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A menos de 100 dias para Copa, Recife tem grandes desafios de mobilidade

Fernando Caulyt / Jessie Serrão1 de abril de 2014

Com várias obras de mobilidade urbana atrasadas, cidade poderá repetir problemas enfrentados durante Copa das Confederações. Mesmo inaugurada em agosto de 2013, governo ainda não sabe custo final da Arena Pernambuco.

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Foto: D.Garcia/AFP/GettyImages

"O trânsito atrapalhou muito. Demorar uma hora e meia para ir e uma hora e meia para voltar não estava nos nossos planos. É muito desgastante", disse o zagueiro uruguaio Diego Lugano durante a Copa das Confederações em Recife, em junho de 2013. Na época, os problemas de mobilidade da cidade ganharam destaque negativo e expuseram a falta de estrutura e de organização da capital pernambucana para receber o Mundial.

Mesmo alguns meses após a Copa das Confederações, que foi considerada um grande evento teste, a cidade continua com graves problemas de mobilidade urbana. Algumas das principais obras necessárias para facilitar quem quer assistir aos jogos ou se locomover durante a Copa do Mundo estão atrasadas, em média, um ano.

Entre as obras atrasadas – e que poderão até mesmo não ficar prontas até o Mundial –, estão o Corredor Via Mangue – via expressa para o tráfego de veículos; o Terminal Integrado Cosme e Damião – estação de metrô ligando as linhas Centro e Sul; e o corredor rápido de ônibus (BRT) Norte-Sul.

"Eles conseguiram piorar o que já era ruim", afirma Andréa Luna, da ONG Copa Favela 2014. "A cidade é um canteiro de obras e não há preocupação com os pedestres. Isso sem falar no engarrafamento. Para se ter ideia, um local que se atingia em meia hora, hoje se precisa de duas horas."

Obras atrasadas e famílias removidas

O coordenador do Comitê Popular da Copa de Recife, Rudrigo Rafael, afirma que os problemas são "inúmeros". Ele diz que as cidades de Recife; Camaragibe – entre a capital e onde fica o estádio; e São Lourenço da Mata – onde está localizado o estádio – viraram canteiro de obras atrasadas que tornaram a mobilidade, descrita como legado, um verdadeiro caos.

"Tais obras geraram mais de 2 mil famílias removidas, grande parte delas com indenizações injustas. Muitas delas foram expulsas de casa sem receber o valor estabelecido", afirma Rafael. "A condição delas é semelhante à de refugiados, sem apoio do governo e obrigadas a refazerem suas vidas coabitando a casa de familiares ou alugando outras casas, sem condições de assumirem tais despesas."

Stadien Fußball WM 2014 Brasilien Arena Pernambuco
Arena Pernambuco se localiza a cerca de 22km da capitalFoto: picture-alliance/AP

Ele diz, ainda, que a Cidade da Copa – empreendimento orçado em 1,6 bilhão de reais que, localizado no entorno da Arena Pernambuco, contará com conjuntos habitacionais, centros comerciais e hotéis – não dialogará com a cidade já existente, a não ser no sentido de concentrar ainda mais os investimentos e reproduzir as desigualdades que marcam o país. Além disso, o estádio se localiza a 22 quilômetros da capital.

"Em síntese, a Copa está longe do povo, seja do ponto de vista social (por representar a elitização do futebol e pelos altos preços dos ingressos), político (pelo fato de a população não ter sido ouvida e ao mesmo tempo muitos direitos lhe serem negados), mas também geograficamente, por acontecer longe da capital e deslocada no próprio município de São Lourenço", afirma Rafael em entrevista à DW.

De positivo para a cidade, a Copa, segundo ele, não deixará um grande legado. Rafael aponta a tímida modernização na mobilidade urbana com a implantação do BRT que, segundo ele, não vai alterar a lógica de precariedade dos serviços de transporte público na cidade.

"Isso porque já existem faixas exclusivas de ônibus nas áreas cobertas pelo BRT e as demais obras continuam privilegiando o transporte motorizado individual", diz Rafael.

Mas, mesmo com vários problemas em relação à mobilidade urbana, Recife e outras cidades-sede poderão "driblar" os grandes congestionamentos e estações de ônibus e metrô abarrotadas, já que deverão decretar feriado nos dias de jogos para minimizar os problemas de trânsito.

A Procuradoria Geral do Estado de Pernambuco (PGE-PE) informou que os valores das indenizações pagas pelo Estado nas desapropriações para implementação das obras da Copa do Mundo seguem todas as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) quanto ao cálculo dos valores ofertados.

"Ressaltamos que 65% das desapropriações das obras da Copa foram por processo administrativo, o que demonstra que os valores das indenizações foram aceitos como justos pela maioria dos expropriados", afirmou Francisco Luiz Viana Nogueira, um dos procuradores do Estado.

Ele disse também que nas desapropriações judiciais – que representam apenas 35% das desapropriações promovidas pelo Estado –, o preço justo é definido pelo Poder Judiciário, que através da perícia judicial realizada por perito especializado indicado pelo juiz competente determina, subsidiado nos dados apresentados, o valor que deve ser considerado como justo.

A DW enviou questões sobre mobilidade urbana à Secretaria Extraordinária da Copa em Pernambuco (Secopa-PE), porém, o órgão não enviou resposta até o fechamento da matéria.

Estádio ainda não tem preço final

A Arena Pernambuco foi inaugurada em 20 de maio de 2013 pela presidente Dilma Rousseff e foi o último estádio a ficar pronto para a Copa das Confederações. Mesmo assim, a menos de 100 dias para o pontapé inicial do Mundial, o custo final do empreendimento aos cofres públicos ainda é um mistério.

Brasilianische Präsidentin Dilma Rousseff im Stadion in Recife
Dilma inaugurou Arena Pernambuco em maio de 2013: custo do estádio ainda não foi fechadoFoto: picture-alliance/dpa

Inicialmente com um custo de 532 milhões de reais, o estádio pode ter ultrapassado o montante de 650 milhões de reais. De acordo com a Gerência de Comunicação da Secretaria, em resposta a questionamento da DW no final de fevereiro deste ano, a conta não foi fechada por se tratar de uma Parceria Público-Privada (PPP).

"Além desses custos diretos da obra, não se pode deixar de considerar o valor de 4 milhões de reais ao ano de repasse do Governo do Estado para a manutenção e a complementação da arrecadação paga pelo Estado caso a meta de 72 milhões de reais ao ano não seja atingida durante os próximos 30 anos", afirma Rafael. "Então se pode dizer que, no mínimo, a Arena custará 770 milhões de reais pagos pelos contribuintes."

A cidade de Recife foi a primeira das 12 sedes a cancelar a Fan Fest – que é um dos compromissos das sedes junto com a Fifa para receber jogos da Copa. O evento, que reúne torcedores em vários locais da cidade para assistir aos jogos por telões durante o Mundial, iria acontecer numa estrutura montada no Marco Zero, na parte antiga da cidade.

De acordo com assessoria de imprensa da Secretaria Municipal de Esportes e Copa do Mundo, a prefeitura não vai investir recursos públicos na realização do evento. Mesmo assim, a Fan Fest poderá acontecer, inclusive com o apoio do município, caso seja financiado pela iniciativa privada, como deverá acontecer em outras cidades-sede.

"No Recife, por iniciativa da atual gestão, o orçamento inicial de 20 milhões de reais já havia sido reduzido para cerca de 11 milhões de reais", afirmou a prefeitura em nota. "Não temos nenhuma posição oficial da Fifa sobre o assunto e a decisão está mantida."