Levante militar polariza turcos na Alemanha
21 de julho de 2016A irritação de Ercan Karakoyu transparece em sua voz trêmula. Ele afirma que na Alemanha houve uma série de retaliações contra os membros do movimento Gülen – nome do clérigo radicado nos Estados Unidos que, segundo o governo turco, é responsável pela tentativa de golpe militar.
"A situação é assustadora, atiraram pedras contra instalações do movimento Gülen, picharam paredes, fizeram ameaças de morte", diz. Segundo ele, especialmente em redes sociais houve convocações de perseguição.
Ercan Karakoyu é presidente da Fundação para Diálogo e Educação, que atua desde 2014 como porta-voz na Alemanha do Hizmet (serviço, em turco) ou do movimento Gülen, como também é conhecido.
Ele põe a culpa na União Democrata Turco-Europeia (UETD) que, segundo ele, age como uma espécie de grupo de lobby do partido governista turco AKP, como "braço estendido" de Erdogan na Alemanha.
Karakoyu conta, ainda, que associações de mesquitas, como a Ditib, penduraram cartazes comunicando que os seguidores de Fethullah Gülen não são bem-vindos em suas comunidades. Ele cita concretamente três casos, nas cidades de Hagen, Duisburg e Günzburg.
A União Turco-islâmica para Assuntos Religiosos (Ditib) é a maior associação de mesquitas na Alemanha. Cerca de 700 mesquitas estão sob a égide da associação. A instituição se mostrou surpresa quando informada dos casos citados por Karakoyus pela reportagem da DW. "Somos uma comunidade religiosa muçulmana e não rejeitamos ninguém que venha rezar em uma mesquita.", responde a porta-voz da entidade Ayse Aydin, acrescentando que todas as mesquitas estão abertas aos que querem orar.
Golpe piora a situação
A Ditib é próxima ao departamento responsável pela religião do Estado turco. O conflito entre ela e a Fundação para Diálogo e Educação é também um conflito entre partidários de Recep Tayyip Erdogan e os de Fetullah Gülen. A disputa lança uma luz sobre o clima da comunidade turca na Alemanha, que se mostrou profundamente dividida nos dias posteriores ao fracassado do golpe na Turquia.
"O governo turco classifica o movimento Gülen como uma organização terrorista. Desde 2013, o governo turco combate fortemente o movimento e tenta afastar seguidores de Fethullah da polícia, do Judiciário e das Forças Armadas", lembra Christoph Ramm, especialista em Turquia da Universidade de Berna. Ele ressalta também que meios de comunicação leais a Fethullah Gülen, como o Zaman, jornal de maior tiragem da Turquia, foram afetados por esta "limpeza".
Influência sobre os meios de comunicação é um pilar central do movimento Gülen. Oficialmente, ele propaga um islamismo turco pacífico, em que a educação deve estar no centro, valores religiosos são associados a ações de tino econômico. O movimento está presente em mais de 140 países, constrói sobretudo escolas e instituições de ensino. Não há informações sobre seus recursos financeiros. A entidade não tem um organograma.
Christoph Ramm tem suas dúvidas sobre os verdadeiros objetivos do movimento. "Nós não sabemos como esta rede é organizada. Lembra muito uma estrutura sectária", compara. Ele frisa ser difícil obter informações e questionar as estruturas da organização. "Críticas à falta de transparência são simplesmente ignoradas."
Esperança na Alemanha
Ele vê com grande preocupação as atividades do governo Erdogan contra o movimento Gülen. "O governo faz quase uma caça às bruxas contra os adeptos de Fethullah Gülen", alerta.
Essa caça às bruxas também parece ter chegado à Alemanha. Para Ercan, os seguidores de Erdogan na Alemanha também têm culpa no recrudescimento da situação. "A UETD, por exemplo, apanha a retórica de Erdogan, palavra por palavra, e a repassa à comunidade turco-alemã", opina Karakoyu. "O resultado é que aqui se observa exatamente a mesma hostilidade", acrescenta.
Por parte do UETD, existe uma clara preocupação em se acalmar os ânimos. A associação informou, em um comunicado de imprensa, que "tais incidentes contradizem diametralmente os princípios da organização". Com relação aos apelos à violência existentes na mídia social, a entidade salienta que "não é particularmente difícil em mídias sociais usar imagens, nomes ou brasões de forma ilegal."