Elogios a Tarantino
29 de julho de 2009Cerca de 2 mil convidados puderam acompanhar na noite desta terça-feira (28/07) em Berlim a estreia na Alemanha de Bastardos Inglórios, novo filme de Quentin Tarantino.
Além do próprio diretor, estiveram presentes o ator Brad Pitt e todo o elenco de língua alemã do filme, que inclui entre outros Christoph Waltz, Til Schweiger, Daniel Brühl e Diane Krüger.
A película conta a história de um grupo de soldados judeus norte-americanos que se incumbe de matar nazistas na França ocupada. Eles são conhecidos como The Basterds (os bastardos).
Waltz faz o papel de um coronel nazista. Por sua interpretação recebeu a Palma de Ouro no Festival de Cannes. Durante a cerimônia de estreia, ele conversou com a Deutsche Welle sobre o seu personagem e o trabalho com Tarantino.
Deutsche Welle: Você recebeu a Palma de Ouro em Cannes pela sua interpretação do coronel Hans Landa. A distinção abriu novas chances para você?
Christoph Waltz: Não de uma hora para a outra, mas elas começam a aparecer. Há opções. Vamos ver no que elas vão dar.
Como você foi incluído no elenco do filme?
Da forma tradicional. Eu quase diria convencional, mas o que se entende por convencional mudou muito nos últimos anos. Hoje é geralmente um grupo de faroleiros sem noção de nada, tentando testar os outros em coisas que nem eles mesmos sabem. E isso com a mais moderna tecnologia, para registrar tudo para alguma pessoa ausente que vai acabar tomando a decisão.
No caso do Tarantino foi completamente diferente. Um senhor extremamente atencioso me convidou para uma entrevista. E só depois de a gente ter se conhecido um pouco é que veio a pergunta: será que daria para ler um trecho do roteiro? Isso deu uma sensação de leveza, de segurança. Ele descontraiu a situação em vez de fazer pressão. Não havia nem mesmo uma câmera – afinal, para quem Tarantino ainda precisaria exibir o teste?
Como se cria diante da câmera um Landa como esse, um monstro charmoso?
Quem lê o roteiro sabe mais. Eu gosto de me manter fiel ao que o autor diz. Além do mais, diante de um Tarantino, de uma tal obra, percebe-se que o roteiro não trata da gente em si, mas sim de uma personagem imaginada por Tarantino.
Você é um ator de língua alemã que faz o papel de um nazista num filme de Hollywood. Como você abordou seu personagem? Você deixou de lado esse complexo que os alemães carregam consigo?
Muito pelo contrário, me entreguei completamente a ele. Tenho uma outra leitura disso: não vejo como tarefa do cinema ser didático, especialmente no que concerne à história. E ainda mais no que concerne a essa parte da história.
Acho que o cinema deve tratar de nós mesmos, que vivemos hoje e vamos assistir ao filme. Em consequência, considero irresponsável fazer filmes que deem a impressão de apresentar a verdade.
O que você procura no seu personagem, então?
Esse é o tema desse filme: o que temos para lucrar, o que há para se alcançar? Certamente não a confirmação do que já sabemos de uma forma ou de outra. Isso nós já interiorizamos em toda sua abrangência moral.
Para que ainda precisamos mostrá-lo? Como ação de marketing. Não me ocorre nada além disso. Convencer a nós mesmos de que estamos do lado certo vira uma estratégia de marketing. Afinal, quão falso é possível ser?
Procuro no personagem tudo o que realmente desperta questionamento. Um filme não me permite participar de um acontecimento histórico, mas através do meu papel posso participar da arte. E tiro meu chapéu para Tarantino como artista. O filme nos permite obter uma nova perspectiva do mundo. E uma nova perspectiva pode modificar nossa realidade.
E como o filme pode mudar a realidade?
Não a realidade, mas a maneira como a vemos. A realidade você mesmo terá que mudar.
Depois do filme houve elogios mútuos entre você e Tarantino. Entre outras coisas, ele disse que você lhe devolveu o filme. O quanto ele é responsável por você ter aportado tão fortemente seu talento como ator ao filme?
99,99 porcento.
AS/dw
Revisão: Simone Lopes