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Tunísia: Repressão domina corrida eleitoral

Jennifer Holleis | Tarak Guizani
10 de setembro de 2024

Enquanto o país caminha para as eleições presidenciais, a 6 outubro, observadores alertam que a votação poderá não ser democrática. Entendem que o Presidente Kais Saied está a prejudicar a base democrática das eleições.

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Tunesien Kais Saied
Foto: ZUMAPRESS.com/picture alliance

É que dos 17 candidatos que anunciaram concorrer à Presidência, 14 foram detidos ou impedidos de concorrer. Na segunda-feira (09.09), a Comissão Eleitoral Independente tunisina aprovou apenas três candidatos, excluindo outras três candidaturas que o Tribunal Administrativo tinha reintegrado no fim de agosto.

Na verdade, muitos observadores afirmam que a Comissão Eleitoral não é tão independente assim, já que o próprio Presidente Saied nomeou todos os sete membros.

Heike Löschmann, diretora, em Tunís, na Fundação Alemã Heinrich Böll, ligada ao partido alemão "Os Verdes" entende que "com a decisão da Comissão Eleitoral Independente, a ISIE, de não aceitar a decisão do tribunal administrativo sobre a admissão de três candidatos adicionais, o processo foi finalmente deslegitimado."

Além de Saïed, Zouhair Maghzaoui, um ex-membro do Parlamento, e Ayachi Zammel, um empresário que lidera um pequeno partido pró-negócios, foram admitidos como candidatos. No entanto, ainda não se sabe se esse último poderá de fato concorrer. Após a sua aprovação como candidato, as forças policiais o detiveram temporariamente,  a 4 de setembro. O seu advogado disse à agência de notícias AP que ele foi acusado de falsificar assinaturas, facto que nega.

Manifestação contra a exclusão de candidatos às presidenciais diante da Comissão Eleitoral Independente, em Tunís
Manifestação contra a exclusão de candidatos às presidenciais diante da Comissão Eleitoral Independente, em TunísFoto: Hasan Mrad/ZUMAPRESS./picture alliance

Retorno ao regime autocrático na Tunísia?

Relembremos a trajetória do Presidente. Kais Saïed, um ex-professor de direito de 66 anos, foi eleito democraticamente em 2019 com uma maioria de 72% dos votos. No entanto,  para consolidar o seu poder, desmantelou a maioria dos órgãos democráticos do país em julho de 2021.

Desde então, passou a reprimir a dissidência política, amordaçar a media independente e a esvaziar a independência do Judiciário. E tudo isso se tornou parte da nova realidade tunisiana, dizem as organizações de direitos humanos. Em meados deste ano, Saied também dispensou a maioria dos membros do gabinete e reprimiu as principais figuras da oposição.

Para Hamza Meddeb, pesquisador do Centro Carnegie para o Médio Oriente, sediado em Túnis, "a situação atual não tem precedentes, pois o Presidente quer ser reeleito afastando os concorrentes, sem permitir concorrência e eleições livres e justas".

Além das questões políticas que envolvem a consolidação de Saied no poder, a repressão às organizações pró-migração também têm gerado controvérsia. Escritórios foram fechados, contas confiscadas e pessoas presas. Saïed enfatizou que a sua reeleição seria fundamental para a "guerra de libertação nacional" que ele afirma ser marcada por uma crise migratória.

Para o analista Meddeb, vive-se no país uma perda das conquistas obtidas nas revoltas árabes, em 2011. "A Tunísia, que foi o farol democrático da região por uma década, agora está testemunhando uma restauração autocrática com quase nenhuma esperança de voltar a um caminho democrático", afirma.

Migrantes irregulares na cidade tunisina de Amra vivem em condições difíceis
Migrantes irregulares na cidade tunisina de Amra vivem em condições difíceisFoto: Yassine GaidiAnadolu/picture alliance

Saïed: "Migrantes são uma ameaça à sociedade"

Além das questões políticas que envolvem a consolidação de Said no poder, a política migratória tunisina tem gerado controvérsia. Na sua campanha eleitoral, Saïed enfatizou que a sua reeleição seria fundamental para a "guerra de libertação nacional" que ele afirma ser marcada por uma crise migratória.

Nos últimos anos, a Tunísia se transformou em um dos pontos de partida mais populares para migrantes de países subsaarianos a caminho da Europa. Mas, em 2023, um acordo de mil milhões de euros com a União Europeia (UE) para ajudar a economia em dificuldades da Tunísia fez com que o país começasse a reduzir a migração para a Itália, o que levou a uma queda de 70% no fluxo migratório, de acordo com as autoridades italianas.

Internamente, Saïed descreveu repetidamente "os migrantes como uma ameaça à sociedade, apresentando-se como o salvador", disse Medded. Porém, cada vez mais, a repressão aos migrantes também tem como alvo as organizações não governamentais tunisianas que ajudam os migrantes.

Vários escritórios foram fechados, contas confiscadas e pessoas presas. Uma delas é Saaida Mesbah, que dirige a ONG Mnemti, uma organização especializada na defesa de migrantes subsaarianos.

"Saadia Mesbah continua detida, embora nenhuma acusação oficial tenha sido feita contra ela", disse Ziad Rouini, coordenador da organização, à DW por meio do serviço de mensagens Telegram, pois teme que o seu telefone esteja grampeado pelas autoridades. "Desde então, a ONG Mnemti está num estado de completa estagnação", acrescentou.

Nesse sentido, a repressão prolongada está simplesmente da esfazer todas as conquistas da revolução da Primavera Árabe, diz Romdhane Ben Omar, do Fórum Tunisiano de Direitos Económicos e Sociais.

"O caminho atual de Kais Saïed mina os ganhos remanescentes da revolução, como a liberdade, o pluralismo, a liberdade de expressão e agora também criminaliza e proíbe qualquer forma de solidariedade e ajuda", lamentou.

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Tarak Guizani Journalist
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