"As eleições não resolvem o problema da Guiné-Bissau"
1 de março de 2024Na esteira do debate sobre a data das eleições legislativas antecipadas na Guiné-Bissau, o líder do Partido da Unidade Nacional (PUN) diz em entrevista à DW África que "não faz sentido" realizar a votação neste momento porque a prioridade atual é a campanha da castanha de caju no país.
Idrissa Djaló não descarta a realização de legislativas depois da época das chuvas, mas salienta que "as eleições não são a solução para o problema da Guiné-Bissau".
Na semana passada, o Presidente da República, Umaro Sissoco Embaló, disse que a ida às urnas seria ainda antes da época das chuvas, que começa em junho. Os críticos consideram, no entanto, que a intenção do chefe de Estado é consolidar a "inconstitucionalidade" iniciada com a dissolução do Parlamento, em dezembro passado.
Para o líder do PUN, a solução para as sucessivas crises políticas no país passa por realizar um diálogo nacional, envolvendo diversos atores políticos e da sociedade civil. Entretanto, Idrissa Djaló sugere eleições presidenciais em 2025.
DW África: A Guiné-Bissau deve realizar eleições neste momento?
Idrissa Djaló (ID): Não, não achamos que este seja o momento oportuno. O país vive da campanha de caju, que está em curso. A campanha inicia em março e vai levar meses. É esta campanha que dá de comer aos guineenses - é uma transferência direta de mais de 200 milhões de euros para os produtores. Então, no nosso entender, primeiro que tudo é importante salvar esta campanha, tomando um conjunto de medidas económicas sem [ser interrompido pela] campanha eleitoral.
No faz sentido falar de campanha eleitoral para as legislativas antes, no mínimo, do final das chuvas e assim que terminar a campanha de caju.
DW África: Nesse sentido, quais são os próximos passos do partido para pressionar contra a realização das legislativas em breve?
ID: Estamos a reunir, em todo o país, forças políticas e da sociedade civil que partilham da nossa visão para organizar uma "terceira via", para que o país não fique "refém" desses grupos que sequestram a Guiné-Bissau há cinquenta anos. Foi a sua violência, incompetência e desrespeito pelo Estado de Direito democrático que colocou a Guiné-Bissau no último patamar de África.
DW África: O que pretendem fazer para pressionar contra as legislativas antecipadas?
ID: Não, não vamos fazer nada. No entender do Partido da Unidade Nacional, as eleições não são uma solução para o problema da Guiné-Bissau.
DW África: Qual seria a solução?
ID: Nós convidamos a sociedade guineense a organizar grandes consultas nacionais para discutir porque é que o sistema político da Guiné-Bissau não funciona. As primeiras eleições legislativas livres, transparentes e presidenciais tiveram lugar em 1994 e terminaram num golpe de Estado que continuou com uma guerra quase civil. As eleições de 2019 terminaram com um golpe de Estado dois anos depois. Desde então sucedem-se golpes de Estado militares e palacianos. Nunca fazemos funcionar o sistema democrático. Além disso, há uma corrupção desenfreada em todos os partidos que governaram o país. A violência está no coração do sistema político guineense desde a independência, há 50 anos.
Nada funciona, incluindo as instituições do Estado, da administração pública, na Justiça e nas Forças de Defesa e Segurança. E a Assembleia, que tem o papel de fiscalizar o funcionamento do Governo, passou a ser cúmplice daqueles que roubam. Ouvimos falar recentemente de seis milhões roubados, e a única justificação vinda do Parlamento foi dizer que esta é uma prática reiterada.
As eleições não dão resultado, já gastámos muitos recursos que não temos para um resultado nulo. Temos de reconhecer que há um problema e temos de debater esse problema. Não podemos fazer 10 eleições que não surtam efeito e dizer que a 11ª solução são mais eleições.
DW África: O partido acredita que as eleições presidenciais devem ter lugar em 2024?
ID: Para não perdermos tempo e entrarmos em grelhas inúteis, é bom que o Tribunal Supremo Tribunal seja interpelado para dar a data correta.
DW África: E qual seria a data correta, na opinião do Partido da Unidade Nacional?
ID: Eu acho que deve ser no próximo ano, em 2025, mas não tenho autoridade para determinar essa data. É o Supremo Tribunal de Justiça que tem esse papel. Não [devemos] entrar em polémicas que não abonam em nada.