Portugal e Angola: Cooperação em matéria judicial mantém-se?
24 de julho de 2024Angola coopera judicialmente com Portugal. Em 2018, depois de um mal-estar entre os dois países, o Estado português enviou um processo judicial relacionado com o ex-vice-Presidente angolano, Manuel Vicente, para ser julgado em Luanda. Foi um pedido expresso de Angola. De lá para cá, o processo continua engavetado. Sobre ele, também não foi dita uma única palavra durante aquele que foi o primeiro dia da visita do primeiro-ministro português, Luís Montenegro, a Angola.
O "irritante" entre os dois países sobre este caso parece ser coisa do passado.
Esta terça-feira (23.07), ambos os países assinaram 12 instrumentos de cooperaçãoem diversas áreas, da administração interna à economia. Luís Montenegro disse que Angola é "um país irmão". Angola quer uma cooperação mais veloz com Lisboa.
Mesmo assim, o caso de Manuel Vicente continua por resolver. Depois de Luanda se mostrar indignada por Portugal ter começado a instrução de um caso que envolve o antigo vice-Presidente angolano, acusado de corrupção, Lisboa enviou o processo para julgamento em Angola, em 2018. Volvidos seis anos, Vicente ainda não foi levado a tribunal em Angola.
Em entrevista à DW, o jurista Manuel Cornélio afirma que, "para Angola, foi uma vitória, mas para Portugal foi um certo desperdício. Obviamente que Portugal se submeteu ao desperdício na salvaguarda dos interesses económicos que tem com Angola", diz.
O "irritante" acabou
O jurista entende ainda que este caso não belisca as relações entre os dois países. Pelo contrário: o "irritante" acabou e as relações bilaterais parecem ter melhorado.
Agostinho Canando, outro jurista angolano, acredita que a cooperação entre Angola e Portugal vai continuar, apesar do caso do ex-vice-Presidente. Ainda assim, diz à DW, preferia que o processo fosse julgado em Portugal.
"Essas cooperações acabam, muitas vezes, por atrapalhar o bom andamento dos processos, quer numa realidade quer noutra. E os casos que envolvem governantes angolanos ou figuras politicamente expostas da República de Angola em Portugal acabam por cair por terra sempre que envolve uma entidade portuguesa no meio", afirma.
João Malavindele, diretor executivo da organização não-governamental Omunga, justifica-o com a relação "de muita cumplicidade" entre Angola e Portugal.
"Efetivamente, há determinados processos que deveriam merecer determinada atenção por parte dos dois países, mas tomando em conta essa relação quase umbilical entre Angola e Portugal, tem havido acordos bilaterais nesse sentido que, aos olhos dos cidadãos, não têm sido dignificantes."
Em Portugal, a justiça condenou um antigo procurador, Orlando Figueira, a seis anos e oito meses de prisão, tendo dado como provado que ele foi corrompido para arquivar processos judiciais que visavam Manuel Vicente.
Até agora, durante a visita do primeiro-ministro português a Angola, não foi dita uma única palavra sobre o caso de Vicente.
Visita prossegue
Esta quarta-feira (24.07), segundo dia da visita oficial de Luís Montenegro a Angola, será dedicada à vertente económica. Isto depois de, ontem, o primeiro-ministro português ter anunciado o alargamento da linha de crédito a Angola em 500 milhões de euros.
O primeiro dia da visita, na terça-feira, teve como ponto alto o encontro com o Presidente da República de Angola, João Lourenço, e a assinatura de 12 instrumentos jurídicos, entre eles um que assegura que o Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP) começará a trabalhar em Angola para promover a formação profissional de quadros angolanos.
A visita de Luís Montenegro a Angola termina na quinta-feira à noite.