Cabo Delgado: Morte de agentes eleitorais "assusta"
12 de março de 2024Regina Matsinhe, porta-voz nacional do Secretariado Técnico da Administração Eleitoral (STAE), confirmou à imprensa a morte de três agentes de educação cívica eleitoral, perpetrada por "namparamas", paramilitares moçambicanos, na tarde do passado dia 8 de março, no interior do distrito de Chiùre, província de Cabo Delgado.
Os três agentes teriam sido confundidos com terroristas, segundo os relatos da população e das autoridades.
A porta-voz nacional do STAE garantiu estarem em curso esforços para apurar as circunstâncias do incidente. Soube-se, entretanto, que os agentes de educação cívica estavam devidamente credenciados e levavam consigo algum material de trabalho do STAE, como megafones e colete de identificação.
Como é que isto foi possível? Em entrevista à DW África, o analista político Dércio Alfazema diz que o episódio "preocupa, porque era suposto ter havido alguma comunicação para as diferentes unidades militares e paramilitares na região de que este grupo se estava a movimentar pela província".
Agora, será preciso tirar lições para o futuro, comenta o diretor de programas do Instituto para a Democracia Multipartidária (IMD) a sete meses das eleições gerais em Moçambique.
DW África: Este episódio é um mau augúrio para as eleições legislativas, presidenciais e sobretudo provinciais que se aproximam em Moçambique?
Dércio Alfazema (DA): É, de facto, um incidente preocupante e assustador, uma vez que estamos a falar de agentes eleitorais que estavam no exercício de uma atividade de interesse público. Isto preocupa, porque era suposto ter havido alguma comunicação para as diferentes unidades militares e paramilitares que estão na região de que este grupo se estava a movimentar pela província a realizar esta atividade.
Agora, vamos ter maior movimentação de pessoas a partir desta fase de educação cívica e recenseamento; com a campanha eleitoral será ainda maior. Portanto, este incidente, que não é o primeiro, deve servir de base para uma reflexão sobre como deve decorrer a comunicação entre as diferentes unidades que estão envolvidas no combate ao terrorismo e outros atores que precisam de estar lá a realizar também as suas atividades.
DW África: Disse, por outras palavras, que é preciso melhorar a comunicação. Isso quer dizer que parte da culpa poderá ter sido das instituições que preparam as eleições em Moçambique?
DA: Não sei, talvez seja algo que não estivesse previsto e não foi devidamente acautelado, porque não sabemos também se os órgãos de gestão eleitoral têm conhecimento de que existem essas forças locais, que usam meios mais tradicionais e que também estão envolvidas diretamente na prevenção do terrorismo.
Não sei qual é o mecanismo de articulação da comunicação, quem devia comunicar aos namparamas ou ao comandante dos namparamas. De qualquer das formas, o que fica claro é que há a necessidade de tirar lições e aprimorar os mecanismos de articulação para que isto não volte a acontecer.
DW África: Fala dos namparamas. Que grupo é este?
DA: É um grupo que já existe há bastante tempo, que está enraizado na província de Cabo Delgado. A base deste grupo não é necessariamente um treinamento militar numa perspetiva mais formal, mas uma preparação com base em meios tradicionais, recorrendo à superstição com tratamentos que impedem que metais perfurem os seus corpos, por exemplo. Sempre se falou dos namparamas, e agora começam a ser um rosto visível nesta luta contra o terrorismo.
DW África: E de uma forma geral, existe o perigo de não haver, em outubro, condições de segurança para se realizarem as eleições em Cabo Delgado?
DA: Existe esse risco. Apesar de, neste momento, não ser real, é preciso que as nossas Forças de Defesa e Segurança reforcem as suas capacidades para garantir maior segurança dos atores políticos eleitorais, sobretudo na época de pico, durante a campanha eleitoral e o dia da votação.