúblicas do Cáucaso do Norte, ainda não se estabilizou politicamente após as duas guerras que eclodiram no início e no fim da década de 1990. No entanto, nas outras repúblicas, a situação ainda é pior, informa Markedonov.
As autoridades russas reagiram com operações antiterror aos atentados na Inguchétia, mas suas medidas contra os rebeldes praticamente não surtiram efeito. Já na Ossétia do Sul, onde pretensamente reina a paz, a situação é pouco conhecida, diz o especialista.
Na última década, os movimentos de protesto no Cáucaso passaram por uma transformação. "Nos anos 1990 dominavam as reivindicações de ordem étnica; os movimentos que surgem hoje adotam palavras de ordem do extremismo islâmico", analisa Markedonov.
Pouca chance de paz
Os conflitos na região poderão durar muito tempo, prevê o politólogo russo Viktor Misin. "Só quando a atitude da Rússia mudar, veremos qual ordem será possível no Cáucaso." Ele supõe que leve certo tempo para cumprir sua missão e depois venha a obter um cargo de alto escalão no Kremlin. Então é possível que Moscou volte a dissolver a nova circunscrição federativa do Cáucaso do Norte, aventa o especialista.
Já a ativista russa de direitos humanos Svetlana Gannuchkina não reconhece muitas chances de paz na região. "A Rússia não dispõe de uma política para o norte do Cáucaso, a não ser certas medidas nervosas e abruptas com a meta de salvar o império a qualquer custo", lamenta.
Para Alexander Rahr, a única solução para o norte do Cáucaso seria um pacto de estabilidade que garantisse à região verbas a serem distribuídas com justiça e destinadas à reconstrução da infraestrutura e da ordem civil "nessa região abandonada por Deus".
Autores: Iegor Vinogradov / Kerstin Dausend / Simone Lopes
Revisão: Roselaine Wandscheer