Direitos de deficientes na RDC
31 de agosto de 2016Há governos africanos que só se lembram dos deficientes físicos no seu país nos Jogos Paralímpicos, como aqueles que começam no 7 de setembro no Rio de Janeiro. É o caso da República Democrática do Congo (RDC), onde muitas pessoas vivem com sequelas físicas graves provocadas pelo vírus da poliomielite que atingiu o país nas décadas de 80 e 90.
Durante a guerra civil na RDC, muitas estruturas do Estado congolês deixaram de funcionar, o que teve repercussões no sistema da saúde do país. Uma geração inteira de crianças congolesas não conseguiu beneficiar das campanhas de vacinação contra a poliomielite ou paralisia infantil, e hoje essas crianças são adultas e deficientes para toda a vida.
Cadeiras de rodas a preços acessíveis
Robert Mboyo faz parte dessas vítimas da negligência estatal do passado. A sua perna direita está paralisada. Mboyo decidiu criar uma fundação com o seu nome para permitir aos deficientes físicos, principalmente aos mais pobres, beneficiarem de cadeiras de roda baratas fabricadas na RDC a custos muito baixos.
Das 19 pessoas que trabalham aqui, 16 são deficientes físicos, diz Mboyo e acrescenta: “A ideia surgiu porque os deficientes físicos sofrem muito neste país onde falta tudo: pneus para os triciclos, muletas, etc. E como o governo não nos ajuda decidi avançar com esta fundação para ajudar os outros deficientes”.
Robert Mboyo, de 36 anos de idade, precisa de muletas para se deslocar. Atravessa o pátio do Hospital de Kinshasa com dificuldade. A sua oficina está situada do outro lado do parque de estacionamento. Perdeu a mobilidade na perna direita depois de ter contraído o vírus da pólio ainda criança: “A minha mãe disse-me que sou deficiente físico desde os dois anos de idade. Nasci no interior do país e na minha região os cuidados médicos eram escassos. Mas agora aqui na capital existem muitos recursos e nas escolas as crianças são vacinadas. Quando era criança nada disso acontecia”.
Estado não ajuda no financiamento
Na RDC, desde 2015, todos os recém-nascidos são vacinados contra a paralisia infantil. Para aqueles que sofreram por não terem beneficiado desse serviço básico, existe a fundação. Na oficina, mecânicos produzem triciclos com pedais acionados com as mãos. A maioria dos deficientes do país não tem posses para pagar um meio de locomoção industrial. Uma simples muleta custa o equivalente a 15 euros, uma cadeira de rodas pelo menos 300. São somas astronómicas para pessoas que muitas vezes estão no desemprego e não foram à escola durante muitos anos precisamente impedidos pela deficiência física
Por isso, diz Robert Mboyo, a sua oficina fabrica tudo que possa ajudar quem tenha dificuldades de locomoção: “Começámos com o projeto em janeiro de 1999 com 39 pessoas. Mas depois fomos forçados a reduzir o pessoal para 19 porque não tivemos qualquer financiamento”.
A fundação é financiada essencialmente através de donativos oriundos da Europa. Particulares, associações, assim como ONGs da França, Holanda e da Alemanha enviam regularmente dinheiro ou peças sobressalentes. Mboyo precisa de pneus, parafusos, correntes para as cadeiras de roda, muletas e muito mais.
Muito por fazer
ONGs especializadas como a Handicap Internacional, estimam que o número de deficientes na RDC ronda os 15 por cento da população. Em 2015, o país ratificou a Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Especialistas como Hubert Chauvet, diretor do gabinete da ONG Christian Blind Mission em Kinshasa, diz que foi um passo corajoso, mas que agora é preciso que o engajamento não permaneça letra morta.
Muitos países do mundo têm sistemas materiais e logísticos que servem para melhorar a qualidade de vida dos deficientes físicos no seu dia a dia. Trata-se, por vezes, de mecanismos tão simples como rampas de acesso e elevadores. Mas não é esse o caso na RDC. Com excepção de algumas escolas que desenvolveram sistemas de acesso, numa cidade como Kinshasa, e muito pior ainda, nas aldeias do interior, não existe nada que facilite o quotidiano dos deficientes físicos. Em países como a RDC, na área da saúde muito pouco foi ainda feito e muito está por fazer.