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Independentistas catalães reagem em tom desafiador a ações de Madri

Guy Hedgecoe, de Barcelona (pv)15 de outubro de 2014

Iniciativa de Madri para bloquear referendo irrita separatistas em Barcelona, que veem intromissão em assuntos internos da região. Ala mais extrema do movimento acena com medidas radicais, que ameaçam prolongar impasse.

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Mehrheit der Katalanen befürwortet Unabhängigkeit von Spaninen
Foto: picture alliance / AP Photo

A Praça George Orwell, no centro de Barcelona, não é tão glamorosa como o nome sugere. É manhã de um dia de semana. Prédios monótonos, lado a lado com bares e cafés quase sempre desertos, dão o contorno, enquanto caminhões descarregam mercadorias. O marasmo é quebrado apenas pelas muitas bandeiras penduradas nas janelas dos apartamentos – algumas da região da Catalunha, outras do movimento independentista.

"Nós todos temos o direito de votar", diz a estudante Laia Badia, atravessando a praça a caminho da escola. "Nós temos esse direito e isso tem que ser respeitado."

Laia se refere ao referendo não vinculativo sobre a independência catalã que estava previsto pelo governo regional para 9 de novembro. As bandeiras da Catalunha em exposição fazem parte da campanha cívica em favor da consulta, assim como os cartazes colados em paredes por toda a cidade com o slogan em catalão "Ara-lo I'Hora" ("Agora é a hora").

Mas o governo central em Madri se opõe ao referendo na região, por considerá-lo inconstitucional. No final de setembro, o primeiro-ministro Mariano Rajoy recorreu ao Tribunal Constitucional para bloquear a votação. A corte aceitou o apelo, e a consulta popular foi automaticamente suspensa.

O governo regional da Catalunha, que liderou o projeto do referendo, respondeu nesta terça-feira (14/10) anunciando que não realizar a votação. Em vez disso, vai encenar uma consulta simbólica, sob a alegação de que, assim, não violaria a lei. O chefe de governo catalão, Artur Mas, descreveu o pleito como "um referendo adiantado" antes de uma votação definitiva que poderia acontecer no futuro, eventualmente sob a forma de eleições regionais.

Maioria é a favor de votação

Independentistas catalães como Laia Badia são irredutíveis: querem de alguma forma expressar a sua opinião em 9 de novembro e estão irritados com os obstáculos legais impostos pelo governo central espanhol.

"De uma forma ou de outra, nós vamos votar", diz Laia. "Se aqueles que estão em Madri não nos deixam votar, mesmo que seja o nosso direito dar a nossa opinião, seria um golpe muito pesado."

Spanien Katalonien Referendum Demonstrationen
Nem todos os catalães querem independência: 38 mil foram às ruas protestar contra referendoFoto: Getty Images/ David Ramos

O governo regional da Catalunha e outros grupos políticos nacionalistas formularam as duas perguntas do referendo. A primeira: "Você quer que a Catalunha se torne um Estado?" Caso a resposta seja afirmativa, a segunda questão: "Você quer que esse Estado seja independente?"

De acordo com Mas, as questões permanecerão intactas para o referendo simbólico. Pesquisas sugerem que cerca de metade dos catalães iria responder "sim" a ambas as perguntas. Mas em torno de 80% são a favor de terem pelo menos o direito de votar sobre a questão.

O sentimento pró-independência na Catalunha cresceu nos últimos anos. Em 11 de setembro, feriado regional, cerca de 1,8 milhão de pessoas foram às ruas de Barcelona para exigir o direito de realizar o referendo.

Aqueles que querem a ruptura reclamam que o Estado espanhol fica com uma grande quantia das receitas fiscais da Catalunha – região mais rica da Espanha – sem reinvestir o suficiente em sua infraestrutura. Eles também argumentam que Madri se intromete nos assuntos catalães e acusam o governo central de tentar sufocar o uso da língua regional por meio de uma nova lei nacional de educação.

Por isso, muito catalães observaram com inveja quando a Escócia, com o aval do governo britânico, realizou o seu próprio referendo sobre a independência em setembro.

Pau Estrada, um jovem programador de informática, diz que escolheria o "sim" para ambas as perguntas do referendo. Ele é a favor de ir adiante com o planejado referendo, mesmo que isso desafie o Tribunal Constitucional e o governo central.

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Artur Mas: "Apesar de não termos o mesmo consenso político que tínhamos, seguiremos adiante"Foto: Getty Images/ David Ramos

"Temos que exercer o nosso direito democrático", diz . "Se a maioria das pessoas quer votar, então temos que fazê-lo, mesmo que isso possa ser visto como uma desobediência civil."

Declaração de independência

Enquanto Artur Mas tem estado sob pressão de Madri para não avançar com o referendo, partidos pró-independência estão fazendo lobby para que ele siga justamente o caminho da desobediência civil. Em contrapartida, o governo central deu a entender que, se a Catalunha seguir tal curso de ação, alguns poderes autônomos da região poderão ser revistos.

A Esquerda Republicana da Catalunha (ERC) – que apoiou a coalizão Convergência e União, de Mas, uma vez que ele abriu o caminho para o referendo de novembro – sugeriu trilhar um caminho ainda mais radical depois que o plano original foi descartado.

O líder da ERC, Oriol Junqueras, disse que partidos pró-independência da Catalunha deveriam formar uma frente unida no Parlamento regional "a fim de fazer uma declaração de independência e iniciar o processo constituinte para uma República catalã".

"Eu acho que vai ser muito difícil acabar com o impasse", afirma o escritor e radialista baseado em Barcelona Josep Ramoneda.

No entanto, ele aposta que Mas provavelmente vai convocar eleições regionais antecipadas e usá-las como termômetro da opinião pública sobre a questão da independência.

"É uma história que, de momento, provavelmente não terá um vencedor e um perdedor", lamenta Ramoneda. "Em vez disso, toda a situação ficará mais complicada. Acredito que nós vamos ver as coisas ficarem cada vez mais atoladas em vez de vê-las simplificadas."