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A campanha eleitoral do esgotamento

Politikwissenschaftlerinnen Alessandra Costa und Raquel Novais da Silva
Alessandra Costa / Raquel Novais
23 de setembro de 2022

Cenário de 2022 é de intenções de voto cristalizadas, inabaláveis até mesmo com o uso de mídias digitais. Desfecho previsível evidencia ineficácia e esgotamento de estratégias de comunicação.

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Imagem na televisão mostra ex-presidente Lula, do PT, à esquerda, e presidente candidato à reeleição, Jair Bolsonaro, à direita, em debate
Embora tentem se apropriar da linguagem das redes e também investir em formatos tradicionais, estratégias de comunicação dos candidatos à Presidência, como Bolsonaro e Lula, não foram eficazes para alterar intenções cristalizadas de votosFoto: Carla Carniel/REUTERS

Façam suas apostas: o que as urnas trarão de surpresa dentro de poucos dias? A julgar pela estabilidade de preferências dos eleitores que os institutos de pesquisa têm mostrado, nada indica um desfecho repleto de emoções e reviravoltas, como os já vistos em eleições recentes.

O cenário de 2022 é de intenções de voto cristalizadas, que em muito pouco foram afetadas pelo início da campanha eleitoral para o cargo de presidente. Paira no ar a percepção de que um novo tempo confronta os candidatos e seus estrategistas de comunicação.

É possível considerar que se trata de um fenômeno conjuntural, mas o que a campanha eleitoral de 2022 tem reforçado é a ideia na qual há uma ressignificação na apropriação das mensagens que chegam ao eleitor. Seja pela via das mídias tradicionais e das atividades comuns a esse período (comícios, carreatas etc.) ou do mundo digital, fato é que as estratégias de comunicação não têm se mostrado bem-sucedidas desta vez.

A tendência de investimentos em publicidade observada nas eleições 2018 se manteve no atual pleito. O aporte financeiro em comunicação e marketing permanece em posição de destaque no cômputo geral dos gastos à corrida presidencial. A soma das despesas em mídia tradicional (propaganda em rádio, TV ou vídeo) e digital (impulsionamento de conteúdos) gira em torno de 50% do total de custos das campanhas, segundo dados do TSE.

Campanhas não alteram votos cristalizados

Considerando-se os quatro primeiros colocados nas pesquisas de intenção de voto, apenas a candidata Simone Tebet (MDB) foge a essa regra, com um padrão de investimentos em propaganda eleitoral pelas mídias tradicionais bastante inferior aos demais candidatos. Em contrapartida, aparece na liderança dos gastos em impulsionamento digital, com quase R$ 2,8 milhões investidos nessa atividade. A estratégia da candidata, contudo, também não tem se mostrado capaz de ultrapassar a cristalização das intenções de voto em seu favor.

Isso mostra que, via de regra, a maior parte dos investimentos de comunicação e marketing continua concentrada nos meios tradicionais – programas para TV e rádio no Horário Gratuito da Propaganda Eleitoral (HGPE), que têm, evidentemente, custos de produção muito mais altos.

Uma análise das diferentes plataformas digitais dos candidatos revela que a produção de vídeos para a TV é editada em pílulas para o TikTok, Instagram ou outros canais como Telegram e Whatsapp. Ou seja, todas as possibilidades de potencializar os conteúdos e estratificá-los para os diversos públicos estão em jogo.

Para se ter uma ideia, em 2018 foram aplicados recursos na ordem de R$ 6 milhões (valores atualizados pelo IGPM) no impulsionamento de conteúdos via redes sociais, somando-se as despesas dos quatro primeiros colocados na disputa presidencial.

O então candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, liderou esse ranking, com gastos superiores a R$3,6 milhões. Por sua vez, o candidato do PT naquele pleito, Fernando Haddad, não chegou a R$ 2 milhões, somando-se os dois turnos nos quais concorreu. Esse montante já foi ultrapassado na campanha atual de Lula, que declarou a cifra de quase R$ 2,3 milhões em impulsionamento digital até o momento.

A tão propagada publicidade digital de Bolsonaro no pleito de 2018 sequer aparece claramente em sua declaração de contas ao TSE – um valor inferior a R$ 200 mil foi apresentado como "criação e inclusão de páginas na internet”. Na campanha atual, o candidato à reeleição declarou pouco mais de R$ 500 mil dedicados a essa atividade. Isso em um contexto de elevado engajamento nas redes sociais, bastante superior ao número de seguidores de Lula, seu principal oponente, que se mantém na liderança das intenções de voto.

Mobilização por redes sociais não funciona em 2022

Considerando os investimentos, os esforços de comunicação e os números de seguidores e engajamento, tudo indica que a fórmula de mobilização via redes sociais, amplamente utilizada em 2018 por Bolsonaro, não está funcionando em 2022.

A estratégia atual do presidente-candidato, de aumentar a rejeição de Lula por meio de uma campanha negativa nos programas de TV do HGPE, também não está surtindo efeito, como mostra pesquisa Genial/Quaest divulgada essa semana (21/09).

Segundo o levantamento, quem assiste aos programas na TV vota muito mais em Lula do que em Bolsonaro. A rejeição ao candidato petista também não aumentou, "mesmo que aproximadamente 80% dos eleitores dele e de outros candidatos já tenham visto propagandas negativas contra o ex-presidente”, afirma a pesquisa.

Mas esse quadro não está restrito à campanha para a reeleição do atual presidente. O que chama a atenção nas estratégias adotadas por todos os candidatos é que alcançar o público fora da bolha das redes sociais por meio dos meios tradicionais de campanha eleitoral também não tem apresentado resultado capaz de alterar de forma significativa as preferências dos eleitores.

Por que está se falando tanto em voto nulo?

Esse cenário nem de perto se assemelha ao que foi observado em 2014, quando a disputa pelo segundo lugar se acomodou apenas na reta final do 1º turno, com o candidato do PSDB, Aécio Neves, virando o jogo e ultrapassando Marina Silva (Rede), que também oscilou na preferência do eleitorado ao longo da campanha.

Como também ocorreu em 2018, com variações significativas da posição ocupada pelos candidatos nas pesquisas de intenção de voto. O candidato do PT, Fernando Haddad, saiu do patamar de 4% (DataFolha, 22/08/2018) para 22% no final de setembro, segundo o mesmo Instituto, alcançando uma votação de 29,28% na primeira rodada, atrás do candidato Jair Bolsonaro, que obteve 46,03% dos votos.

"Lacração" e "feijão com arroz" não bastam

A experiência de 2022 ensina que os tempos mudaram, que o formato das campanhas caducou a ponto de se tornarem incapazes de alterar esse jogo estável que se distancia das competições eleitorais anteriores no período recente. O desafio do momento é pensar uma campanha que não apenas ocupe os meios tradicionais de comunicação e se aproprie da linguagem das redes, mas também garanta uma maior efetividade das mensagens e diferenciação dos candidatos e de suas propostas.

O contexto atual é de uma crise econômica, uma memória recente de uma trágica pandemia e de uma difusão de fake news, eventos que favorecem o desejo de mudanças por parte dos eleitores – "uma mudança de humor democrática", como mostra artigo recentemente publicado pelo PEX. 

Em caso de um segundo turno, será preciso repensar se "lacrar” nas redes e fazer o "feijão com arroz” nas mídias tradicionais serão suficientes para ocupar o Palácio do Planalto a partir de 1º de janeiro de 2023.

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Planaltices é uma coluna semanal sobre política brasileira. Os textos são escritos por colaboradores do grupo de pesquisa PEX (Executives, presidents and cabinet politics), vinculado ao Centro de Estudos Legislativos (CEL) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Coordenada pela cientista política e professora da UFMG Magna Inácio, a coluna é publicada simultaneamente pela DW Brasil e repercutida no blog do PEX

Alessandra Costa é mestre e doutora em Ciência Política, jornalista e pesquisadora do PEX (CEL-UFMG)

Raquel Novais é doutora em Ciência Política, jornalista, pesquisadora do PEX (CEL-UFMG) e faz parte da Red de Politólogas

O texto reflete a opinião das autoras, não necessariamente a da DW.

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Esta coluna é uma parceria da DW Brasil com o PEX, núcleo de estudos sobre presidencialismo institucional da UFMG e capitaneado por Magna Inácio.