Angola: Oposição abandona o Parlamento em protesto
19 de fevereiro de 2020Em Angola, os partidos na oposição abandonaram o Parlamento nesta quarta-feira (19.02) como forma de protesto contra a tomada de posse do novo presidente da Comissão Nacional Eleitoral. Chama-se Manuel Pereira da Silva, um nome que oposição diz "não possuir idoneidade moral para dirigir o órgão eleitoral".
Os deputados dos partidos da oposição com assento parlamentar, União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), Convergência Ampla de Salvação de Angola - Coligação Eleitoral (CASA-CE), Partido da Renovação Social (PRS), Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA) e os quatro independentes optaram por deixar a sala antes da votação por considerarem que "Manico", como é conhecido o número um da CNE, não reúne condições para o cargo.
Enquanto decorria a votação, a polícia nacional reprimia uma manifestação promovida pelas organizações juvenis dos partidos na oposição contra a tomada de posse do presidente da CNE. Agesntes de segurança lançaram gás lacrimogéneo e detiveram mais de duas dezenas de manifestantes e jornalistas, alguns brutalmente espancados.
Dia triste para a Oposição angolana
O líder da bancada parlamentar da UNITA, o principal partido na oposição angolano, Liberty Chiaka, manifestou a sua decepção pela a recusa dos deputados do partido no poder, o MPLA, em impedir a tomada de posse de Manuel Pereira da Silva para liderar a Comissão Nacional Eleitoral (CNE), após ter sido declarado vencedor num concurso público controverso que teve lugar em 2019.
"A casa da democracia acabou de cometer um suicídio. Repito: a casa da democracia acabou de cometer um suicídio. Hoje é um dia muito e muito triste", afirmou Chiaka.
O presidente do grupo parlamentar da UNITA vai ainda mais longe, dizendo mesmo que o dia de hoje deveria ser declarado como "o da vergonha nacional", tendo, nas entrelinhas, deixado um recado de que o principal partido na oposição não vai permitir que o órgão responsável pela condução dos processos eleitorais, autárquico e gerais, seja dirigido por entidade não idónea.
"Devia ser declarado o dia da vergonha nacional. Senhor presidente da Assembleia Nacional, acabou hoje, o combate contra a corrupção. O combate contra a corrupção acabou hoje. Hoje é dia do "comba" [velório] nacional", lamentou Liberty Chiaka.
Protesto reprimido com carga policial
Enquanto decorria a votação, no exterior da Assembleia Nacional, a polícia nacional reprimia uma manifestação promovida pelas organizações juvenis dos partidos na oposição contra a tomada de posse do presidente da CNE. Num ato descrito como desproporcional e violento, os órgãos da segurança lançaram gás lacrimogéneo e detiveram mais de duas dezenas de manifestantes, entre eles o secretário-geral da JURA, o braço juvenil da UNITA, e da JPRS, do Partido da Renovação Social.
Alguns jornalistas de diversos órgãos foram detidos e dizem ter sido brutalmente espancados quando tentavam cobrir o ato. Outros, foram retidos numa rua, onde a polícia formou um condão de segurança para impedir que se aproximassem do local onde decorriam os protestos.
Em entrevista à Rádio Despertar, um dos manifestantes caraterizou a brutalidade policial como a representação da "cara do regime”.
Apesar dos protestos de rua e das reivindicações da oposição, a tomada de posse de Manuel Pereira da Silva foi mesmo viabilizada por 111 parlamentares do MPLA. A resolução foi aprovada por 111 votos a favor do partido com a maioria parlamentar, nenhum voto contra e nenhum a favor, depois de um debate duro em que a oposição não poupou críticas a Manuel Silva Pereira "Manico”, o nome designado pelo Conselho Superior da Magistratura Judicial para ocupar o cargo de presidente da CNE.
MPLA aprovou sozinho
O deputado Leonel Gomes, da CASA-CE, um dos que abandonou o hemiciclo, reagiu nos seguintes moldes: "Lamentar o facto dos deputados do MPLA terem dado provimento a uma matéria bastante fraturante e mais uma vez, a imagem do país sairá gravemente manchada".
Já Lucas Ngonda, da FNLA, disse que o seu partido "votou contra a tomada de posse de Manuel Pereira da Silva, devido às regularidades gravíssimas no processo que conduziu a sua eleição". Ngonda diz que "o Parlamento devia refletir seriamente sobre esta questão, já que decorre nos tribunais um processo com vista a anulação da eleição de Manuel Pereira da Silva".
Nenhum deputado do MPLA se pronunciou sobre o assunto.