Saída da SAMIM: "Há total vulnerabilidade em Cabo Delgado"
12 de abril de 2024Já começou a retirada da missão militar da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) para o combate ao terrorismo em Cabo Delgado, no norte de Moçambique.
Em declarações à DW, o politólogo Fidel Terenciano diz que isso poderá piorar a situação de segurança na província e, por via disso, forçar a declaração do estado de emergência e de sítio, algo que poderia levar a reviravoltas na política moçambicana.
Terenciano desconfia que a demora na indicação dos candidatos às eleições presidenciais deste ano, dos principais partidos políticos nacionais, possa também ter alguma ligação com o cenário no país depois da retirada da SAMIM de Cabo Delgado
DW África: Como encara esta saída da Missão Militar da África Austral (SAMIM) de Cabo Delgado?
Fidel Terenciano (FT): Eu penso que há um ceticismo total da população, porque, num determinado momento, a população terá compreendido que esse apoio conjunto das forças ruandesas e das forças da SADC estavam a trazer tranquilidade a Cabo Delgado.
DW África: Com esta saída, aumenta a vulnerabilidade da província?
FT: Há uma total vulnerabilidade em Cabo Delgado. E ao analisar este conflito, o público estabelece uma conexão com o interesse do Presidente da República em não declarar que irá sair do poder. A "brecha" no sistema de segurança, com a saída das forças da SAMIM, [pode significar] o recrudescimento do conflito e, se isso se verificar, do ponto de vista constitucional, o Presidente da República pode declarar o estado de emergência ou de guerra...
DW África: Partindo desse pressuposto e desta hipótese, seria o caso de se estar a jogar com os "timings"? Pelo menos, no ano passado, já se sabia que as tropas da SAMIM se iam retirar até julho deste ano. Está-se a jogar com o "timing" para que isto aconteça e se possa declarar esse estado de sítio?
FT: Em geral, declarações de estado de sítio dependem do recrudescimento total dos conflitos, e penso que isso poderá acontecer. A questão do tempo, o "timing" de que fala, é no sentido de irmos empurrando esses fenómenos todos até maio ou junho, e se os ataques se começarem a fortalecer, declarar-se-ia então estado de sítio ou estado de guerra.
Com a [demora] na indicação dos pré-candidatos do partido FRELIMO, e numa situação de não indicação dos candidatos de outros partidos, parece que há um cenário de uma construção conjunta...
DW África: Um denominador comum?...
FT: Um denominador comum, pois não adiantaria correr para declarar os candidatos, porque isso poderá não se efetivar.
DW África: Nesse sentido, Cabo Delgado pode ser usado agora como justificação para muitos processos que poderão não acontecer em Moçambique, tendo em conta este ano eleitoral?
FT: Cabo Delgado configura-se como um espaço em que [algumas] estruturas políticas e partidárias, particularmente ligadas ao partido FRELIMO, se podem aproveitar para diferentes tipos de enriquecimento.
Lembremos que, em Cabo Delgado, parece dominar, neste momento, a venda de drogas e a movimentação de recursos preciosos. Mas, se olhar para o que está a acontecer em Cabo Delgado, não nota nenhum desenvolvimento.