1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Zé do Rock

Carlos Albuquerque2 de fevereiro de 2007

O Brasil tem uma cidade chamada Schroeder. Munique tem uma rua chamada Dom Pedro, que lá financiou um orfanato. DW-WORLD conversou com o diretor Zé do Rock, que está lançando seu novo filme "Brasilien fica na Alemanha".

https://p.dw.com/p/9nZY
Frida e Fritz, em Nova Petrópolis, também aparecem no filme de Zé do RockFoto: Zé do Rock
Zé do Rock Regisseur von Schroeder liegt in Brasilin
Zé do RockFoto: Zé do Rock

Depois de viajar 13 anos pelo mundo de carona e se estabelecer na Alemanha, o escritor e cineasta Zé do Rock tornou-se um importante personagem no diálogo cultural Brasil-Alemanha.

DW-WORLD conversou com o carismático gaúcho, que está lançando seu novo filme Brasilien fica na Alemanha, um documentário-comédia que confere os preconceitos mútuos.

DW-WORLD: Você é hoje um importante personagem no diálogo cultural Brasil-Alemanha e está lançando um novo filme, cujo título em português é Brasilien fica na Alemanha e, em alemão, Schroeder liegt in Brasilien (Schroeder fica no Brasil). Qual o tema do seu novo filme?

Zé do Rock: O tema são os clichês que os alemães têm sobre o Brasil e si mesmos, como também os clichês dos brasileiros sobre os alemães e sobre si mesmos.

O ministro brasileiro da Cultura, Gilberto Gil, declarou que o clichê teria um lado positivo de possibilitar um primeiro contato entre duas culturas. Qual o ganho com a sua quebra?

Filmszene Schroeder liegt ein Brasilin
A Alemanha pouco sabe dos brasileiros alemãesFoto: Zé do Rock

Grande parte do nosso conhecimento é baseada no clichê, no ouvir falar. O clichê básico sobre o Brasil é a pobreza e a alegria de viver. Quando saí pelo mundo afora, reparei que o clichê, principalmente o da pobreza, era exagerado demais. Isto começou a me incomodar. O contrário também começou a me irritar, que o brasileiro é sempre bem-humorado e vive dançando.

Moro na Alemanha, um país onde há também há muito clichê sobre ele. Quando o filme mostra alemão pobre, mas bem-humorado e brasileiro com muito dinheiro, mas que vive reclamando, as pessoas começam a rir. Você pode ir ao Sri Lanka, Tanzânia ou Indonésia e contar esta história que eles vão dizer: "No, no, mister, it's the opposite" [Não, não senhor, é o contrário!].

Você já publicou livros escritos em Ultradoitsh, Wunschdeutsch, Siegfriedisch e Kauderdeutsch, um deles também em brasileis – línguas com regras gramaticais e ortográficas próprias, criadas por você. Que histórias contam e que línguas são estas?

Meu primeiro livro Zé do Rock, o erói sem nem um agá, escrito em Ultradoitsh e brazileis, é sobre minha volta ao mundo de carona por 13 anos, visitando 119 países. Ultradoitsh é um alemão simplificado, sem declinação, etc. Alemão é uma língua difícil. Como diz um dos meus entrevistados no filme, "a vida é curta demais para se aprender alemão".

O segundo livro, Disco voador na cozinha, é uma ficção-científica autobiográfica escrita em Wunschdeutsch (alemão ideal). Em mais de 350 shows literários que fiz, pedi ao público para votar que ortografia queria para certas palavras, daí surgiu o Wunschdeutsch.

Meu terceiro livro, Deutsch gutt – sonst Geld zurück (bom alemão ou dinheiro de volta), é uma coletânea de histórias verdadeiras e fictícias. O tema são as duas línguas que apresento, o Siegfriedisch, um alemão puramente germânico, e o seu oposto, o Kauderdeutsch, um alemão internacional, que deverá ser o alemão falado daqui a 50 anos, se houver ainda alemão.

Você acha que a língua pode ser uma expressão de individualidade?

A língua sempre vai ser uma expressão de individualidade, todo mundo tem uma língua própria, um vocabulário próprio.

Você tem origens lituanas, alemãs e russas e já visitou 119 países. Você concorda com a frase: minha pátria é minha língua?

Filmszene Schroeder liegt in Brasilin
Outro clichê é que no Brasil, tudo é grande, até morangoFoto: Zé do Rock

A língua sempre foi o fator de identificação de um povo. No meu caso, entretanto, eu não diria que minha pátria é minha língua. O português é a língua que falo com menos erros, mas por estar longe do Brasil, o vocabulário vai se reduzindo. Lido com várias línguas. Não posso dizer que minha pátria é minha língua porque estou sempre viajando. É o que está escrito no meu cartão de visita: "Zé do Rock, turista".

Fala-se de um certo desinteresse por temas latino-americanos por parte da Europa, cujo foco estaria agora voltado para os países do Leste europeu e Ásia. Você acha que isto também se espelha nas relações Brasil-Alemanha?

Este é um ponto que meu filme também trabalha, mostrando que existem muito mais semelhanças e conexões entre os dois países do que se imagina. A Alemanha associa os alemães do Brasil com o nazismo, muito pouco alemão sabe que depois do índio, português e do negro, o alemão foi o próximo povo que chegou ao Brasil.

Você acha que a emigração alemã para o Brasil ainda é pouco conhecida na Alemanha?

Filmszene Schroeder liegt in Brasilin
Zé do Rock mostra garoto tipicamente brasileiroFoto: Zé do Rock

A emigração alemã para o Brasil é pouquíssimo conhecida na Alemanha. Os alemães não sabem que esta emigração começou há 200 anos. São coisas que eu gosto de informar. No filme, há também uma entrevista com um veterano da Segunda Guerra, brasileiro, que lutou contra a Alemanha e mora em Schroeder, a cidade de Santa Catarina que deu origem ao nome do filme em alemão.

Eu perguntei como se chamavam seus companheiros de guerra. Ele me disse: "Tinha o Reinhold Schneider, o Viktor Hass". Todos tinham nome alemão, mas eram brasileiros, o que os alemães não sabem.

Como é a reação dos imigrantes alemães em relação à Alemanha no Brasil?

No Brasil, há o clichê de que o brasileiro de origem alemã é alemão. Há brasileiro alto, magro, etc., e há brasileiro alemão. Brasileiro é o substantivo, alemão é um adjetivo. Ele não é alemão, é brasileiro. Como diz um candidato a prefeito de Schroeder, que entrevistei. "Quando o Brasil joga com a Alemanha, quero que o Brasil ganhe, mas que seja só de 1 a 0".

Quando vamos poder ver o seu novo filme?

Estou procurando uma distribuidora, o que não está sendo fácil. Eles falam que é um tema muito específico, que só interessaria a um público teuto-brasileiro. Se fôssemos seguir esta lógica, um filme faroeste-comédia como O Tesouro de Manitou, o maior sucesso da história do cinema alemão, que tinha um índio homossexual entre os personagens principais, só interessaria a um público gay ou público índio. Não existe tema pouco ou muito interessante, existe filme bem ou malfeito, que diverte ou não, e este filme diverte.