Eleições na RDC: UE pede transparência em momento histórico
19 de dezembro de 2023A União Europeia (UE) considerou hoje que as eleições de quarta-feira na República Democrática do Congo (RDCongo) são um "momento histórico" e apelou a um processo "transparente e pacífico", sem "abusos dos direitos humanos".
Em comunicado, o Serviço de Ação Externa da UE defendeu que as eleições na RDCongo são "um momento histórico que vai determinar o rumo do país e a parceria" com os 27 do bloco comunitário do qual Portugal faz parte.
A União Europeia apelou à "participação ativa de todas as partes envolvidas na campanha eleitoral", mas recordou que as autoridades congolesas têm "a responsabilidade" de assegurar que todo o processo é "inclusivo, livre, transparente e pacífico", permitindo a todos os observadores "total independência", assim como o trabalho dos jornalistas.
Desse modo, a UE está certa de que a vontade da população vai ser "ouvida e respeitada".
Esta vontade contrasta com denúncias de "graves violações e abusos dos direitos humanos" reportadas pelas Nações Unidas na campanha eleitoral.
"Esforços para dividir a população com base na etnia ou origem, assim como quaisquer comentários que incitem à violência, são inaceitáveis. Todos os cidadãos devem poder exercer o seu direito de voto com total segurança, independentemente da sua filiação política e sem receio de violência ou represálias", acrescentou a UE na nota divulgada.
Entre a esperança e a desilusão
Quer sejam a favor da mudança ou da continuidade, cheios de esperança ou sem ilusões, toda a gente na capital Kinshasa, em Goma ou em Lubumbashi, no leste, quer acreditar que as eleições na República Democrática do Congo serão livres de violência e devidamente organizadas na quarta-feira.
"Amanhã vai ser calmo, é quando chegarem os resultados que poderá haver problemas", prevê Flory Tshimanga, 32 anos.
"Não digo em quem vou votar porque não quero ser espancado", acrescentou o vendedor de créditos telefónicos que a AFP encontrou na terça-feira em Kinshasa, muito perto da sede da Comissão Eleitoral (Céni).
Num clima tenso, cerca de 44 milhões de eleitores, numa população de cerca de 100 milhões, são chamados a eleger o seu presidente, bem como os seus deputados nacionais e provinciais e os seus conselheiros locais
Na eleição presidencial, o chefe de Estado cessante, Félix Tshisekedi, a quem o Céni atribuiu o número 20 como número de candidatura, procura um segundo mandato contra 18 candidatos de uma oposição fragmentada, que não conseguiu chegar a acordo sobre um candidato comum para esta eleição a uma só volta.
Após um mês de comícios e promessas, a campanha terminou à meia-noite de segunda-feira. Terça-feira é, pelo menos oficialmente, um dia de "silêncio eleitoral", de reflexão e de ajustes finais na organização do escrutínio quádruplo, uma verdadeira dor de cabeça logística neste imenso país de 2,3 milhões de km2.
"Asseguraram-nos que o material estará nas assembleias de voto", diz, confiante, Eric Ikoma, um funcionário público que veste uma t-shirt com a efígie do Presidente cessante por baixo da camisa meio abotoada.
Na rotunda de Kintambo Magasin, na habitual azáfama matinal, muitos dos habitantes de Kinshasa entrevistados dizem que vão votar no número 20, mesmo que, paradoxalmente, queiram "mudança".
Como Gédéon Panzu, 27 anos, motorista de um miniautocarro amarelo dos transportes públicos, chamado "esprit de mort". "Durante o seu primeiro mandato, não pôde fazer o que gostaria, por causa da Covid", diz o jovem. Mas durante o seu segundo mandato, "vai fazer milagres".
Sob o olhar dos apoiantes de Félix Tshisekedi, Joséphine Guyguy, 59 anos, professora, não se sentia muito à vontade, mas arriscou: ia votar no "número 3".
Não diz o nome, mas o terceiro é Moïse Katumbi, antigo governador de Katanga (sudeste), considerado o principal adversário do Presidente cessante. "Temos de escolher o melhor, e com o número 3 temos esperança", confirma.
No outro extremo do país, em Lubumbashi, o bastião de Moïse Katumbi, Mulumba Kalombo, um vendedor ambulante de 46 anos, não hesitou um segundo e votou nele. Porque "Félix é um ingrato", diz.
"Amanhã, vou votar na mudança, mesmo que os resultados sejam conhecidos de antemão", declarou Syrile Mulaj, 67 anos, cientista política de formação, na mesma cidade do sudeste do país, embora não quisesse dizer o nome do candidato da sua preferência. "O voto é secreto", recorda.
Quanto a Mélissa Feza, 53 anos, licenciada em língua e literatura francesas, não vai votar. Nenhum dos candidatos a convenceu e, além disso, na sua opinião, "é uma eleição fictícia". "Para mim, é uma perda de tempo", diz.
Em Goma, uma grande cidade no leste da RDC, nocentro dos conflitos que dilaceram a região há quase 30 anos, a desconfiança é generalizada.
"Que Deus nos ajude, para que aquele em quem votamos seja aquele que será declarado eleito", pergunta Eric Mumbere, um desempregado de 27 anos. "Há muito sofrimento com o atual presidente", diz ele.
Whitney, um "kadhafi" (vendedor de combustível) que encontrámos na rotunda de Instigo, na capital provincial do Kivu do Norte, não acredita nem por um segundo na transparência das eleições. "Quer votemos nele ou não, ele vai ganhar", diz sobre Félix Tshisekedi.
Whitney, um "kadhafi" (vendedor de combustível) que encontrámos na rotunda de Instigo, na capital provincial do Kivu do Norte, não acredita nem por um segundo na transparência das eleições. "Quer votemos nele ou não, ele vai ganhar", diz sobre Félix Tshisekedi.
Por seu lado, Espérance Mazika, 50 anos, vendedora de milho na zona oeste de Goma e mãe de nove filhos, não sabe se poderá votar. Tal como milhares de outros congoleses, o seu cartão de eleitor desapareceu.
"É um problema", diz ela simplesmente, apesar de o Céni nos garantir que todos os congoleses inscritos nos cadernos eleitorais poderão votar.