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Autores pedem retratação de estudo sobre cloroquina

5 de junho de 2020

Após "The Lancet" levantar suspeitas sobre estudo que suspendeu pesquisas com o fármaco, autores dizem que não é possível garantir veracidade de dados utilizados. Com pedido, revista cancela validade da publicação.

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Embalagens de hidroxicloroquina
A cloroquina e hidroxicloroquina vêm sendo promovidas por líderes como Donald Trump e Jair BolsonaroFoto: picture-alliance/dpa/Zuma/Quad-City Times/K. E. Schmidt

Três dos quatro autores de um estudo alvo de críticas sobre a cloroquina e hidroxicloroquina no tratamento da covid-19 publicado pela revista científica The Lancet pediram nesta quinta-feira (04/06) a retratação da publicação. Eles argumentaram que não é possível garantir a veracidade dos dados utilizados. Com o pedido, a revista cancelou a validade do artigo.

O pedido de retratação foi apresentado após a The Lancet ter colocado em dúvida o estudo publicado em 22 de maio e anunciado que estava fazendo uma auditoria independente sobre os dados utilizados. A publicação, numa das revistas científicas mais renomadas do mundo, levou à suspensão de ensaios clínicos de hidroxicloroquina e cloroquina em todo o mundo, pois a pesquisa apontava que os medicamentos não seriam benéficos para pacientes hospitalizados com covid-19 e poderiam até ser prejudiciais.

Em nota, a The Lancet diz que os autores pediram a retirada do estudo por não conseguirem "completar uma auditoria independente dos dados que sustentam sua análise" e, desta maneira, concluíram que não podiam mais assegurar a veracidade das fontes. 

"Há muitas questões pendentes sobre a empresa Surgisphere e os dados que supostamente foram incluídos neste estudo", acrescentou a revista.

Os três autores são Mandeep Mehra, do Hospital Brigham de Boston, nos Estados Unidos, Frank Ruschitzka, do Hospital Universitário de Zurique, na Suíça, e Amit Patel, da Universidade de Utah, também nos Estados Unidos. O quarto autor é Sapan Desai, o presidente da Surgisphere. Ele não quis comentar o caso.

O estudo se baseia em dados de 96 mil pacientes hospitalizados entre 20 de dezembro e 14 de abril em 671 hospitais e compara a condição dos doentes que receberam tratamento com cloroquina ou hidroxicloroquina (cerca de 15 mil) com os que não receberam.

Os dados usados são da empresa Surgisphere, que se apresenta como uma empresa de análise de dados em saúde com sede nos Estados Unidos. O jornal britânico The Guardian colocou em dúvida a idoneidade da empresa, que tem apenas uma meia dúzia de funcionários, que aparentam ter pouca experiência científica, e pequena presença online. O dono da Surgisphere, Sapan Desai, é um dos autores do estudo.

Os autores do estudo dizem "não terem conseguido confirmar o benefício da hidroxicloroquina ou da cloroquina" nos doentes analisados, apontando um acréscimo de efeitos adversos potencialmente graves, incluindo "um aumento da mortalidade", durante a hospitalização de doentes com covid-19.

Após a publicação, a Organização Mundial da Saúde (OMS) suspendeu temporariamente, por precaução, o uso dos medicamentos, empregados há décadas contra a malária, em pesquisas por ela coordenadas em 35 países. Depois de uma análise interna sobre a segurança dos fármacos, a OMS retomou o estudo com mais de 3,5 mil pacientes.

Muitos investigadores expressaram dúvidas sobre o trabalho, incluindo alguns cientistas céticos sobre o benefício da hidroxicloroquina contra a covid-19.

Numa carta aberta divulgada na semana passada, dezenas de cientistas expressaram preocupação com o trabalho e disseram que um exame detalhado levantou questões de metodologia e de integridade dos dados, apontando a recusa dos autores em dar acesso total aos dados e a falta de "revisão ética".

A hidroxicloroquina, normalmente utilizada no tratamento contra a artrite, vinha sendo alardeada pelo presidente americano, Donald Trump, como benéfica no combate à doença. Trump, inclusive, chegou a afirmar que estava se tratando preventivamente com o medicamento.

Seguindo o exemplo de Trump, o presidente Jair Bolsonaro passou a defender o uso da cloroquina como sendo eficaz no combate à doença, apesar de não haver comprovação científica da eficácia do medicamento em pacientes com covid-19.

A insistência de Bolsonaro em ampliar o uso da cloroquina foi um dos motivos de divergência que levou à demissão do ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, e menos de um mês depois de seu sucessor, Nelson Teich.

CN/rtr/afp/ap

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