Esquerda
30 de janeiro de 2008Para a formação de governo no estado de Hessen, após as recentes eleições, uma coligação entre a social-democracia e o Partido A Esquerda seria a solução perfeita para formar a maioria de cadeiras no parlamento estadual, necessária para que a candidata social-democrata, Andrea Ypsilanti, seja eleita para o cargo de governadora. No entanto, Ypsilanti se recusa a coligar com os esquerdistas. Não importa de que nuance ideológica, fato é que ninguém se diz apto a coligar com o Partido A Esquerda.
Para muitos alemães do Oeste do país, a facção continua soando como uma relíquia da antiga Alemanha Oriental, de regime comunista, lembra Tim Spier, cientista político do Instituto de Direito Partidário e Pesquisa sobre Partidos Políticos, da Universidade de Düsseldorf.
"É preciso dizer que, na Alemanha, parte da esquerda é remanescente do PDS, o que implica em resquícios do SED [partido único da antiga Alemanha Oriental]. Para os alemães do Oeste, esse é um grande empecilho para aceitar o partido", diz Spier.
A esquerda na Europa
Em outros países europeus, por outro lado, os partidos à esquerda da social-democracia já fazem há muito tempo parte do jogo político: na França, Suécia e Itália, por exemplo, as facções de esquerda já participaram, inclusive, de coligações a nível federal. "Nos anos 1970, houve, por muito tempo, muitos partidos comunistas tradicionais, que eram, de longe, mais bem-sucedidos que outras facções. Um desses exemplos é a França", observa Spier.
Os partidos de esquerda na Europa Ocidental surgiram em contextos diferentes e possuem raízes históricas diversas. "Mesmo assim, eles podem ser agrupados numa única família partidária", diz o analista. Grande parte desses partidos esquerdistas foram, no passado, comunistas, tendo passado por mudanças após o fim da Guerra Fria.
Outros distanciaram-se anteriormente do comunismo, formando, em parte, pequenos grupos maoístas, para depois se transformarem em facções de esquerda mais convencionais. Um exemplo deste caso são os socialistas na Holanda, hoje um partido grande e em alta na cotação do eleitorado. Também na Escandinávia é comum a coligação dos partidos de esquerda, que se denominam socialistas, com os Verdes. Embora socialistas no nome, essas facções no norte da Europa defendem, via de regra, temas ligados à ecologia.
Exemplo de sucesso: Países Baixos
O partido de esquerda mais bem-sucedido em toda a Europa é o Socialistische Partij, na Holanda. "Eles conseguiram 16,6% nas últimas eleições parlamentares", lembra o especialsita Spier.
A esquerda escandinava também, por sua vez, não pode ser subestimada, com seu considerável potencial de 10% do eleitorado, como é o caso do dinamarquês Socialistik Folkeparti, do norueguês Sozialistik Venstreparti, do sueco Vänsterpartiet e do finlandês Vasemmistliitto. Todos esses quatro partidos, explica Spier, dizem-se de esquerda, mas defendem, acima de tudo, um programa de governo social-ecológico.
Mudança de cenário
Na Alemanha, não existiu, por longo tempo, nenhum partido à esqueda dos social-democratas e, mais tarde, dos Verdes. O Partido Comunista Alemão (KPD), uma das facções fortes da República de Weimar (1919-1933), acabou sendo proibido nos anos 1950.
Mais tarde, o partido foi novamente fundado sob a sigla DKP, que nunca conseguiu ser mais do que uma facção de pequenas proporções no país. Somente a partir da reunificação alemã e com a transformação do SED (antigo partido único da Alemanha de regime comunista) em PDS, é que surgiu no país uma facção à esquerda dos social-democratas. Em nível nacional, o partido só se tornou realmente conhecido a partir de 2005.
A esquerda em movimento
Na verdade, os esquerdistas devem sua prosperidade, em toda a Europa, aos social-democratas: mais exatamente àquilo que Tony Blair chamava de New Labour e Gerhard Schröder de Neue Mitte, ou seja, ao distanciamento da social-democracia de uma política tradicional trabalhista.
"Os social-democratas que se mantiveram tradicionais, como foi o caso na França, conseguiram marginalizar os partidos de esquerda", comenta Spier. Já os social-democratas que se mostraram abertos a reformas, como aconteceu na Holanda, Dinamarca e Alemanha, acabaram perdendo seus eleitores tradicionais para a esquerda.
Experiências com coligações
Algumas dessas facções de esquerda já participaram de governos federais na Europa, como ocorreu na França, Suécia, Itália e recentemente na Noruega. Em poucos casos, porém, as coligações foram um exemplo de cooperação partidária bem-sucedida.
Na Suécia, o Partido Social Democrata (SAP) formou uma coalizão de governo com os Verdes e com o Partido de Esquerda. Uma aproximação que custou ao Partido de Esquerda boa parte de seu eleitorado.
"Não nos arrependemos da coligação, pudemos dar vazão a algumas de nossas visões políticas, mas não fizemos uma boa experiência com essa coalizão de governo", diz Gudrun Utas, do partido sueco Vänsterpartiet. Depois de quatro anos no governo, o partido caiu na escala de preferência do eleitorado, angariando apenas 5% dos votos. Um índice muito baixo, principalmente se comparado aos 12,8% do ano de 1998.
Dilema dos populistas?
"Isso é um dilema. Primeiramente, a esquerda levou, na Suécia, vantagem com as posições de centro dos social-democratas. Quando o partido passou a assumir responsabilidades no governo, perdeu sua aura mágica e muitos votos", observa Spier. Ao mesmo tempo, os social-democratas conseguiram, através da proximidade com os parceiros de esquerda, a maioria necessária para poder governar.
Partindo deste princípio, a candidata social-democrata Andrea Ypsilanti, na Alemanha, deveria trazer o Partido A Esquerda para o seu lado. Pois, desta forma, é possível que os social-democratas conseguissem, nas próximas eleições, atingir uma larga maioria sem precisar da coligação com a esquerda.