1. Ir para o conteúdo
  2. Ir para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Vídeo reacende debate sobre Madgermanes em Berlim

Cristiane Vieira Teixeira (Berlim)
7 de novembro de 2017

Montagem é apresentada na abertura de discussão na Fundação Rosa Luxemburgo, esta terça-feira (07.11), na capital alemã. Autora quer reconhecimento do racismo na ex-RDA e pagamentos para os ex-trabalhadores moçambicanos.

https://p.dw.com/p/2mzuK
Mosambik Friedliche Demonstration
Manifestação dos Madgermanes a reivindicar o pagamento de 60% dos salários, em abril de 2011, em MaputoFoto: Ismael Miquidade

O vídeo baseia-se em entrevistas com ex-trabalhadores da extinta República Democrática Alemã (RDA), colhidas em 2016, e em imagens de arquivo. As gravações foram realizadas na cidade da Beira, Chimoio, Maputo e Nampula - mas também em Suhl, na Alemanha.

A jornalista alemã Julia Oelkers apresenta um resumo de como se deu a vinda dos moçambicanos para a RDA, até às condições em que vivem atualmente. Para a autora, trata-se apenas de uma montagem, resultado de uma pesquisa e com o objetivo de ser apresentada como introdução a debates sobre o tema.

"Eu descrevo em que situação histórica surgiu a ideia de que trabalhadores e trabalhadoras moçambicanos viessem para a RDA para trabalhar e receber formação, quais eram as expectativas, como era a realidade das pessoas aqui e como se lidou com elas depois da Reunificação [da Alemanha]", revela.

Berlin, Julia Oelkers
A jornalista alemã Julia OelkersFoto: DW/C.Vieira Teixeira

Dar voz aos excluídos

O vídeo documenta a versão dos ex-trabalhadores moçambicanos. Entre outros, falam sobre o racismo que sofreram.

"Quando eu pedia para fazer horas extras, o supervisor de turno me mandava embora. Dizia que não tenho o direito de fazer horas extras, porque sou negra. Só os brancos é que tinham que fazer as horas extras", afirma em lágrimas Rita Cenunia.

"De alguém chegar no lar e dizer: 'Fui batido por um grupo de jovens alemães", recorda noutro trecho David Macao.

A jornalista alemã explica o motivo que a levou a focar este tema. "Ainda há a posição 'Não havia racismo na RDA. As pessoas não foram tratadas dessa forma'. Isso simplesmente não é verdade. Há muitas pessoas que ainda vivem aqui. Que se tematize isso, que se trate as pessoas com respeito e também se reconheça o desempenho que trazem como parte da sociedade", defende.

Vídeo reacende debate sobre Madgermanes em Berlim

Pagamento que nunca receberam

Outro ponto crucial é o não pagamento de 60% dos salários. Aos ex-trabalhadores foi prometido que receberiam no regresso ao seu país. Mas o montante foi descontado da dívida de Moçambique com a RDA. Um dinheiro que os moçambicanos reivindicam sem sucesso até os dias atuais.

"O dinheiro nunca foi enviado. Foi debitado de dívidas do Estado [moçambicano com a RDA]", explica.

"Para a Alemanha, não é muito dinheiro e gostaria novamente de abrir uma discussão, se não há uma responsabilidade política e moral por essas pessoas que viveram e trabalharam aqui por tantos anos e que foram enganadas em uma parte tão grande de seus salários", diz Julia Oelkers.

Ataques em Hoyerswerda em 1991

A realização da pesquisa sobre os Madgermanes, como são conhecidos, é resultado de um outro projeto da jornalista.

DW 60 Jahre Ausschreitungen in Hoyerswerda 1991
Em 1991, prédio em Hoyerswerda onde viviam moçambicanos foi atacado durante vários diasFoto: picture-alliance/dpa

"Hoyerswerda 1991" documenta o ataque ocorrido naquele ano contra a moradia de então trabalhadores moçambicanos da RDA, naquela cidade da Saxônia.

"A polícia não conseguiu controlar a situação e também não protegeu as pessoas, mas decidiu-se evacuar os migrantes da cidade. Esse foi o resultado e os neonazis comemoraram como uma vitória", recorda a jornalista.

"Na época, fiz uma entrevista com um dos moçambicanos que foram agredidos, Manuel Nhacutou, e ele disse que colegas de trabalho e vizinhos os atacaram. Isso marcou-me muito", conta.

Com o seu empenho em temas sobre o racismo contra migrantes, a jornalista alemã Julia Oelkers espera manter aceso o debate e, quem sabe, um dia, alcançar um resultado concreto.

"Eu gostaria simplesmente que seja admitido que havia essa forma de exploração e que as pessoas não foram recompensadas, que ninguém se desculpou com elas, mas que foram deixadas sozinhas, não avançam com sua luta e ninguém se importa com elas", conclui.