Zimbabué diz adeus a Robert Mugabe
14 de setembro de 2019O caixão com os restos mortais de Mugabe chegou ao Estádio Nacional de Harare coberto por uma bandeira do Zimbábue e rodeado de militares de alta patente e parentes mais próximos, entre eles a viúva, Grace. Caminharam por um tapete vermelho até à estrutura montada no centro do estádio, onde foram feitos os discursos de homenagem.
Vários cortejos militares e civis desfilaram pelo estádio, o maior do país, com capacidade para 60 mil pessoas, entre os cânticos de milhares de cidadãos que assistiram ao funeral das bancadas. Apesar das lacunas nas bancadas terem sido visíveis - um sinal das dificuldades económicas e da escassez de combustível que muitos enfrentam neste país - os milhares de participantes cantaram, aplaudiram e assobiaram durante o ato.
"Hoje, pomos de lado as nossas diferenças e unimo-nos para recordar o passado e olhar para o futuro como uma nação orgulhosa, independente e livre", escreveu o Presidente Emmerson Mnangagwa na rede social Twitter.
"Tombou uma árvore gigante de África", disse o Presidente Emmerson Mnangagwa, que substituiu Mugabe em 2017 no discurso de abertura das cerimónias.
O histórico líder do Zimbabué, que governou o país com mão de ferro desde a independência e até ao golpe de Estado de 2017, morreu aos 95 anos a 6 de setembro em Singapura, onde estava hospitalizado desde abril.
Apesar de ter sido destituído do poder pelo Exército em 2017, Mugabe foi declarado Herói Nacional pelo seu ex-partido ZANU-PF, no mesmo dia da sua morte, e todos os oficiais seniores e da oposição estiveram presentes neste último adeus.
"Hoje o Zimbabué lamenta a morte de um grande filho da Terra, um visionário e defensor do nosso empoderamento", disse Mnangagwa, que trabalhou lado a lado com Mugabe desde os anos 1960 e que considera ter sido a pessoa que o "ensinou".
Os restos mortais foram transferidos na quarta-feira para Harare e, após vários dias de discussões entre a família e as autoridades, serão enterrados apenas em outubro, após a construção de um novo mausoléu no Acre dos Heróis Nacionais, um cemitério nos arredores da capital exclusivo para grandes nomes do país. Este domingo, o corpo seguirá para a terra natal de Mugabe, Zvimba, para as cerimónias fúnebres tradicionais.
Líderes africanos prestam homenagem
Além do atual Presidente do Zimbabué, participam na cerimónia 11 chefes de Estado africanos, entre eles os presidentes de África do Sul, Cyril Ramaphosa, do Quénia, Uhuru Kenyatta, e da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang Nguema, além de ex-líderes, diplomatas e altos cargos de todo o mundo.
Kenyatta descreveu Mugabe como "um grande ícone da libertação africana" e "um líder visionário e lutador incansácel pela dignidade africana".
Já a intervenção de Cyril Ramaphosa ficou marcada por vaias e assobios que obrigaram o Presidente sul-africano a interromper o seu discurso para pedir desculpa pela situação no seu país. A África do Sul está a braços com uma nova onda de violência xenófoba que já levou à morte de 12 pessoas e obrigou centenas de imigrantes a regressar ao seu país de origem.
"Estou aqui como africano a expressar o meu pesar e pedir desculpa pelo que aconteceu no nosso país", disse Ramaphosa, enquanto um dos organizadores do evento tentava acalmar a multidão.
Enterro envolto em controvérsia
O corpo de Mugabe será sepultado no Acre dos Heróis Nacionais dentro de 30 dias, após a construção de um novo mausoléu. Na sexta-feira (13.09), a família anunciou que aceitou que o ex-chefe de Estado seja sepultado no monumento dedicado aos "heróis da nação" em Harare, após vários dias de tensão entre as autoridades e a família, que preferiam que este fosse sepultado na sua aldeia natal.
Na quinta-feira, o familiares do antigo chefe de Estado tinham dito que Robert Mugabe seria enterrado no início da próxima semana na sua cidade, Zvimba, e não no monumento dedicado "aos heróis da nação", alegando que foi essa a vontade manifestada pelo ex-Presidente.
Robert Mugabe foi deposto em novembro de 2017 pelos militares do Zimbabué e pelo seu ex-aliado Emmerson Mnangagwa. Grace Mugabe e outros membros da família ainda têm ressentimentos relativamente a este facto, razão que aparentemente esteve na base da recusa inicial dos planos para a realização de um enterro de Estado para Robert Mugabe.
Logo após a morte de Robert Mugabe, o sobrinho e porta-voz Leo Mugabe disse que o ex-homem forte morreu como "um homem muito amargurado", porque se sentiu traído por Mnangagwa e pelos generais do exército, que eram seus aliados durante quase quatro décadas e até o colocarem em prisão domiciliária e o forçaram a renunciar ao cargo de Presidente do Zimbabué.
Foi o próprio ex-Presidente quem supervisionou a construção do Acre dos Heróis, onde será sepultado, um monumento executado pela Coreia do Norte, no topo de uma colina, exibindo uma grandiosa escultura imponente de guerrilheiros.