Angola: Pobreza extrema fomenta tráfico infantil
6 de outubro de 2022A polícia angolana resgatou, no sábado (02.10), onze crianças vítimas de tráfico humano no município de Camacupa, província do Bié.
Os menores, entre os 12 e os 15 anos de idade, foram resgatados no outro lado do país, a mais de 700 quilómetros de distância, no Bengo. Segundo Gaspar Luís, porta-voz da delegação do Interior na província, as crianças ficarão, para já, ao cuidado do Estado, porque se suspeita que tenham sido traficados com o consentimento dos pais.
"Nesta altura, as crianças estão sob controlo do Gabinete Provincial da Ação Social [do Bengo], e os autos já foram remetidos ao digno representante do Ministério Público, que está a tratar dos procedimentos legais", disse Luís, acrescentando: "Não vemos a necessidade destes menores terem sido retirados do convívio familiar para serem submetidos a trabalho forçado numa fazenda e deixarem de estudar".
Violação dos direitos da criança
O tráfico de crianças para trabalhos forçados é frequente em Angola. O Instituto Nacional da Criança diz ter registado, "nos últimos anos", mais de 50 casos na província do Bengo.
Face à pobreza extrema, as famílias forçam os menores a trabalhar, para tentarem ter melhores condições de vida. Para os traficantes e os seus clientes, as crianças são uma fonte de mão-de-obra barata.
O académico angolano Amílcar de Armando entende que são as dificuldades porque passam as famílias que levam a situações dramáticas para as crianças: "O mau momento económico que as pessoas vivem no dia a dia impele-as a cometerem certos atos. Mesmo que seja reprovável, aderem, porque sabem que conseguem satisfazer algumas necessidades básicas".
Menores acreditam ter que ajudar a família
A situação piorou com a crise económica e social provocada pela pandemia da Covid-19.
De acordo com um relatório do Departamento de Estado norte-americano divulgado no ano passado, criminosos recolheram mais crianças pobres para trabalharem nas ruas a lavar carros ou a engraxar sapatos. Os menores são também traficados para trabalhos forçados nos setores da construção, agricultura, pescas ou prostituição.
O problema, segundo o Instituto Nacional da Criança, é que muitos menores se sentem na obrigação de ajudar as suas famílias.
Penas até dez anos de prisão
"Uns dizem que vão juntar um dinheiro para, quando regressarem, comprar um boi e dar mais dinâmica aos nossos campos, para dar sustento à família e para sustentar outras ações sociais, no caso concreto, os estudos", disse à DW o responsável do Instituto Nacional da Criança no Bengo, Luciano Chila, ressalvando, contudo: "Agora, muitas crianças são influenciadas pelos adultos".
Mesmo com o alegado consentimento dos menores, trata-se de tráfico humano, afirma o jurista Eulândio Dembi. É, portanto, um crime punido com pena de prisão.
"O crime de tráfico de pessoas tem uma penalidade muito grande, vai de quatro a dez anos de prisão, caso, efetivamente, essa situação se venha a comprovar. É claro que estamos a falar dos pais e dos que receberam os menores, que poderão ser responsabilizados", disse Dembi.