Exposição fala do trabalho ao redor do mundo
3 de março de 2015Como o trabalho está representado nas imagens que vemos na televisão, no cinema ou na internet? Em cartaz na Casa das Culturas do Mundo (HKW), em Berlim, a exposição Eine Einstellung zur Arbeit (Uma forma de ver o trabalho, em tradução livre) cria uma espécie de enciclopédia do trabalho ao redor do mundo através de filmes curtos, feitos em apenas um plano.
Partindo do pressuposto de que imagens geram reflexão, a artista visual Antje Ehmann e o cineasta Harum Farocki (1944-2014) se inspiraram no clássico Trabalhadores saindo da fábrica (1895), dos irmãos Lumière, para construir uma série de filmes, sem cortes e de no máximo dois minutos, que mostra a realidade dos trabalhadores em várias partes do mundo.
A contemplativa obra dos irmãos Lumière mostra os operários saindo da fábrica em sincronia, e com isso revela as condições trabalhistas e a situação estrutural da sociedade no final do século 19.
Antje Ehmann e Harum Farocki quiseram trazer esta reflexão para a atualidade. "Em parceria com o Instituto Goethe, organizamos workshops de no mínimo duas semanas em 15 diferentes cidades, onde trabalhamos com estudantes de cinema e videoartistas locais", conta Ehmann.
Nos encontros em cidades como Genebra, Rio de Janeiro e Hanói, a tarefa era explorar o entendimento que temos sobre o trabalho hoje e como captar e reproduzir isso através de filmes.
A câmera estática revela a dinâmica de uma equipe israelense de televisão, mostra uma contemplativa funcionária de um museu polonês, a burocracia de um escritório que poderia estar em qualquer lugar do planeta, acompanha o constrangimento de dançarinas vestidas de hipopótamo ao promover um produto em um supermercado português.
Em uma grande sala, a exposição coloca diferentes telas em semicírculos. Vistas lado a lado, essas imagens elaboram uma experiência visual que evidencia o absurdo das relações de trabalho, ao mostrar semelhanças e diferenças entre os mais diversos ofícios.
Uma cortina separa as projeções dos vídeos criados nos workshops de uma série que atualiza Trabalhadores saindo da fábrica. Exatamente como fizeram os pioneiros do cinema, a dupla documentou a saída de funcionários de fábricas nas 15 cidades visitadas. Exibidas em repetição em um grande semicírculo, o passeio pelos cinco continentes abre espaço para reflexões sobre mudanças em mais de um século que separam a obra dos irmãos Lumière da realidade atual.
Outro semicírculo, criado no saguão da HKW, exibe um estudo criado por Farocki, no qual o artista mostra as mudanças na maneira como os trabalhadores são retratados no cinema. Realizado em 2006, Trabalhadores saindo da fábrica em onze décadas se apropria de imagens do filme original dos irmãos Lumière, além de obras de Griffith, Lang, Antonioni e von Trier.
Exposição póstuma
Morto em julho de 2014, Farocki foi um dos mais celebrados cineastas experimentais da Alemanha. Seu trabalho tinha um forte caráter político, além de brincar com limites do cinema, videoarte, documentário e o significado das imagens.
"Farocki não era apenas um cineasta, mas um sismógrafo do nosso tempo, um pensador sobre a estrutura da sociedade. Seu trabalho era uma inspiração para jovens artistas e intelectuais", disse Bernd Scherer, diretor da HKW, na abertura da exposição.
A exposição Eine Einstellung zur Arbeit está em cartaz na Casa das Culturas do Mundo em Berlim até o dia 6 de abril.