A Suécia e a luta de libertação da Guiné-Bissau
18 de fevereiro de 2016Filipa César trouxe ao Festival Internacional de Cinema de Berlim um filme sobre o envolvimento da Suécia na Guerra de Libertação da Guiné-Bissau (1963-1974).
A portuguesa radicada na capital alemã realizou "Transmission From the Liberated Zones" ("Transmissão das Zonas Libertadas", em português), um documentário com 30 minutos de duração, apresentado esta quarta-feira (17.02) na mostra Forum Expanded, dedicada a filmes experimentais.
Apesar de o filme referir-se ao início dos anos 70, a diretora quis lançar uma reflexão sobre a forma como aquele momento histórico pode influenciar o presente e o futuro do país: "A ideia deste projeto não foi tanto pensar no passado, mas trespassar um gesto de libertação até ao presente".
"A ideia foi criar um túnel onde podemos passar entre o passado e o presente, movimentar-nos, e perceber que as coisas estão ligadas. 'Transmission' é neste sentido", explica Filipa César.
O papel da Suécia
O filme traz entrevistas com quatro protagonistas suecos e resgata documentos, fotografias e vídeos da época.
A Suécia teve um papel único nas guerras de libertação nos anos 70, em especial na Guiné-Bissau. No início de 1968, o Partido Social-Democrata, no poder na Suécia, por meio do seu Fundo Internacional de Solidariedade, fez as primeiras doações em dinheiro para ajuda não militar às zonas libertadas do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC).
Amizade entre Amílcar Cabral e Olof Palme
Já no final de 1968, o então secretário-geral do PAIGC, Amílcar Cabral, faria a primeira de muitas visitas ao país europeu, abrindo caminho para consolidar a cooperação entre seu movimento de libertação e o Governo sueco. Amílcar Cabral até tornou-se um amigo pessoal do então primeiro-ministro sueco Olof Palme, um dos políticos mais influentes da social-democracia europeia.
"A Suécia não só se envolveu no movimento de libertação da Guiné-Bissau, mas também na África do Sul, em Moçambique e em Angola. Portanto, foi um país muito solidário que tentou ter uma política de não apoiar com armamento, mas apoiar com outros meios - com educação e com saúde," destaca a realizadora Filipa César.
No documentário, o diplomata Folke Löfgren, que foi membro da missão de descolonização das Nações Unidas, a política social-democrata Birgitta Dahl, o cineasta Lennart Malmer, e a realizadora e psicóloga Ingela Romare compartilham suas experiências nas zonas libertadas da Guiné-Bissau, para onde viajaram no início dos anos 70 - foram escolhidos por seu papel na legitimação da guerrilha do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC).
"Eles também criaram um imaginário das zonas libertadas, que foi pôr em causa o imaginário internacional que existia sobre aquela zona. Todos eles trouxeram documentos, imagens, criaram essa imagem do que é uma zona libertada, que deixa de ser algo abstrato e utópico, para ser algo material, com provas, com descrições," considera Filipa César.
Passado e futuro
O fio condutor entre todo o material apresentado no documentário é feito por um jovem, órfão, filho de pai africano, que permeia as entrevistas falando de sua realidade atual e que Filipa César quis empoderar.
"[Ele] é uma espécie de produto de toda esta história portuguesa e africana. Ele é a voz que fala sobre o envolvimento sueco nesta história e consegue ser um paralelo entre a sua própria condição e estas pesquisas que ele apresenta," revela.
"Transmission From the Liberated Zones" tem sua última apresentação na mostra Forum Expanded, da Berlinale, no próximo sábado (20.02). A 66ª edição do Festival Internacional de Cinema decorre até domingo (21.02).