Violino de Buchenwald soa pela primeira vez desde Holocausto
8 de setembro de 2017No período em que ficou no campo de concentração de Buchenwald como prisioneiro político, durante a Segunda Guerra Mundial, o escritor Bruno Apitz (1900-1979) tocava o instrumento que depois ficou conhecido como o "violino de Buchenwald".
Na noite desta quinta-feira (07/09), o violino, que especialistas estimam ter ao menos 150 anos, soou pela primeira vez desde o Holocausto. Matthias Wollong, primeiro violonista da orquestra Staatskapelle Dresden, apresentou o instrumento na igreja Peterskirche de Erfurt.
"É uma experiência nova e emocionante dar vida à história por meio do som e, acima de tudo, contar essa história dessa forma. Não há muito conhecimento sobre música nos campos de concentração", frisou Wollong antes do concerto, que ele disse esperar que contribuísse para divulgar essa "história esquecida".
Os violinos do Holocausto
O concerto, no qual músicas escritas em campos de concentração foram executadas pelo violino de Apitz, faz parte do Festival Achava, que destaca o diálogo inter-religioso e intercultural entre Israel e Alemanha.
Os organizadores do festival disseram que a inspiração para o concerto não veio de Apitz, mas da coleção do violinista lituano e judeu Moshe Weinstein, que fugiu para Israel em 1939. Ele se tornou um fabricante de violinos e colecionou instrumentos de sobreviventes do Holocausto, embora ninguém quisesse tocá-los após a guerra por eles terem sido produzidos na Alemanha.
O filho de Weinstein herdou a coleção do pai na década de 1980. Um dia, contam os organizadores do festival, um homem entrou na loja dele com um violino que havia tocado em Auschwitz. Ele queria consertá-lo antes de dá-lo para seu neto. O interesse naquele período da história parecia ter renascido.
Daniel Schmidt, fabricante de arcos baseado em Dresden, se familiarizou com a coleção de Weinstein durante uma estadia em sua oficina em Tel Aviv no início dos anos 1990. Foi Schmidt quem fez os últimos retoques no violino de Buchenwald para que ele pudesse ser usado em um concerto.
Embora Apitz não fosse judeu, os organizadores do Festival Achava quiseram enfatizar seu compromisso com a defesa da liberdade diante da opressão durante o Terceiro Reich.
"Bruno Apitz era multifacetado e controverso. Enquanto comunista, ele era um prisioneiro político, mas os prisioneiros políticos eram frequentemente tratados como parceiros confiáveis pela SS [tropa de elite do regime nazista]", disse Wollong. "E, assim, ele sobreviveu ao campo de concentração."
Wollong, que cresceu na antiga Alemanha Oriental, comunista, frisou que "o nome de Apitz se tornou sinônimo de seu livro autobiográfico intitulado Nu entre lobos [Nackt unter Wölfen, no original], e a publicação era leitura obrigatória na minha escola". Ele acrescentou que o foco do concerto desta quinta-feira seria menos Apitz e mais o tema música no campo de concentração.
Música como tortura e refúgio
Enquanto Apitz conseguiu colegar a maior parte das cenas angustiantes que testemunhou no campo de concentração de Buchenwald para o papel, outras narrativas foram, em grande parte, esquecidas. Inclui-se aí as tradições musicais que floresceram secretamente em todos os campos de concentração da Alemanha nazista.
Helmke Jan Keden, musicólogo da Universidade de Wuppertal, afirma que, embora tenha havido muitas pesquisas acadêmicas sobre o assunto, o público em geral desconhece como o papel importante desempenhado pela música nos campos de concentração.
"Nossa sociedade associa música a muitas coisas incrivelmente positivas. É extremamente difícil para muitas pessoas sequer começar a associar música a campos de concentração", afirmou Keden à DW.
Por um lado, a música ajudou os encarcerados nos campos a lidar com as provações enfrentadas, ao mesmo tempo que tentava criar uma aparência de normalidade no local, aponta Keden.
"Por outro lado, a música também foi usada deliberadamente como uma forma de tortura, por exemplo, sempre que os prisioneiros eram forçados a tocar para soldados alemães", diz o especialista.
História única
Uma vez, Apitz escreveu que os prisioneiros do campo de concentração eram tratados como "escravos de luxo" quando lhes pediam que tocassem para soldados nazistas, sugerindo a relação conflituosa que ele tinha com o próprio violino.
Acredita-se que Apitz nunca mais tenha pegado no instrumento depois do Holocausto. Sua viúva doou o violino à Fundação Memorial de Buchenwald após a morte do marido, em 1979.
No memorial, ele permaneceu quase esquecido durante dos anos. Ele estava em bom estado quando foi redescoberto e finalmente chegou à oficina de Schmidt.
"O violino estava em boas condições, pronto para ser tocado. É por isso que não havia necessidade de fazer um grande trabalho de restauração", diz Wollong. "Ele precisava de um novo cavalete e de cordas, mas esse tipo de coisa é bastante normal para um instrumento como esse."
Para Wollong, é normal que um violinista toque instrumentos antigos e históricos. "Mas o excitante sobre este violino é a sua história única. Como músico, você pensa que é algo que pode sentir e quer que seja algo que você possa até ouvir – mesmo que isso possa ser mais um mito do que um fato", acrescentou.
Keden também comemora o fato de o antigo violino ganhar vida novamente num concerto. "Acho ótimo que haja esse tipo de evento, que destaca o incrível potencial da música."