Governo moçambicano continua a fazer pouco contra desflorestação, diz Justiça Ambiental
18 de dezembro de 2014A Justiça Ambiental faz várias denúncias no estudo, divulgado esta quarta-feira (17.12.2014). Para além da exploração ilegal e insustentável de madeira, a organização ambiental aponta também as queimadas descontroladas como outro fator que contribui para a destruição dos recursos florestais moçambicanos.
De acordo com dados oficiais da Direção Nacional de Terras e Florestas do Ministério da Agricultura, citados no relatório, a desflorestação anual em Moçambique está acima dos 219 mil hectares, num país que possui uma área florestal de cerca de 40,6 milhões de hectares. A DW África entrevistou Anabela Lemos, diretora da ONG.
DW África: Quais foram os principais pontos críticos constatados no estudo?
Anabela Lemos (AL): As constatações que apresentámos são as mesmas de todos os outros estudos apresentados nesses últimos 10 anos - as ilegalidades no sistema florestal e a fiscalização quase nula. Por outro lado, os planos de maneio [sustentável] não estão a ser implementados na maioria dos casos. Os inventários florestais não são credíveis e não refletem a realidade do país. Falta informação [sobre as florestas].
DW África: O estudo conclui que as populações não beneficiam como deviam da exploração dos recursos florestais. Na opinião da Justiça Ambiental, quem deveria velar pelas comunidades no que se refere a este ponto ou o que se deve fazer para que elas tenham o que é seu por direito?
AL: Quem devia velar por elas é o Governo. É ele é o responsável pela implementação dos benefícios para a comunidade. E é ela que está a perder em prol de uma exploração tanto nacional como internacional. Porque ela vive daquela floresta e, de repente, já não pode ter os benefícios que tinha. Por isso é que foi introduzida na lei uma taxa de 20 por cento, para a comunidade ganhar algo com a exploração nas áreas usadas por elas. Então, o Governo é que tem de velar por isso.
DW África: Já que o Governo não está a fazer isso, criar organizações ou associações de controlo nas comunidades lesadas seria uma solução?
AL: Existem grupos temáticos nas próprias comunidades. Não é uma associação, mas o Governo sabe que essa comunidade tem um grupo de recursos naturais. É para aí que deve ser canalizado o dinheiro, mas isso não está a acontecer. O sistema existe, os 20 por cento são um benefício para as comunidades, mas [o processo para receber o dinheiro] leva muito tempo e, normalmente, a taxa não vai diretamente para elas. Quando vai, mesmo dentro da comunidade, há quem acaba por ganhar mais do que outros. Não está a ser um sistema justo em todos os aspetos.
DW África: O estudo diz também que a gestão dos recursos florestais não se rege pela dinâmica do ecossistema, mas é centrada nos benefícios económicos. O que quer dizer isso, que a política do Governo não está no caminho certo?
AL: Significa muitas coisas ao mesmo tempo. Significa, por exemplo, que o corte autorizado não está a ser seguido. Depois, o corte não devia ser ao nível nacional ou de uma espécie, o corte autorizado deve ser diferente conforme a biodiversidade e o sistema biológico da área.
DW África: Após este estudo, qual é a recomendação da JA que deixa para as autoridades?
AL: Tivemos um debate com representantes do Governo e propusemos-lhes um diálogo. Porque as plantações estão a ser vistas como reflorestação, o que não é em absoluto. Lembrámos que os impactos do que está a acontecer nas florestas não afetam apenas os cidadãos, o Governo também vai ficar afetado. Daqui a alguns anos não vamos ter florestas para serem exploradas e nem para beneficiar ninguém. Então, a nossa proposta foi que o Governo e a sociedade civil se sentem e comecem, muito seriamente, a pensar em soluções - no que cada um de nós pode fazer.