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Venezuela pós-Chávez é mais dependente dos EUA

6 de março de 2013

Mesmo com retórica de confrontação política, presidente venezuelano sustentou relação econômica sólida com Washington. Apesar do petróleo, fica como legado uma balança comercial bem mais favorável aos norte-americanos.

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Foto: Reuters

Se, para Hugo Chávez, George W. Bush era o diabo que deixava a ONU cheirando a enxofre, em Washington o venezuelano não era sequer digno de menção. O atual presidente norte-americano, Barack Obama, jamais se referiu a Chávez publicamente pelo nome, e seu antecessor raras vezes o fez. Os Estados Unidos são muito mais importantes para a Venezuela do que o contrário, e o caudilho sempre soube disso. Por isso, manteve a economia à parte e restringiu sua guerra anti-imperialista ao campo das palavras e ameaças.

O país deixado por Chávez é muito mais dependente daquele "império fascista e genocida" do que ele deixava transparecer. O comércio total entre EUA e Venezuela chegou a quase 20 bilhões de dólares em 2012, e a balança pesa cada vez mais para o lado norte-americano.

"Não se pode levar a sério esses ataques teatrais de Chávez. Eram uma manobra simbólica para a Venezuela ter um inimigo", diz Bettina Schorr, especialista em relações EUA-América Latina da Universidade Livre de Berlim. "A relação econômica entre EUA e Venezuela sempre foi muito próxima e, com Hugo Chávez, tornou-se ainda mais intensa."

Compras básicas batem recorde

Quando, em agosto de 2012, a maior refinaria da Venezuela explodiu, foi aos inimigos que Chávez teve que recorrer, porém sem alardear. A oposição atribuiu o acidente ao descaso do chavismo – mais preocupado em usar os petrodólares para financiar programas sociais do que para manter as instalações estatais.

Segundo números da própria Câmara de Comércio e Indústria dos dois países, em 2012 a Venezuela comprou dos EUA quase 16 bilhões de dólares em produtos relacionados a petróleo, um salto superior a 40% na comparação com o ano anterior. No mesmo período, as exportações venezuelanas de produtos do mesmo tipo caíram mais de 11%, de cerca de 40 bilhões de dólares para 34 bilhões de dólares.

Venezuela Raffinerie Amuay Explosion
Explosão na maior refinaria venezuelana, em agosto de 2012, aprofundou dependência dos EUAFoto: dapd

O petróleo cru venezuelano que entrou nos EUA em 2012 representou 50% das exportações da Venezuela, mas apenas 5% das importações norte-americanas. Fora do setor petroleiro, a dependência também fica clara: as compras de produtos básicos e industriais da Venezuela no mercado dos EUA cresceram 20% frente a 2011, alcançando a cifra recorde de 14 bilhões de dólares.

"Os EUA exportam muito para a Venezuela. Supermercados estão lotados de produtos norte-americanos", diz Thiago Gehre Galvão, pesquisador do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UNB). "Existe uma separação muito clara desse mundo da retórica política e do relacionamento econômico."

Chance de novo capítulo

Durante seus mais de 14 anos no poder, Chávez usou os enormes lucros do petróleo para compensar os prejuízos causados por uma economia ineficiente e intervencionista. Em 2012, ano de eleição, os gastos do governo subiram 40%. A produção manufatureira e de comida caiu, forçando o governo a comprar, na última década, mais de 52 bilhões de dólares em alimentos do exterior.

Estima-se que o chavismo tenha expropriado 33 bilhões de dólares em instalações estrangeiras no país, valor que, em grande parte, ainda precisa ser compensado. A inflação é galopante – teve média anual de 21% durante o regime – e deve forçar o futuro governo a mexer na moeda.

Chavez droht USA wegen Streit mit Exxon Mobil mit Ölembargo
Chávez visita parque industrial em 2008Foto: Picture-Alliance /dpa

Com tantos problemas, era nos EUA que Chávez mirava quando tentava desviar a atenção. O autointitulado líder bolivariano tinha Fidel Castro como mentor e modelo. Dele, herdou a teatralidade, a retórica imperialista e a hostilidade natural contra os norte-americanos. Washington, por outro lado, sempre tratou o chavismo de forma diferente do castrismo: com habilidade e indiferença, para irritação do venezuelano.

Essa relação pode agora mudar e abrir um novo capítulo na história bilateral, como declarou nesta terça-feira (05/03) o próprio Obama, novamente sem citar diretamente o nome de Chávez. A morte do presidente venezuelano marca uma chance de aproximação política para países que economicamente jamais se afastaram.

Autor: Rafael Plaisant Roldão / Fernando Caulyt
Revisão: Augusto Valente