Hollywood interessada no novíssimo cinema alemão
1 de abril de 2004
Science fiction não é um filme de ficção científica. Um exemplar típico do gênero não poderia começar de maneira tão simples. Na primeira tomada, vemos o pequeno empresário Jörg Karsunke, do Leste alemão, diante de uma tela branca. Trajando paletó desajeitado, ele conta sobre sua vida. E sua em bicas.
Karsunke participa do curioso seminário de motivação Mental Syntax. Ele ainda não sabe que, por trás da porta que leva à sala do seminário, um universo paralelo espera por ele. Afinal, Science fiction é mesmo um filme de ficção científica. De algum jeito, pelo menos.
A porta do esquecimento
A partir de uma idéia de singeleza cativante, o diretor Franz Müller construiu um filme alemão pleno de charme. A idéia: ao atravessar a porta, o perdedor Karsunke (Arved Birnbaum) e seu frio e cínico treinador de motivação, Marius (Jan Henrik Stahlberg), saem da realidade e perdem seu passado.
O mundo em que se movem agora parece idêntico à realidade normal (alemã), mas assim que os dois fecham a porta, nenhuma das pessoas que deixaram para trás se lembra mais deles. Milhares de possibilidades se abrem para Karsunke e Marius. E aí aparece a tristonha recepcionista de hotel Anja (Nicole Marischka).
Desde sua estréia, na Berlinale de 2003, Science fiction despertou simpatias. Trata-se do trabalho de conclusão de curso de Müller na Escola Superior de Artes e Mídia, em Colônia. Desde então, já foi apresentado em diversos festivais, de Buenos Aires a Nova Delhi e Reino Unido. Müller recebe e-mails entusiásticos do Canadá e da Hungria.
Dificuldades financeiras
“Acho que é bastante óbvio por que o filme funciona tão bem em nível internacional. É um filme alemão, pois eu queria contar algo sobre mim e meu país. Isso é muito mais interessante do que um filme ‘internacionalizado’ à força”, explica o diretor Müller, em entrevista à DW-WORLD. Uma história de sucesso?
“Infelizmente o filme fracassou na Alemanha”, lamenta. Sem um grande distribuidor e um orçamento de marketing à altura, Science fiction está sob ameaça de um desastre financeiro. “A situação para o patrocínio de projetos de menor escala está simplesmente difícil na Alemanha”, comenta o diretor e relata sobre montes de requerimentos para financiamento de produção e distribuição rejeitados.
“Sem atores conhecidos, a reação é uma só: não é comercializável. O máximo que consegui foi pagarem a transferência do original em vídeo para película. Mas isso só depois de ter sido convidado para a Berlinale.” Por isso, o próprio diretor teve que levantar sozinho a maior parte do orçamento.
Estrutura inteligente e diálogos improvisados
Apesar de meios tão modestos, Müller conseguiu criar, dentro de uma estrutura inteligente, uma reflexão sobre a perda de si mesmo e do mundo, sobre amor, moral e as possibilidades da liberdade.
A trama do filme foi desenvolvida em colaboração com os atores. Em vez de um roteiro rigoroso, só havia um esboço de 20 páginas. “Rodamos em seqüência cronológica, improvisando os diálogos”, revela o jovem cineasta. “Queria que o filme resultasse vivo e veloz.” Após apenas um mês de filmagens, Müller assumiu ele mesmo a montagem, já que não havia dinheiro para contratar um editor.
Hollywood chama
“Se tivéssemos mais dinheiro, o filme teria definitivamente melhor qualidade visual e acústica”, continua. E provavelmente ele não teria sido forçado a telefonar para o proprietário do cinema, a fim contar sobre sua obra. No momento, Müller até considera retirar Science fiction das salas alemãs, pois sem um patrocínio para a distribuição quase não há chances de mantê-lo em exibição.
Por outro lado, ele já recebeu dos Estados Unidos seis propostas de remake. “Os americanos estão sempre à procura de idéias boas e anticonvencionais”, pondera Franz Müller, “e por boas idéias eles estão dispostos a gastar bom dinheiro.”