Venâncio Mondlane está a quebrar "dogmatismos políticos"
22 de março de 2024O Tribunal Judicial da Cidade de Maputo julga esta sexta-feira (22.03) a providência cautelar sobre a marcação da data do congresso da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), interposta por Venâncio Mondlane.
O deputado da RENAMO disse esta semana à imprensa esperar que a sentança do tribunal obrigue o maior partido da oposição a convocar o congresso.
Em entrevista à DW África, o politólogo Fidel Terenciano afirma que Venâncio Mondlane está a quebrar o dogmatismo político, há muito instalado na esfera poítica moçambicana sob a capa de disciplina partidária. Mas acrescenta que, independentemente da decisão do tribunal, o deputado poderá sofrer um isolamento político dentro da RENAMO.
DW África: Que lições políticas o país tira das demarches judiciais conduzidas por Venâncio Mondlane, contra a liderança da RENAMO?
Fidel Terenciano (FT): Venâncio Mondlane, neste momento, está a induzir a sociedade moçambicana a compreender que é possível o Judiciário intervir positivamente, para induzir que as instituições políticas, particularmente os partidos políticos, comecem a respeitar não só os seus procedimentos e as suas normas internas, mas também as normas deste país, entre elas a Lei dos Partidos Políticos, a Constituição da República de Moçambique, o Código Penal e o Código do Processo Penal, entre outras legislações que existem.
DW África: Neste caso, será Venâncio Mondlane um mal necessário, não só dentro da RENAMO, mas também na esfera política moçambicana?
FT: Se num passado muito recente tínhamos o Azagaia na dimensão da cultura, o professor Adriano Nuvunga na dimensão da sociedade civil, Alice Mabote na dimensão da questão de direitos humanos, hoje nós temos um membro dentro de um partido político que também entende que pode fazer ativismo político dentro desse partido político.
DW África: Está a dizer que também Venâncio Mondlane está a tentar quebrar aquele paradigma do dogmatismo político?
FT: Exatamente. Ele está a começar uma caminhada de um ativismo político interpartidário, com o qual os membros dos partidos políticos, mesmo estando dentro dos partidos políticos, podem questionar o status quo existente dentro da instituição política.
Mas o grande problema no meio disso tudo é que os dogmáticos dentro do partido RENAMO vão colocar em causa, digamos assim, a fidelidade partidária deste membro, com a ideia de que, se realmente isso fosse um grande problema do ponto de vista da gestão desse partido, ele tinha canais próprios dentro do partido para tentar fazer valer a sua opinião. Venâncio não decidiu ir por esse caminho. Preferiu colocar os dogmas intrapartidários no espaço público, na hasta pública e é o que está a acontecer hoje.
DW África: O que é que se pode esperar depois de todo este processo judiciário que envolve Venâncio Mondlane e a liderança da RENAMO?
FT: Em primeiro lugar, é uma não tanto marginalização, mas um isolamento de Venâncio do ponto de vista do seu envolvimento nos processos políticos partidários dentro da RENAMO. Em segundo lugar, prevejo, caso ele vença essa batalha, que não possa estar na lista dos membros que poderão fazer parte da Assembleia da República para a próxima legislatura, o que vai levar com que ele volte a fazer o que ele fazia anteriormente, que é essencialmente vir atuar no espaço público por via de algum tipo de organização da sociedade civil, para mobilizar, engajar, dinamizar também a comunidade e, porque não, os cidadãos comuns como um todo.
DW África: Com que imagem ficará também Ossufo Momade, presidente da RENAMO, depois de todo esse barulho?
FT: Penso que o presidente Ossufo, a par de outros políticos moçambicanos, já nos provaram que não estão preocupados com a percepção pública sobre a maneira como gerem os partidos.
A grande preocupação dele não é sobre como as pessoas avaliam a sua pessoa, não é sobre o que as pessoas pensam sobre a sua pessoa, é sobre continuar a manter-se num corredor de discussão que lhe permita continuar a obter algumas benesses junto do partido que está no poder nesse momento. Por isso, mesmo que a decisão hoje no tribunal seja a favor ou contra Ossufo Momade, isso em nada vai mudar a sua visão sobre a maneira como tem de pensar a gestão do próprio partido.