A difícil busca por um presidente
19 de fevereiro de 2012Os "Dias Loucos" costumam ser uma época relativamente apolítica na Alemanha. Conforme a região, festeja-se Karneval, Fastnacht ou Fasching, outros aproveitam a quase uma semana entre a Quinta-Feira das Mulheres e a Terça-Feira Gorda para tirar uma folga e simplesmente relaxar.
Mas em 2012 tudo está diferente. Após a renúncia do presidente Christian Wulff, os primeiros escalões da política nacional já se encontram em Berlim, e trabalhando a pleno vapor. É preciso encontrar um novo – ou nova – chefe de Estado. O tempo urge, pois a Lei Fundamental alemã prevê um prazo de apenas 30 dias para que se convoque a Assembleia Federal (Bundesversammlung).
Em princípio, qualquer alemão que tenha completado 40 anos de idade pode ocupar o mais alto cargo estatal, só necessitando ser eleito pela maioria da Assembleia Federal. Esta é composta por 620 deputados federais, além de 620 delegados, enviados pelos parlamentos estaduais. Do ponto de vista puramente numérico, os partidos da coalizão de governo – democrata-cristãos (CDU/CSU) e liberal-democratas (FDP) – contam com a maioria no órgão constitucional, embora reduzida. Desse modo, a eleição do candidato é um assunto de alta carga política.
Primeira opção: indisponível
A chefe de governo Angela Merkel, que também é presidente da União Democrata Cristã (CDU), não perdeu tempo: na própria sexta-feira (17/02), poucas horas após a renúncia de Wulff, ela se reuniu com os líderes da União Social Cristã (CSU) e Partido Liberal Democrático (FDP), na busca por um candidato adequado.
Às 9h30 do sábado, as deliberações prosseguiram, reforçadas pelos chefes de bancada da coalizão. E fato de todos os participantes – exceto Merkel e o líder da bancada da CDU no Bundestag (câmara baixa do Parlamento), Volker Kauder – terem deixado a Chancelaria Federal apenas duas horas mais tarde foi interpretado como um sinal de que a coalizão chegara a um consenso.
Mas as aparências enganavam: logo no início da tarde, o presumível candidato, Andreas Vosskuhle, presidente do Tribunal Constitucional alemão, divulgou que não estaria disponível. Em reação, Kauder alegou ainda haver necessidade de esclarecimentos dentro da coligação governamental. "Só quando essas conversações estiverem concluídas, nós nos dirigiremos à oposição."
"Diálogo" unilateral?
A declaração irritou os partidos Verde e Social Democrata. Eles exigem que se tome ao pé da letra a promessa – feita pela chanceler federal imediatamente após a renúncia de Christian Wulff – de que o novo presidente seria um candidato apoiado por todos os partidos.
Segundo o líder da bancada social-democrata no Bundestag, Frank-Walter Steinmeier, a coalizão está no caminho errado, se agora pretende definir internamente seu candidato, só deixando à oposição a opção de dar seu "sim" ou "não". "Só poderemos chegar a um candidato comum se, desde o início, houver um diálogo aberto sobre as pessoas que entram em questão", observou.
Quanto à identidade dessas pessoas, Steinmeier prefere manter-se calado – da mesma forma que os líderes do SPD, Sigmar Gabriel, e do Partido Verde, Renate Künast, ou o líder da bancada parlamentar verde, Cem Özdemir. Nas palavras de Künast: "É sempre sensato ter dois, três, quatro nomes na cabeça e considerá-los no fundo do coração, mas sem ficar falando sobre eles, devido ao perigo de que se seja ouvido".
Portanto: se a intenção é manter um diálogo aberto com o governo, então faz sentido manter sigilo no nível público. Porém nem SPD nem verdes escondem que consideram Joachim Gauck adequado ao cargo de mais alto representante do Estado alemão. Afinal, o ex-ativista dos direitos civis na Alemanha comunista, de 72 anos de idade, e primeiro diretor dos arquivos da Stasi, o serviço secreto da RDA, foi o candidato da oposição para a presidência alemã em 2010.
Democracia para alguns
Gabriel, Steinmeier, Künast e Özdemir convocaram uma coletiva de imprensa no sábado, na central do SPD. Um sinal de que social-democratas e verdes estão alinhados na busca por um novo presidente. Mas também um sinal de que ambos os partidos estão conscientes de seu significado político, diante da apertadíssima maioria com que a coalizão governamental conta na Assembleia Federal.
Como acentuou Sigmar Gabriel: "Estamos dispostos a todo tipo de conversa. Mas, por outro lado, nossa convicção é de que [o candidato] não pode ser um membro ativo do gabinete e, se possível, tampouco ser político ativo de um partido. Pois isso seria difícil de coadunar com a ideia de um candidato suprapartidário".
Ainda é incerto quando tempo a escolha dos candidatos deverá durar. Como observou Renate Künast, a questão não é apenas procurar um candidato, mas, sobretudo, encontrar um. E Gabriel complementa, afirmando que "neste caso, a qualidade é mais importante do que a rapidez".
Por telefone, a Chancelaria Federal comunicou à oposição que uma primeira conversa suprapartidária sobre a questão está marcada para a noite deste domingo. Porém "suprapartidária" não significa que todos os partidos representados no Bundestag estejam convidados: o governo Merkel não quer conversa com o partido A Esquerda.
O líder da bancada parlamentar da agremiação, Gregor Gysi, considera o fato "extremamente antidemocrático". Gysi argumentou que, ao excluir A Esquerda da procura por um novo presidente, Merkel simplesmente ignora 5 milhões de pessoas que optaram pelo partido nas eleições parlamentares de 2009, e assim comete, segundo ele, mais um erro na indicação de um candidato para o mais alto cargo estatal da Alemanha.
Autoria: Sabine Kinkartz (av)
Revisão: Marcio Damasceno