Caso Snowden expõe influência dos EUA sobre governos europeus
6 de julho de 2013Edward Snowden segue procurando um país que lhe dê abrigo, enquanto os Estados Unidos continuam em sua caça e ameaçam impor-lhe uma pesada pena. O delator apresentou 21 pedidos de asilo: alguns Estados ainda não se pronunciaram (o Brasil "não tenciona responder") e há sinais positivos partindo de Venezuela e Bolívia. De resto, predominam as recusas, justificadas geralmente com alegações formais.
Também a Alemanha indeferiu o pedido do ex-consultor da CIA, para indignação de alguns políticos de oposição, que acusaram o governo alemão de hipocrisia. Mas Berlim não é o único a esquivar-se de um conflito com os EUA. Na terça-feira (02/07), Paris e Lisboa negaram ao avião do presidente boliviano, Evo Morales, o acesso a seus respectivos espaços aéreos, devido à suspeita de que Snowden estivesse a bordo.
É difícil comprovar se os EUA exerceram pressão direta sobre os países europeus envolvidos. Para o analista político Christian Lammert, do Instituto John Kennedy da Universidade Livre de Berlim, pode se tratar de uma forma de "obediência preventiva".
Um motivo possível é que a cooperação entre os serviços secretos está funcionando bem na política de segurança – alguns atentados puderam ser evitados, aparentemente graças a informações da inteligência americana. Ou seja: a Alemanha e outros países europeus se beneficiam das atividades de vigilância da Agência Nacional de Segurança dos EUA (NSA, na sigla em inglês) – o foco das denúncias de Snowden – e similares.
Princípios versus pragmatismo
Além disso, estão prestes a ser iniciadas as negociações sobre uma zona de livre comércio entre a União Europeia e os EUA. Com a queda das tarifas alfandegárias, a UE espera poupar dezenas de bilhões de euros. Ambos os parceiros apostam que haverá crescimento econômico e mais postos de trabalho. "Por isso, não é hora de perturbar o clima político ", diz Lammert.
A política de segurança conjunta, os interesses políticos e o combate à crise financeira é o que estará em jogo se forem tomadas medidas contra os EUA no caso Snowden, avalia o historiador Detlef Junker, da Universidade de Heidelberg. Os governos da Europa têm que considerar muito bem se vale a pena arriscar tudo isso num conflito de princípios contra os americanos.
Além disso, no caso, por exemplo, da Alemanha, não está bem claro quão surpreendentes para a política nacional foram, de fato, as revelações sobre a espionagem em grande escala praticada pela NSA.
Lammert, pelo menos, considera pura estratégia eleitoral o apelo de alguns políticos alemães para que o país dê asilo a Edward Snowden – em setembro a Alemanha elege seu novo Parlamento.
Poderio militar
Independente de os países europeus terem sido ou não submetidos à pressão direta por Washington, continua sendo parte integrante da autoimagem dos Estados Unidos acreditar na própria capacidade de influenciar outras nações, comenta Junker, também especialista em assuntos americanos.
Para isso, os EUA se apoiam em sua força militar. Após a Segunda Guerra Mundial, o país se tornou uma potência. "Hoje é responsável por quase metade dos gastos militares mundiais; dispõe de cerca de mil bases – em parte secretas – espalhadas pelo globo; e está a apta a atacar qualquer ponto da Terra num espaço de 20 minutos", lembra o especialista.
Além disso, trata-se de uma potência militar que, com o fim da Guerra Fria, se impôs a missão de impedir que um poder hegemônico de outro continente coloque em risco a posição americana como líder global. Junker lembra que exercer força militar "segue sendo, como sempre, um instrumento da política externa" – embora isso não se aplique à Europa.
Mas a questão é se os EUA ainda são capazes de manter tais pretensões de hegemonia, diante de seus próprios problemas políticos internos e da concorrência crescente da Ásia.
Junker registra alguns indícios de que o país continuará poderoso: sua liderança no setor de tecnologia da informação; seus esforços para se tornar independente dos combustíveis fósseis da Arábia Saudita, por exemplo, através das próprias reservas de petróleo e gás natural; assim como a força do dólar. "Estes são indicadores de que os EUA manterão sua posição", afirma o historiador.