Refugiados da RDC em Angola pedem o fim dos repatriamentos
7 de março de 2018São 530 refugiados da República Democrática do Congo que se encontravam em Angola e foram repatriados para a RDC entre os dias 25 e 27 de fevereiro. Segundo o ACNUR, o Governo alega que uma vez que não tinham registo biométrico, os refugiados foram considerados imigrantes irregulares e enviados de volta para a RDC.
Já o coordenador nacional da comunidade dos refugiados em Angola, Mussenguele Kopele, fala em acordos entre os Governos congolês e angolano para o repatriamento. Em entrevista à DW África, Kopele acredita que as autoridades da RDC querem mostrar que são capazes de receber os seus cidadãos, numa altura em que a situação no país continua instável, com confrontos entre milícias e as forças armadas.
DW África: Confirma o repatriamento de 530 refugiados?
Mussenguele Kopele (MK): Neste momento, não posso confirmar números exatos, mas sabemos que foram mais de 400 refugiados forçados a regressar. Muitos regressaram, mas estão a tentar fugir de novo. Estão a perseguidos, não há respeito dos direitos humanos e, por isso, tentam proteger-se. E o país mais próximo é Angola. Pedimos ao Governo que mostre aquela boa vontade de acolher os refugiados e que não entre nos repatriamentos forçados. Alguns estão a tentar voltar voluntariamente, mas a maioria está a ser forçada. Dizemos forçados, porque na RDC todos sabem que não há paz. Não há tranquilidade para voltar. Se os refugiados quiserem voltar, tem de ser de forma voluntária e num processo tripartido.
DW África: Como é que as autoridades angolanas justificam o repatriamento?
MK: Não sabemos o que é que o Governo pensa, isso são acordos entre o Governo da RDC e o Governo e Angola. E nós dizemos que o repatriamento tem de ser tripartido. Têm de chamar o ACNUR, saber como é que vão organizar o repatriamento. O Governo da RDC não pode ir buscar os refugiados e força-los a voltar. O Governo é soberano, mas há acordos. O país tem de estar em paz para receber estas pessoas.
DW África: Segundo o ACNUR, o Governo alega que falta o registo biométrico destes refugiados, apesar de terem pulseiras de identificação do ACNUR e preencherem os critérios previstos na Convenção para Refugiados...
MK: O registo biométrico já foi feito. O ACNUR fez o registo. Temos os refugiados que "escaparam”, que não conseguiram entrar no campo de refugiados do Dundo e utilizaram outras entradas, como Luanda, e estão um pouco dispersos. Não estão ainda sob o controlo do Governo e do ACNUR. A informação que temos do Governo é de que o registo biométrico está a ser alargado a todo o país, não apenas no Dundo.
DW África: Como é que pode ser travado este repatriamento?
MK: As leis, as convenções e os acordos têm de ser respeitados. O mundo vê que a RDC ainda não tem estabilidade e é impossível fazer um repatriamento organizado. Os refugiados estão a ser muito maltratados em Angola, no sentido em que a lei foi publicada em 2015 e não está a ser aplicada. Os refugiados que estão aqui há muitos anos têm os documentos caducados, não têm proteção jurídica. A própria polícia não entende que a vulnerabilidade só aumentou. Os refugiados não têm trabalho, não têm assistência e a vida está muito complicada.
DW África: Acha que os refugiados vão continuar a ser repatriados?
MK: O Governo de Angola tem de se comportar como um Governo responsável e respeitar os direitos humanos. A partir do momento em que acolheu os refugiados, tem de os proteger e não enviá-los de volta para onde ainda há problemas. Os refugiados vão sentir que estão a ser levados à força. Não é bom para o nome do Governo. Mas não acreditamos que isso venha do Governo de Angola. Talvez o Governo da RDC esteja a tentar mostrar à comunidade internacional que tem capacidades de suportar o regresso dos refugiados. Isto, num momento em que sabemos que não é possível o regresso dos refugiados congoleses.