Moçambique preside à SADC com foco no terrorismo
17 de agosto de 2020O Presidente da República de Moçambique, Filipe Nyusi, assumiu esta segunda-feira (17.08) a presidência da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC), durante a 40ª cimeira anual da organização, que este ano, devido à pandemia do novo coronavírus, foi virtual.
O encontro decorreu sob o lema 40 Anos Construindo a Paz e Segurança, Promovendo o Desenvolvimento e Resiliência Face aos Desafios Globais - em perfeita sintonia com os temas debatidos na cimeira, segundo o presidente em exercício da SADC, Filipe Nyusi: "Nomeadamente o impacto socioeconómico da Covid-19 na região e não só, a necessidade de reforçar a coesão e cooperação entre os Estados membros da comunidade na prevenção e combate ao crime transfronteiriço com incidência para o terrorismo nas suas mais variadas formas e manifestações".
Moçambique assume a presidência da comunidade numa altura em que a província moçambicana de Cabo Delgado continua a ser alvo de ataques de insurgentes, classificados como ataques terroristas no início do ano pelas autoridades moçambicanas e a comunidade internacional. Muitos, incluindo a oposição sul-africana, esperavam mesmo a adoção de uma resolução concreta sobre a insurgência na província moçambicana, na cimeira desta segunda-feira – o que acabou por não acontecer.
Ainda assim, no final da cimeira, os líderes da SADC manifestaram o seu apoio ao Governo moçambicano no combate aos grupos armados que protagonizam ataques no norte do país. "A cimeira manifestou a solidariedade e o compromisso da SADC em apoiar Moçambique na luta contra o terrorismo e ataques violentos", refere a declaração final da cimeira.
Os chefes de Estado e de Governo da SADC acolheram com seriedade a decisão do Governo moçambicano de alertar os membros da organização sobre a violência no norte de Moçambique, assinala o documento.
Para o antigo secretário-executivo da SADC, o moçambicano Tomaz Salomão, é preciso encontrar uma forma de os países assumirem responsabilidades coletivas no combate ao terrorismo em Cabo Delgado. "Tudo o que se diz é que estes terroristas estão a partir, têm como base logística, ponto de partida, a República Unida da Tanzânia", afirma. "Parece que isto é um aspeto que precisa de ser visto, precisa de ser olhado e precisa de ser analisado, mas com a frontalidade necessária".
Investimentos podem levar a intervenção?
Mocímboa da Praia, uma das principais vilas de Cabo Delgado, vive desde a última semana sob ataques e o seu porto terá sido tomado de assalto pelos insurgentes depois de uma batalha que resultou em vítimas mortais, embora ainda não tenham sido revelados dados concretos.
A vila está situada a 70 quilómetros a sul da área de construção do projeto de exploração de gás natural conduzido por várias petrolíferas internacionais e liderado pela Total, por onde a África do Sul investiu cerca de 15,8 mil milhões de dólares.
Na semana passada, a ministra sul-africana da Defesa e dos Antigos Combatentes Nosiviwe Mapisa-Nqakula, respondendo ao Parlamento, assegurou que a inteligência militar acredita que os ataques dos insurgentes vão continuar, principalmente em áreas próximas do bloco explorado pela Total, que conta com o investimento sul-africano.
A maior força da oposição da África do Sul, a Aliança Democrática, tem feito pressão sobre as autoridades de Pretória para que o país venha a liderar uma força da SADC para proteger os interesses sul-africanos.
Calton Cadeado, docente e analista político moçambicano, considera que "os investimentos que existem em jogo" puxam para o "lado do sim" a uma intervenção. "Mas também se pode dizer não, porque num passado bem recente já houve também condições para pressionar o Governo sul-africano para intervir em Moçambique quando o senhor Afonso Dhlakama fez o seu retorno à guerra aqui em Moçambique, mas a África do Sul não interveio para proteger o grande investimento que é a Sasol", ressalva.