Etiópia: União Africana apela a cessar-fogo em Tigray
10 de novembro de 2020O presidente da Comissão da União Africana (UA), Moussa Faki Mahamat, apelou esta terça-feira (10.11) a um cessar-fogo na região separatista de Tigray, no norte da Etiópia.
O chefe da UA manifestou-se preocupado "com a escalada do confronto militar" e encorajou as partes em conflito a dialogarem "para encontrar uma solução pacífica no interesse da Etiópia", respeitando os direitos humanos e assegurando a proteção dos civis.
Faki Mahamat reafirmou o "firme compromisso" da União Africana com a ordem constitucional, integridade territorial, unidade e soberania nacionais da Etiópia como forma de "assegurar a estabilidade no país e na região". A UA, que tem sede em Adis Abeba, capital etíope, "está pronta para ajudar na resolução da crise", avançou.
Guerra civil à vista?
Centenas de pessoas morreram em ataques aéreos e combates num conflito em escalada que se teme poder deslizar para uma guerra civil, dada a profunda animosidade entre os tigreanos e o primeiro-ministro Abiy Ahmed, que provém do maior grupo étnico Oromo.
O Governo Federal da Etiópia afirma ter tomado o aeroporto de Humera em Tigray, perto da fronteira com o Sudão e a Eritreia, esta terça-feira, segundo a emissora Fana, filiada do Estado. A Fana avança ainda que várias forças tigreanas se renderam durante a tomada do aeroporto.
Segundo a agência de notícias estatal sudanesa, SUNA, pelo menos 30 tropas etíopes armadas e "um grande número" de refugiados em fuga dos combates na região de Tigray atravessaram a fronteira com o Sudão. As autoridades locais dizem estar a preparar um campo de refugiados para os etíopes em fuga.
Cessar-fogo
Abiy Ahmed disse esta terça-feira, através da sua conta na rede social Twitter, que as "operações de aplicação da lei em Tigray estão a decorrer como planeado" e reafirmou que "cessarão assim que a junta criminosa for desarmada, a administração legítima na região for restaurada, e os fugitivos forem detidos e levados à Justiça". Apontou que todos estes objetivos estão "rapidamente ao alcance".
Redwan Hussein, porta-voz de uma força de trabalho etíope recentemente criada para o conflito do Tigray, acrescentou que as conversações de paz só são possíveis com o Governo local do Tigray se o material militar for destruído, se os funcionários federais forem libertados da custódia e se os líderes da região forem presos.
A comunidade internacional, nomeadamente a União Europeia e as Nações Unidas, manifestou preocupação pelo facto de o segundo país mais populoso de África (mais de 100 milhões de pessoas) estar a afundar-se num longo conflito entre o poderoso exército federal e as forças de segurança do Tigray altamente treinadas.
Segundo uma contagem da agência France-Presse (AFP) baseada em testemunhos de fontes médicas e de trabalhadores humanitários, mais de 200 soldados foram feridos e oito mortos no âmbito desta operação.
Como começou o conflito
O primeiro-ministro da Etiópia e prémio Nobel da Paz 2019, Abiy Ahmed, lançou a 4 de novembro uma operação militar contra as autoridades da região separatista do norte, que tinha anteriormente acusado de atacar duas bases do exército federal. A acusação foi rejeitada pelas autoridades de Tigray.
A força aérea etíope lançou várias rondas de ataques às posições das forças regionais, enquanto do terreno chegam relatos de combates envolvendo artilharia pesada entre as tropas federais e forças de segurança de Tigray, a Frente Popular de Libertação do Tigray (TPLF, na sigla em inglês). A rede de internet e as telecomunicações foram cortadas.
Abiy não mostrou sinais de abertura de conversações com a TPLF, que em tempos dominou a coligação governante da Etiópia, durante 30 anos, até Abiy se tornar primeiro-ministro em 2018.
Tensão aumentou com eleições
Sentindo-se marginalizada pelas reformas políticas de Abiy após a sua tomada de posse em 2018, a TPLF separou-se no ano passado, quando o primeiro-ministro procurou transformar a coligação num único Partido da Prosperidade.
Os seus líderes afirmam que têm sido injustamente visados por processos anticorrupção, afastados de posições de responsabilidade e culpados por todos os males do país.
Em setembro, a TPLF desafiou o Governo federal ao realizar uma eleição local. Adis Abeba considerou a eleição "ilegítima".
A Eritreia e a Etiópia assinaram um acordo de paz há dois anos, mas o Governo de Afwerki continua hostil à liderança tigreiana após o seu papel na guerra devastadora de 1998-2000.