Como a queda do preço das matérias-primas afeta Moçambique
5 de fevereiro de 2016Em 2015, o metical, moeda nacional de Moçambique, desvalorizou 50% e a dívida pública aumentou substancialmente. Os investimentos externos recuaram, e as previsões de crescimento são hoje mais modestas do que há alguns anos. A analista britânica Charlotte King, do instituto de pesquisa Economic Intelligence Unit, em Londres, admite que o futuro imediato de Moçambique se apresenta como "desafiador".
"As pressões surgiram no final de 2015, porque os governantes contavam com um aumento muito mais rápido da exportação de carvão. O preço muito baixo do carvão agravou o défice estrutural e a elevada dependência das importações. Mas a dependência de Moçambique do carvão ainda só está no estágio inical", explica King.
A analista salienta que o problema não é, portanto, uma implosão do boom do carvão, mas o facto de o esperado boom não ter chegado a acontecer. Por isso, esta será uma boa altura para implementar medidas de diversificação da economia.
Apostar no desenvolvimento
Comparativemente aos países vizinhos, Moçambique apresenta um atraso de muito anos no desenvolvimento da indústria, infraestruturas, regulamentos, leis laborais e setor financeiro.
King acredita que é precipitado apostar no gás natural como solução para todos os males, pelo menos não a curto ou a médio prazo.
"Vai levar muito mais tempo a desenvolver a exploração do que o Governo pensa. Não vai começar a haver exportação em 2020. Ainda não há sequer contratos com fornecedores, nem planos de desenvolvimento das infraestruturas, muito menos financiamento previsto", afirma.
Ainda assim, a economista recusa o pessimismo. Na sua opinião, não se prevendo uma situação em que Moçambique não seja capaz de amortizar a dívida do Estado, o país deverá escapar a uma crise macroeconómica severa. Para Charlotte King, é mais grave a falta de progresso no combate à pobreza, apesar de duas décadas de forte crescimento. "Esta é, precisamente, uma consequência de permitir que o crescimento dependa fortemente de matérias-primas, seja carvão ou alumínio, negligenciando a criação de emprego, por exemplo, na produção", esclarece.
Crise política também afeta a economia
Apesar de achar que a responsabilidade da atual crise em Moçambique não recai apenas sobre o Presidente Filipe Nyusi, a analista considera que o responsável pelo Governo reagiu com demasiada lentidão aos desafios - apesar de algumas medidas de austeridade aplicadas recentemente já terem produzido resultados positivos, como a contração do défice fiscal.
"Uma parte da dificuldade em implantar estas medidas é a elevada resistência de políticos e setor privado, habituados a um Estado despesista", afirma.
Apesar de tudo, a pressão dos doadores, de quem depende o Orçamento do Estado de Maputo, não deverá abrandar, antes pelo contrário. Por isso, mais reformas estão para vir num futuro próximo, acredita a especialista. Mas o desenvolvimento económico também dependerá da capacidade do país em superar a sua presente crise política, para o que serão decisivos os próximos meses.