Governo do Egito renuncia
24 de fevereiro de 2014O primeiro-ministro Hazem el-Beblaui anunciou nesta segunda-feira (24/02) a renúncia completa do governo do Egito, que abre caminho para a candidatura do marechal Abdel Fattah al-Sisi, líder das Forças Armadas, à Presidência do país – ainda em crise política.
Em pronunciamento em rede nacional, o primeiro-ministro declarou que o governo "dedicou todos os seus esforços" para tirar o Egito da situação complicada que atravessa, no que diz respeito a segurança, pressões econômicas e ao caos político. Ele, no entanto, não especificou os motivos da decisão.
"Nos últimos seis a sete meses o governo assumiu responsabilidades e deveres [...] e não negou esforços para tirar o Egito da fase ruim que atravessa", afirmou Beblaui. "Esse não é o momento para interesses pessoais. A nação está acima de todos", declarou.
O governo interino enfrenta pesadas críticas pela forma como lida com as questões de segurança e economia do país, em meio a uma série de atentados e greves de trabalhadores.
Ação estratégica
Para que a candidatura de Sisi fosse viável, o marechal teria que deixar o cargo de ministro da Defesa. Um funcionário do governo afirmou à agência de notícias Reuters que a renúncia teria sido "uma etapa necessária, antes do anuncio de que de al-Sisi vai concorrer à presidência". Segundo ele, o gabinete do governo teria renunciado coletivamente para não dar a aparência de que o marechal estaria agindo isoladamente.
Apesar de Sisi não ter se pronunciado oficialmente, alguns de seus auxiliares asseguram que ele já havia declarado sua intenção de concorrer ao cargo mais alto do país e que deverá anunciar em breve a sua candidatura.
Após ter atuação decisiva na derrubada do presidente Mohamed Morsi, da Irmandade Muçulmana, em julho, o comandante militar havia estabelecido um roteiro que culminaria com as eleições presidenciais. Como parte dessa estratégia, o governo realizou em janeiro um referendo sobre o estabelecimento de uma nova Constituição.
O governo interino tem sido alvo de protestos em larga escala, promovidos pelos islamistas, que exigiam o retorno de Morsi à presidência. Ele foi o primeiro presidente eleito após revoltas populares resultarem na derrubada do ditador Hosni Mubarak, em 2011, após três décadas no poder.
As eleições no Egito devem ocorrer dentro de poucos meses. O porta-voz do governo, Hany Saleh, declarou à agência AFP nesta segunda-feira que a decisão foi tomada em razão do "sentimento de que é preciso sangue novo" no governo.
"Essa decisão não deverá afetar as relações internacionais ou a estabilidade interna", declarou o porta-voz, acrescentando que ainda é incerto quais ministros deverão ser mantidos em suas pastas.
Oposição sob repressão
A queda de Morsi resultou na crise política mais violenta da história recente do Egito. Confrontos entre as forças de segurança e ativistas da Irmandade Muçulmana terminaram com centenas de mortes e milhares de prisões. Alguns dos principais líderes, incluindo o próprio ex-presidente, foram levados a julgamento.
A Irmandade Muçulmana acusa Sisi de ter encabeçado um golpe de Estado. Organizações de defesa dos direitos humanos afirmam que os abusos durante o governo interino aumentam diariamente. O governo, no entanto, nega as acusações.
Alguns ativistas seculares que tiveram papel importante na queda de Mubarak em 2011, e que também apoiaram a derrubada de Morsi, foram presos e processados judicialmente durante o governo interino.
Hamdeen Sabbahi, um dos principais candidatos à presidência nas próximas eleições, afirmou temer a instalação de uma autocracia no país, três anos após as revoltas que derrubaram Mubarak.
Apesar de suas chances serem consideradas mínimas numa disputa direta contra Sisi, Sabbahi diz que foi encorajado a concorrer pelos ativistas jovens do partido esquerdista Corrente Popular, fundado por ele em 2012.
Instabilidade no Sinai
Contribuindo para aumentar ainda mais para a instabilidade país, radicais islamistas baseados na região da península do Sinai intensificaram ataques a policiais e militares, deixando centenas de mortos.
A organização islamista Ansar Bayt al-Maqdis assumiu a autoria dos atentados suicidas,que mataram dois turistas sul-coreanos no Sinai na semana passada – causando ainda mais distúrbios em um local onde a indústria do turismo já vinha sofrendo com o impacto dos protestos e com a instabilidade política do país.
O grupo também afirmou ter participado do assassinato de funcionários do alto escalão do Ministério do Interior.
RC/rtr/afp