1. Ir para o conteúdo
  2. Ir para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Histórias de Fuga em Cabo Delgado: "Uma nova vida"

Delfim Anacleto
6 de janeiro de 2023

Neste 5º episódio da série "Histórias de Fuga", a DW África conta o caso de deslocados que conseguiram estabelecer-se nas zonas de acolhimento. O recomeço é a nova filosofia de vida dos deslocados em Cabo Delgado.

https://p.dw.com/p/4LnrC
Mosambik Ärzte ohne Grenzen in Cabo Delgado
Foto: Igor G. Barbero/MSF

Neste 5º episódio da série "Histórias de Fuga" da DW África, contamos as histórias de dois homens que conseguiram estabelecer-se nas zonas de acolhimento e que dizem que, pelo menos para já, voltar a Mocímboa da Praia, está fora de questão.

O recomeço é a filosofia de vida dos deslocados em Cabo Delgado.

Tani e Ussene Amade são duas pessoas que não se conhecem, mas partilham histórias em comum: ambos fugiram da violência no distrito de Mocímboa da Praia, na província moçambicana de Cabo Delgado.

E por que a vida é feita de recomeços, hoje, Tani Dastan e Ussene Amade têm uma nova vida, longe da terra onde nasceram, mas com novas oportunidades. 

Jugendausbildung in Cabo Delgado
Longe da terra onde nasceram,os deslocados agarram novas oportunidades nos centros de acolhimento.Foto: DW

Tani Dastan conseguiu superar vários obstáculos que se atravessaram no seu caminho. É um deslocado de Mocímboa da Praia, norte da província de Cabo Delgado, e vive agora no centro de reassentamento de Lusaka, que foi aberto no distrito de Montepuez, na zona sul.

"Lá em Mocímboa [da Praia] eu tinha os meus bens, que me davam de comer e para sustentar a minha família. Mas quando surgiu essa guerra perdi tudo", Tani Dastan, deslocado interno.

Tani era um comerciante de mariscos, mas também diz que fazia outros biscates, relacionados com a projeção de filmes e jogos de futebol em Mocímboa da Praia. Atividades interrompidas precocemente com a escalada dos ataques terroristas na região.

"Eu às vezes vivia nas ilhas. Tinha um projeto de [projeção] de filmes num clube bem organizado. Quando vieram estes gajos [os terroristas], queimaram e roubaram. Fiquei sem coisa nenhuma", revelou. 

População em fuga no norte de Moçambique

O recomeço

Apesar destas perdas, Tani Dastan agradece pelo fato de ter conseguido escapar com vida na companhia da esposa, dois filhos e um parente que tem problemas de visão. O destino da família foi o posto administrativo de Mirate, em Montepuez, onde diz ter sido bem acolhido. Foi-lhe inclusive oferecido um terreno para erguer um abrigo e cultivar produtos alimentares para sustentar o seu agregado familiar.

Hoje, Tani trabalha como animador num projeto de disseminação de técnicas agrárias da organização não-governamental Olipa Odes. 

"Vivo bem com a minha família e eles [Olipa Odes] estão a ensinar-me muita coisa sobre plantas, como podemos produzir mais. Eu estou a fazer e a ganhar mais. Consigo sustentar a minha família. Como o Programa Alimentar Mundial [oferece donativos] mês sim, mês não, no mês em que não recebemos [apoio], aquilo pouco que ganho na Olipa dá para alimentar a minha família", contou.

Tani Dastan considera que já tem uma vida estável, e enquanto for assim, não pensa em voltar para Mocímboa da Praia.

"Considero a OLIPA como algo que me ajudou. Se eles me protegerem e [permitirem que eu] trabalhe com eles, e eu tiver rendimento, prefiro viver para sempre em Mirate e mais nada", garantiu. 

"Todos os moçambicanos têm uma história para contar"

Mais oportunidades

Outra história, que apesar de ter iniciado de forma trágica, vem conhecendo dias melhores, é a do jovem Ussene Amade, também natural de Mocímboa da Praia. Fugiu da violência e estabeleceu-se no distrito de Metuge, uma das regiões que mais vítimas de terrorismo acolheu desde o início dos ataques dos insurgentes em Cabo Delgado, em 2017.

O Governo apoiou Ussene Amade com ferramentas de carpintaria, e ele montou um negócio.

"De momento estou a viver bem porque recebi um kit e [com] aquele kit já comecei a empregar alguns jovens, cerca de 10 jovens. Já tenho emprego, estou a fazer sofás, camas, estantes", revelou Amade.

Ussene Amade sonha com um futuro sem guerra em Cabo Delgado e acredita que isso passa pela oferta de oportunidades principalmente aos jovens desempregados. Por isso, diz-se aberto para ensinar o ofício de carpinteiro a mais pessoas.

"Estou a tentar [ajudar os outros], para conseguir empregar as pessoas, impedindo que vão para o mato, levando uma arma para matar os outros e conseguir alguma coisa. Aprender é muito importante", concluiu Ussene Amade.

Os deslocados de Cabo Delgado agarram cada oportunidade de recomeço para honrar e testemunhar o valor da paz. Aqui o recomeço acontece todo dia. 

Cooperativa ajuda mulheres deslocadas de Cabo Delgado